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“Não quero mais homem me gritando ‘gostosa!’”, diz Valesca Popozuda

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A Bienal do Livro de São Paulo promete parar no dia 29 com o lançamento do livro ‘Sou Dessas- Valesca, pronta para o combate’ (Ed, Record), da autora estreante e funkeira Valesca Popozuda. “É uma mistura de autobiografia e autoajuda, para dar força para as mulheres se afirmarem a partir de exemplos das dificuldades e das conquistas que eu tive na minha vida”, explica ela. Aos 37, a intérprete de ‘Beijinho no ombro’ e ‘Eu sou a diva que você quer copiar’, diz que ouve muito em casa... Maria Bethânia. “Amo aquela voz, aquela emoção. A gente vive em mundos diferentes, ela é muito reservada. Mas quem sabe um dia cantaremos juntas?”

Como se sente lançando um livro na Bienal?

Eu estou é muito nervosa, ficando louca. Imagina passar no meio de todo mundo para lançar um livro. Mas acho que o mais importante é passar a mensagem, de contar um pouco da minha vida para as pessoas que não me conhecem e de reforçar o recado do empoderamento feminino.

Não acha que essa expressão empoderamento está banal demais?

Não acho. Talvez para os homens, porque eles sempre tiveram poder. Mas para as mulheres é maravilhoso ter uma palavra que simbolize uma bandeira de enfrentamento, de superação dos desafios, de se colocar na sociedade.  

Que passagem da sua vida foi mais difícil de relembrar no livro?

A dificuldade que minha mãe sofreu para me criar. Das vezes em que ela dormia na rua, depois do trabalho, porque não podia entrar na comunidade de madrugada por causa da violência. Quando ela trabalhava na casa de uma família, a patroa queria que ela me desse, porque achava que ela não teria condições de me criar. E estamos aí, firmes e fortes.

Que autores você admira?

Eu não sou de ler livro, não. Leio muito revistas de moda, mas os livros eu paro na metade. Mas consegui terminar ‘A menina que roubava livros’ e ‘Como eu era antes de você’, que é um livro muito romântico, como eu. Teria o maior prazer em conhecer essa escritora (Jo Jo Moyes).

Acha que teria chance na Academia Brasileira de Letras?

Por que não? Se tiver que bater de frente, eu bato. Só teria que fazer um fardão sob medida. Costureira é que não falta por aí.

As letras dos seus funks antes tinham muito apelo sexual; hoje, estão mais comportadas. Arrepende-se delas?

Nunca! Naquela época, fazia todo sentido falar sobre sexo daquele jeito. Por que os homens podiam e a gente não? Mas o funk mudou e eu mudei com ele. Quando fazia meus shows, muitas meninas vinham me contar que apanhavam dos namorados, que foram abusadas pelo pai, que eram discriminadas no trabalho, então senti a necessidade de dar mais voz a elas. Talvez, aí, as letras tenham mudado mesmo. Não quero mais homem gritando ‘gostosa!’ para mim; eu quero é as mulheres comigo gritando pelo seu poder, colocando a voz para fora, tirar isso que está entalado na garganta.

Mas muitos consideram que suas letras estimulam a rivalidade feminina.

E ela existe, né? Não vamos ser hipócritas. É só entrar nas redes sociais e ver a quantidade de mulheres que chama as outras de gorda, feia, ridícula. A primeira inimiga do feminismo não podem ser as próprias mulheres. Não adianta gritar por mais poder, mais trabalho e igualdade de salários se você fica detonando a outra. A minha mensagem é de autoestima de se olhar no espelho e sentir orgulho de você. Te chamam de gorda? Vai em frente, segue seu caminho, e beijinho no ombro para o recalque.

Sente preconceito de outras cantoras com seu trabalho?

Ainda tem gente que me olha torto, mas, sinceramente, eu não ligo. No dia em que baterem na minha porta para perguntar se eu estou precisando de alguma coisa, aí eu vou começar a ligar. Como não é o caso, estou fazendo 15 anos de carreira sem roubar e sem matar. Só com a minha dignidade.

Que cantora você ouve e ninguém imagina?

Maria Bethânia.

Maria Bethânia?

Sim, Maria Bethânia. Eu amo aquela voz, aquela emoção, aquela maneira teatral de cantar e dizer as palavras. A gente vive em mundos diferentes, ela é muito reservada, mas foi muito revolucionária. Quem sabe um dia possamos cantar juntas? Seria um sonho para mim. Mas também ouço muito Gal Costa e Ivete.

O que acha que falta ao movimento feminista?

Mais engajamento pessoal das próprias mulheres, nas coisas do dia a dia, Tenho, por exemplo, uma vontade imensa de ter uma ONG que dê assistência a jovens carentes grávidas. Eu engravidei muito cedo e ia todo sábado a uma instituição onde aprendia a bordar, costurar, um ofício. Ganhava cesta básica e também o primeiro berço e as primeiras roupinhas do meu filho. Queria devolver isso para o mundo, sei o quanto é dolorido.

Você tem ido mais para o lado pop que do funk. Já pensou em tirar o Popozuda do nome artístico?

Eu faço pop também, mas serei para sempre funkeira. Quer me chamar de MC? Me chama que eu adoro. A comunidade e o gueto nunca vão sair de mim, fazem parte da minha história. Assino Popozuda com orgulho, até porque o biótipo da brasileira é esse. A gente não tem que querer ser aquelas modelos de capa de revista. Aliás, acho uma besteira ter que ser esquálida para desfilar. Eu tenho celulite e sou superfeliz. Essas marcas ganhariam muito mais dinheiro se pensassem também nas popozudas, fazer roupas para nós mais fashion, que não sejam só coladas no corpo ou com apelo sexual.

Quem é mais popozuda? Você ou a Kim Kardashian?

Já tive a oportunidade de verificar com ela ao vivo e posso dizer que é ela (risos).

Alguma música nova em vista?

Não posso contar ainda, mas será uma homenagem aos meus amigos gays, que sempre estiveram ao meu lado, sempre me apoiaram. Está na hora de levantar mais essa bandeira.

Fonte: Época

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