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Obcecado com a crise política, Tom Zé faz quatro músicas sobre o tema

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Obcecado com a crise política, o músico Tom Zé já compôs só neste mês três marchinhas e um samba sobre a Lava-Jato, “Queremos as delações”, “Sabatina em latim para a indicação de um juiz do supremo” e “Homologô”, que já foram divulgadas nas suas redes sociais e em plataformas de streaming. “Samba da Comissão da lingüiça” (um trocadilho com “justiça”) será disponibilizada hoje no fim da tarde.

— Eu não faço música, né? Sou péssimo instrumentista e cantor. Eu faço é jornalismo-cantado — diverte-se ele, pelo telefone, de casa, às voltas para conseguir gravar o samba a tempo de lançá-lo na internet ainda hoje. — Quem me cerca sabe que eu não conto meu voto para ninguém, mas comigo é na democracia. O Brasil anda tão raivoso, tão irracional, as pessoas andam cuspindo ódio umas em cima das outras, o tema não sai da minha cabeça. Tem uma padaria aqui perto de casa que parece um entroncamento da Idade Média, d etanta barbaridade que você ouve no balcão. Desde que eu compus o ‘Tribunal do Facebook’ estou percebendo como tem sabido no mundo, não é verdade?

A primeira composição do gênero, “Homologô” [Escute Aqui], partiu de uma ideia do amigo Tom Cavalcante, que lhe sugeriu aproveitar o tema político para fazer uma marchinha para o carnaval de 2017. Mas foi seu dentista, Eduardo Mangini, que lhe deu o mote: a sonora palavra “homologou”. E assim Tom Zé acordou às quatro da manhã num dia do final de janeiro e compôs a canção, gravada com os músicos Jarbas Mariz e Daniel Maia:

“Homologou, logô,/ Homologô/ Mas querem transformar a Lava-Jato em Lava-Rato./ Homologou, logo/ Homologô/ E o país nesse teatro pisa num rabo-de-gato/ É de se ver, bota a mão daqui, bota a mão dali,/ Pobre nação!/ Não dá pra crer/ Bota a mão daqui, bota a mão dali,/ Quanto ladrão!/ Essa turma só se botar no xilindró./ Óóóóóóh...”

— Desde então, toda agora acordo de madrugada em parafuso e rabisco alguma coisa. Às 7h eu vou nadar na piscina, onde faço hidroginástica, e espero até às 9h, a hora que o Paulinho acorda, para mostrar pra ele. Às 16h, pouco antes de acabar a diária da nossa faxineira, a Tânia, peço a ela para colocar a música na Internet — conta ele.

‘HOMOLOGA ESSE CASCALHO’

Paulinho é o amigo e músico Paulo Le Petit, que também compôs com ele “Queremos as delações” [Escute Aqui]: “Queremos as delações/Sim, as delações agora/Luz, lúcida e senhora/ Estamos pagando por elas vintém a vintém/ Sofremos com elas de Rio de Janeiro/ Logo, logo esse baralho/Homologa esse cascalho”.

Já “Sabatina em latim para a indicação de um juiz do Supremo” [Escute Aqui], toda em latim, foi a que rendeu mais bafafá nas redes do músico até agora. Neusinha, mulher de Tom Zé, espantou-se com a quantidade de lingüistas que disputavam a tradução exata da composição:

— O que apareceu de latinista para comentar a letra não dá para acreditar, a gente não sabia que existia tanta gente sabendo de latim no Brasil — brinca ela, no fundo da ligação telefônica, enquanto procurava o conto “Os contos da Cantuária”, a pedido de Tom Zé, que queria comparar os comentaristas raivosos de Internet com os personagens do conto de Geoffrey Chaucer, mas lhe faltava memória.

A letra que não esconde sua falta de paciência com o presidente Michel Temer diz: “Temer, temer, o que é um juiz, temer?/ Temer, temer, vosmicê é quem diz, temer./ Quosque tandem Catilina/ Catilina abutere/ Patientia nostra/ Qui tollis peccata mundi/ Panem et circenses/ Quod abundat nocet / A fortiori Pater dimitte illis/ Rábula rabulae rábula.”

As marchinhas correram o mundo e foram comentadas na edição de ontem pelo diário francês Le Monde: “Historicamente, as músicas de carnaval costumam falar de acontecimentos políticos. Aqui, Tom Zé refere-se à tentativa de “limpeza” de políticos do governo Temer citados na investigação em questão, chamados por ele de “ratos”: “Eles querem transformar a Lava-jato em ‘lava-rato’”.

O samba que será disponibilizado em sua página na Internet no fim da tarde fala especificamente sobre a Comissão que vai sabatinar o indicado pelo presidente Michel Temer ao Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, na próxima terça-feira.

— Essa comissão vai fazer lingüiça, não justiça — diz Tom Zé, que vai acrescentar as novas músicas nos dias 24 e 25 de fevereiro, no Sesc Vila Mariana, em São Paulo, onde apresenta show em homenagem à Tropicália. — No Brasil, quem precisa de tribunal e justiça é o pobre. Fui criança nos anos 40, em Irará, e lá a figura do juiz era a única segurança real da cidade.

O músico só não sabe se elas entram no próximo disco, que tem já pronta uma nova canção, que nada tem a ver com samba, diz ele, “Cada homem é sozinho na casa da humanidade”.


Fonte: O Globo 

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