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Pais e avós resgatam brincadeiras antigas e estreitam laços com filhos e netos na quarentena

Foto: Roberta Aline/Cidadeverde.com

Nos primeiros 50 dias de quarentena, Tiê, de três anos, não encostou no tablet. As semanas de isolamento social foram preenchidas com muitas brincadeiras e atividades em família. Ao lado dos pais, a atriz e professora Samanta Olm, 36, e o professor Igor Cardoso Tomaz, 34, e da avó Débora Olm, 57, o menino já fez de tudo um pouco: jogou amarelinha no quintal, criou uma lhama e um binóculo com material reciclado, fez desenhos e pinturas, testou a sua primeira receita culinária e ouviu muitas histórias na hora de dormir.

Se por um lado a quarentena tem sido desafiadora para muitos pais que precisam se dividir entre o trabalho dentro de casa e as necessidades das crianças, para muitas famílias têm sido também um momento de estreitar os laços com os pequenos e resgatar passatempos antigos.

Segundo Daniele Saheb Pedroso, coordenadora do curso de pedagogia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), a proximidade da convivência da criança com pais e avós é muito positiva, pois são reforçados vínculos. Além disso, diz ela, o contato entre diferentes gerações enriquece o desenvolvimento infantil e a construção da memória afetiva.

Mas, em muitas casas, surge a dúvida: o que fazer para entreter as crianças? Os especialistas indicam que é fundamental criar uma nova rotina para os pequenos. "A criança também precisa ter a rotina da alimentação, de atividades escolares, de responsabilidades, além do lazer e das brincadeiras", afirma Daniele Pedroso.

Outra recomendação da pedagoga é inserir os pequenos nas tarefas domésticas. "A casa é um grande laboratório", diz ela. A criança, mesmo a pequena, pode ajudar a preparar a mesa, separar a roupa para lavar por cor ou até acompanhar um adulto cozinhando. "As questões simples do dia a dia também ensinam. É interessante que as crianças sejam estimuladas", acrescenta.

É o que tem feito a dentista Priscila Monteiro dos Santos, 36, com a filha Carolina, 3. Uma das atividades que elas mais gostam de fazer juntas nesta quarentena é cozinhar. "Fazemos omelete, feijão, arroz e biscoitos. Ela adora me acompanhar", conta Priscila.

Realizar atividades manuais, como desenhar, pintar e montar brinquedos com materiais recicláveis, é outra dica dos profissionais de educação. Na casa de Samanta Olm e Tiê esse tipo de ação já era comum e foi intensificada nos dias de isolamento -por causa disso, segundo a mãe do menino, ele só voltou a se interessar em ver desenhos no tablet há poucos dias.

Uma das atividades praticadas pela família de Pirassununga, interior de São Paulo, é o bordado, que já era tradicionalmente realizado por Samanta e por sua mãe, Débora, e que agora ganhou um novo adepto: Tiê. Para atender o desejo do filho de ser inserido na ação, Samanta conta que bolou um material específico para ele, improvisado em uma placa de papelão com alguns furos aleatórios feitos com a ponta de um lápis. "Ele vai passando o fio de malha com um nó na ponta pelos furos. O trabalho é livre, e o mais importante é que ele se sente bordando ao nosso lado", relata.

De acordo com Priscila de Moraes, coordenadora pedagógica da Escola do Futuro, de São Paulo, as crianças aprendem por interação e exemplos. "Esse tempo em quarentena pode se tornar de trocas importantes."

FOTOS E BRINCADEIRAS ANTIGAS

Patrícia Guillon Ribeiro, especialista em psicologia de criança e adolescente e professora na PUC-PR, afirma que aproveitar a quarentena para mostrar às crianças fotos da família é também uma ação que pode ser adotada por pais e avós. "Hoje em dia, as crianças não têm acesso às fotos de papel. A criança gosta de saber como os pais e avós eram, isso aumenta a sensação de identificação com a família, pois ela percebe que os familiares também passaram pelas mesmas coisas."

Outra dica é ensinar brincadeiras antigas e populares, como passa-anel, mímica, jogos de baralho e de tabuleiro, entre outros. "Nesse momento, estamos sendo convidados a mostrar às crianças um mundo que não era tão digital."

É o que tem feito o agente escolar Marco Antônio Vidal, 60. Mesmo morando com a filha, Lívia Patrícia de Andrade Menezes, e com a neta, Ana Luiza Menezes Bianchin, 10, antes do isolamento, cada um tinha os seus compromissos profissionais ou escolares e sobrava pouco tempo para a diversão. Agora, sem poder sair do apartamento, passaram a criar formas de se distraírem juntos.

Avó, filha e neta disputam partidas de xadrez, jogos de tabuleiro, e outras brincadeiras, como dançar equilibrando uma laranja entre suas cabeças, sem a ajuda das mãos. Ou, seguindo a dica da outra avó paterna, Elisabeth Bianchin, que não pode estar perto da neta, mas deu a sugestão: brincarem de um passatempo conhecido como cama de gato. Em um corredor, eles montam um emaranhado com barbante ou fita crepe, e o desafio é chegar até o outro lado sem encostar no material. "Temos que ir inventando atividades para relaxar", diz Vidal.

Vale ressaltar que os jogos eletrônicos e a tecnologia também podem ser uma forma de interação entre pais, avós e netos. "São trocas entre gerações que devem ser valorizadas e realizadas com um tempo adequado", afirma a coordenadora pedagógica Priscila de Moraes.

Para os avós que não podem estar perto dos netos, ligações em vídeo são uma forma de matar a saudade e manter o contato mais próximo. Se a aposentada Maria Ester Carrasco Leal, 59, não pode mais brincar com a neta, Maria Tereza, de três anos, de atacá-la de beijos, ela segue em contato com a menina em conversas pela internet. Juntas, fazem até gelatinas juntas, cada uma da sua casa. "Em 60 dias longe fisicamente, ela já evoluiu tanto, parece que cresceu, aumentou o vocabulário com palavras diferentes, não quero perder nada e essa é uma forma de acompanhar a sua evolução", diz.

HORTA E CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS

Ler e contar histórias são ações simples de fazer e que, além de proporcionar diversão para crianças e adultos, podem ser ferramentas de aprendizado e desenvolvimento. "Os livros despertam nos leitores muitas emoções, sentimentos que estão guardados e que quando lemos aquilo nos identificamos", afirma Dianne Melo, especialista em linguagem e coordenadora de leitura da Fundação Itaú Social -a entidade realiza há mais de dez anos a campanha Leia para uma Criança.

Ela destaca também que os livros ajudam pais a conversarem com as crianças sobre diferentes assuntos, como empatia, respeito e até situações delicadas como doenças e morte -especialmente no momento atual em que o mundo vive a crise do novo coronavírus.

A leitura foi uma das atividades inseridas na rotina da quarentena do casal Karynna Toletino, Benjamin Junior e do filho, Rafael, de quatro anos. Montar quebra-cabeça, jogar dominó, brincar de corrida com cavalos de madeira e até reproduzir desafios da internet estão entre as ações adotadas pela família.

Fonte: Folhapress

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