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"Todo lugar é arriscado", diz enfermeira que conta como é trabalhar e ficar longe da família

Fotos: Roberta Aline/Cidadeverde.com

Caroline Oliveira
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Choro, trabalho, suor e sangue é assim que os profissionais da saúde, que estão na linha de frente do enfrentamento da Covid-19 em Teresina, classificam o misto de sentimentos e as ações que precisam ser executadas para salvar vidas em meio a pandemia que a todo momento tem confirmações de mais casos. 

A enfermeira Lusiane Lima, que trabalha no Hospital Dr. Miguel Couto, no bairro Monte Castelo (zona Sul) uma das referências para a Covid na capital, disse que os primeiros dias foram muito difíceis, tanto de adaptação, quanto de conscientização dos profissionais para o que estava por vir. 

Ela revela que chorava muito, por estar na linha de frente da organização e capacitação dos profissionais, com muitas dificuldades, por ter que ficar sozinha em casa, longe do marido e da sua filha única, para protegê-los de qualquer contaminação. 

“Foram dias horríveis, que às vezes eu ficava para baixo, pedindo forças a Deus, sozinha em casa. E sabia que meu propósito era maior, que estava passando por isso, porque fui enviada para isso. No início trabalhava 12 horas até 24 horas, tentando resolver os problemas para o hospital (referência em Covid) abrir: atrás de EPIs, máquinas de exames, de como estabelecer os fluxos, era uma correria. Às vezes, eu ligava para minha filha e ela estava triste, chorando, dizendo que estava com saudades, eu tinha que me manter forte”, afirma a enfermeira, que ficou longe da filha por um mês. A garotinha ficou com o pai e os avós no sítio da família, na zona rural de Teresina. 

Lusiane faz parte do núcleo de segurança do paciente, que apesar de não estar diretamente na assistência ao doente, tem que entrar constantemente na área crítica para fiscalizar materiais, higienização, limpeza, lixo, os profissionais e a lavanderia. No hospital do Monte Castelo são 50 leitos exclusivos para pacientes com Covid-19, é o hospital municipal sentinela para casos leves e de média complexidade da doença. 

“Toda fez que entrar tem que se paramentar, com aquela roupa, os EPIs e ao sair, tomar banho, vestir outra roupa e outro calçado e quando chega em casa, repete todo o processo”, descreve. 

"Todo lugar é arriscado hoje"

Com o avanço do número de contaminados por todo o Piauí e principalmente em Teresina, a enfermeira resolveu trazer a filha de volta para casa, tanto por causa da saudade quanto por acreditar que todos os lugares hoje são arriscados. E também porque o trabalho no hospital está mais estabilizado, já que a equipe já está treinada e tem pessoal suficiente para resolver todo tipo de situação. 

“Depois que a doença se alastrou para todas as regiões, o mesmo risco que ela vai ter entrando no supermercado ou na farmácia ou de estando em casa, protegida, junto comigo, vai ser o mesmo. Só agora eu tive coragem de trazer também porque eu trabalho todo dia pela manhã de segunda a sexta, depois desses 30 dias que tudo se estabilizou lá no hospital. E eu tento me proteger”, afirma Lusiane que segue todo um protocolo ao entrar em casa. 

Ela adaptou um banheiro no terraço da casa, para tomar banho antes de entrar, a roupa é colocada separada, lavada com água quente e hipoclorito. A babá que cuida da filha, enquanto a enfermeira está no hospital, também passa por todo o processo de banho e troca de roupa antes de iniciar o trabalho. 

Em casa, Lusiane se transforma na mãe, em criança, na companheira de brincadeiras da filha, para amenizar a rotina de isolamento que a menina está tendo e também para aliviar um pouco sua carga estresse do trabalho, que apesar de tudo ela faz com muita satisfação. 

“Em casa, vem a vida atribulada como qualquer mãe, as tarefas da escola, vários atividades extras como em pintura, tela, fazemos bala de gelatina, brigadeiro, para que não fique tudo muito rotineiro, por ela ser filha única. As vezes viro criança, depois tenho que ser mãe mesmo, para tentar passar por essa fase da forma mais amena, mais harmoniosa, possível”.

Foto: Arquivo Pessoal

Missão profissional

A profissional da saúde fala com orgulho dos desafios que tem enfrentado e das vitórias alcançadas. 

“Quando a gente vê o caso da dona Francisca (idosa de 95 anos que conseguiu se curar da Covid,) e vê o tanto que a gente evoluiu, bater no peito e dizer: conseguimos. Estamos seguindo o rumo certo, temos que melhorar aqui, acolá, mas vamos para frente que vai dar certo”. 

Ela chama atenção para a valorização dos profissionais da saúde, que sempre estiveram arriscando suas vidas, não só com a Covid-19, mas com todas as doenças que existem. 

“Eu sempre pensei num bem maior, que o nosso propósito, o nosso valor ele está sendo mostrado agora, de todos os profissionais da área de saúde, de tanto que a gente trabalha, se sacrifica, se abdica, é exposto a tantas doenças, não só a Covid-19, mas a inúmeras outras doenças que estão por ai para ajudar a comunidade, a população e nesse sentido estou ajudando ao futuro da minha filha, da minha família e de toda população”, finaliza a enfermeira.

 

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