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Coletivo realiza 1º censo do Piauí para pessoas trans em busca de políticas públicas

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O Coletivo 086 realiza o primeiro censo de trans masculino do Piauí com o objetivo de oferece um retrato mais preciso da diversidade de gênero de população no estado. A estatística é para ajudar na definição de políticas públicas, reivindicações de direitos e adotar ações contra a transfobia.

Grax Medina Gutierrez, de 34 anos, que é o coordenador, idealizador e produtor do Coletivo 086, informou ao Cidadeverde.com que o censo se iniciou em fevereiro e deve seguir até o final do mês de abril. Até o momento 49 pessoas já preencheram as informações.

“O censo foi lançado por meio de um formulário do Google que está disponível no link da biografia do Coletivo no Instagram, onde a pessoa clica e lá preenche os seus dados básicos como nome, idade, quanto tempo usa hormônio, se faz acompanhamento médico e outras informações. Ele é direcionado as pessoas trans masculinas, porque até o momento não temos o número exato e por conta disso precisamos dessas informações para melhorar as ações voltadas para essas pessoas”, explicou.

Confira aqui o link do formulário para adultos

Confira aqui o link do formulário para menores de idade

Ele destacou que um dos pontos fundamentais do censo é conseguir o perfil das pessoas trans masculinas no estado para poder buscar junto aos órgãos públicos políticas públicas. Uma delas é mostrar a necessidade de se ter um ambulatório destinado ao público trans mais atuante. Atualmente no estado existe apenas um ambulatório, que funciona no Hospital Getúlio Vargas, que atende especificamente travestis e transsexuais.

“Esses dados são importantes para que possamos ter uma dimensão da comunidade e realizar ações no estado, principalmente por causa do atendimento no ambulatório. Em Minas Gerais uma pessoa trans recebe atendimento no ambulatório e pelo SUS consegue os medicamentos para hormônio. Aqui é muito difícil conseguir um atendimento, porque muitos demoram mais de um mês para uma consulta, então conseguir medicamentos é mais difícil ainda, porque o hormônio, alguns são de 15 a 15 dias, outros a cada 30 dias, então muitos decidem comprar por fora, porque se for esperar atendimento ambulatorial para poder conseguir sem o SUS, vai ficar sem hormônio. Isso gera um alto custo também para a gente, porque três ampolas eram, por exemplo, uns R$ 45, agora custam R$ 200. Então essas são dificuldades que muitas gente às vezes as pessoas não procuram nem ajuda médica para fazer o tratamento hormonal e isso não pode, é um perigo muito grande. Sem contar que não é só esse tratamento, tem que ir em endocrinologista, psicólogo, é preciso conseguir cirurgia de mastectomia pelo SUS, então é por isso ter esses dados vai mostrar a importância de se ter um melhor atendimento”, explicou.

Muitos trans não se sentem acolhidos na comunidade LGBTQIA+

Segundo Grax Medina, as pessoas trans masculinas não se sentem muito acolhidas nem mesmo dentro da comunidade LGBTQIA+.

“O nosso coletivo surgiu em 2020 porque não nos sentia contemplado dentro da comunidade LGBTQIA+, existem muitos grupos específicos que não nos contemplavam e que não nos faziam ser vistos com muita importância em relação aos outros, inclusive, existe ainda muito preconceito entre os próprios gays e lésbicas com a gente, então é algo a mais que a gente tem que enfrentar”, lamentou.

Ele explicou que muitas vezes as pessoas trans são vistas apenas como um fetiche. “Ficam muito objetificando a gente, muito como um fetiche, principalmente de caras gays. Eu inclusive já fui vítima várias vezes de pessoas que eu não conheço, que falam comigo pelo Instagram, a maioria gays, que falam comigo e agem como se eu tivesse uma obrigação de ficar com eles. Existe esse fetiche por parte de algumas pessoas, como se fôssemos só isso, um objeto. Além disso, tem muita transfobia, ouvimos sempre alguma coisa, como, por exemplo, ‘você nunca vai ser homem de verdade’, e outras coisas que sempre acontecem”, afirmou.

Foto: Arquivo Pessoal

Pessoas trans em situação de vulnerabilidade

Grax Medina informou que o preconceito com as pessoas trans faz com que elas aumente a situação de vulnerabilidade. Muitas vezes porque não são aceitas nem mesmo dentro da própria família.

“Não se tem políticas públicas suficientes como ações para a saúde mental, escolaridade, empregabilidade e moradia para a nossa comunidade. Muitos estão em situação de vulnerabilidade, pois não moram com a família. Na maioria das vezes a família não aceita essa transição, então a pessoa precisa sair de casa, sofre transfobia, e precisa arranjar um local para morar, às vezes com uma tia ou um amigo, a maioria não mora com a família. É importante ter campanhas para informar mais as pessoas sobre essas situações que enfrentamos. Inclusive nas escolas, quem é trans também sofre muito preconceito e nem o nome social é respeitado”, destacou.

O Coletivo

Grax Medina Gutierrez é formado em licenciatura das Ciências da Computação e Marketing, atualmente atua como produtor audiovisual e videomaker. Ele iniciou a sua transição no ano de 2017 e logo depois formou o coletivo.

“Eu comecei minha transição em abril de 2017 porque mesmo sabendo antes que já me entendia como pessoa trans, não estava no momento certo. Nesse tempo não tinha plano de saúde e não existia ambulatório trans, e se tinha muito preconceito, muito mais que hoje. Aos poucos fui correndo atrás das coisas, fiz um plano de saúde e aí em agosto de 2018, após um ano de tratamento hormonal, eu consegui realizar a mastectomia bilateral pelo plano e saúde”, explicou.

Foi em 2020 que ele ajudou a criar o Coletivo 086 para realização de ações focadas nas pessoas trans masculinas.

“Eu faço parte de movimentos sociais desde 2014, eu me aproximei do Matizes, fui ajudando as organizações, a partir disso eu vi que mesmo me acolhendo muito bem, tinha alguns particularidades que não me abrangiam, então foi quando em 2016 eu me juntei com uns caras trans que conheci no Piauí e assim fui um dos cofundadores da Atrans masculinos. Fundamos ela e fizemos algumas ações. No final de 2019 eu saí por não concordar com alguns pensamentos políticos na associação. Em janeiro de 2020 me juntei com outras pessoas trans e decidimos fundar o coletivo, e a partir daí fizemos várias ações como o primeiro documentário de fala trans masculinas, campanha de câncer de mama de pessoas trans e várias outras ações”.

 

Bárbara Rodrigues
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