Rodrigo Santoro e Nicole Kidman juntos em filme

Philip Kaufman faz parte do imaginário dos cinéfilos de todo o mundo graças a filmes como A Insustentável Leveza do Ser e Os Eleitos, mas seu público aumenta muito mais se você acrescentar que foi ele quem criou Indiana Jones. Kaufman escreveu o primeiro filme da série, formatando o dublê de arqueólogo e aventureiro, mas divergências com o produtor George Lucas levaram à sua substituição por Steven Spielberg. O diretor veio ao Rio para apresentar Hemingway & Gellhorn na cerimônia de encerramento do festival. Deu entrevistas, mas para o Estado foi especial. A HBO, que produziu o filme e o apresenta amanhã à noite no País – às 22 horas –, reuniu Kaufman, seu filho e produtor e o astro Rodrigo Santoro para uma exclusiva, realizada num espaço mítico – a piscina do Hotel Copacabana Palace.O cineasta tem adaptado escritores importantes (Milan Kundera, Tom Wolfe) e biografado outros (Henry Miller e Anaïs Nin em Henry e June, o divino marquês em Os Contos Proibidos de Sade). O que torna esses autores tão atraentes para Kaufman? "Ou eles contam histórias que são extraordinárias ou viveram vidas que são, elas próprias, extraordinárias", ele explica. O repórter arrisca outra interpretação – como personagens, os escritores escolhidos por Kaufman são quase sempre transgressores, não apenas contestadores. Colocam o tema do comprometimento, do engajamento social e político, e isso se faz por meio da tomada de consciência."Você define minha obra melhor que eu", diz o diretor, e ele abre um sorriso. "Consciência e militância sempre me atraíram, mas não são exatamente temas em alta nestes dias." Rodrigo Santoro, que faz um papel importante – mas ele não é Hemingway, interpretado por Clive Owen –, conta que Kaufman é o sujeito mais doce do mundo. "Embora se passe em vários países, numa verdadeira volta ao mundo, o filme foi filmado em estúdio e nos arredores de São Francisco. O tempo todo eu dizia a Philip que ele ia adorar o Rio. Mal ele chegou e o levei para ver um show de Gilberto Gil com o filho. Ele ficou muito emocionado." O próprio Kaufman conta: "Já sabia quem era Gilberto Gil, mas vê-lo tocar com o filho excedeu minhas expectativas. Foi mágico". O filho quase não fala – diz que o momento é do pai e de seu astro –, mas fornece uma informação importante.Os últimos anos foram difíceis para Kaufman, que quase não filmou. Mas não foi por falta de inspiração nem mesmo por dificuldade de financiamento – embora ele diga que a experiência com a HBO tenha sido excepcional. "Nunca tive tanta liberdade em minha carreira." A mulher de Kaufman, mãe de seu filho, teve um câncer e ele parou com tudo para lhe dar atendimento. Uma história de amor clássica – unidos até que o morte os separou. Já a história de Ernest Hemingway e Martha Gellhorn é tumultuada. Viveram e se amaram no quadro da Guerra Civil Espanhola – na qual Rodrigo faz um líder republicano – e também em Cuba, mas o temperamento de ambos selou a separação litigiosa.O filme é narrado em flash-back pela velha Gellhorn, que nunca desistiu de ser correspondente de guerra (a maior de todas). Como ela diz ao repórter que a entrevista, recusa-se a ser uma nota de rodapé na biografia de Hemingway. Acrescenta que ele foi uma figura notável, mas tinha um inimigo visceral – ele próprio. É da ambiguidade do grande homem que Kaufman tenta dar conta. O projeto veio da HBO, e quando Kaufman o assumiu já havia um esboço de roteiro, que não agradou ao diretor. Ele reescreveu tudo. O filme mostra o envolvimento de artistas e intelectuais nas brigadas republicanas. "John Dos Passos foi quem atraiu Hemingway para as brigadas, mas o episódio envolvendo Paco Zarra provocou uma divisão dos dois. Dos Passos deu uma guinada à direita, como reação ao stalinismo, que fez matar o líder republicano (o nome é fictício, mas o personagem é real). Para Stálin, não ficava bem apoiar um líder da guerra pela República que tinha um irmão do lado de Franco."Boa parte do envolvimento na Guerra Civil é visto pelos olhos do lendário Joris Ivens e do documentário – Terra Espanhola –, que ele realiza. A primeira metade – a Guerra Civil – é melhor. Com orçamento modesto para os padrões de Hollywood (US$ 7 milhões), Kaufman faz milagres ao trabalhar a imagem e recriar a estada de Hemingway e Gellhorn em diferentes partes do mundo. O envelhecimento de Nicole Kidman, que faz o papel, talvez seja o melhor trabalho de maquiagem que você já viu, ou vá ver. Mas Kaufman não concorda que essa primeira parte seja melhor. "É a mais heroíca. É duro ver a miséria de nossos ídolos, e é do que trata a segunda parte. Sou suspeito, mas é minha preferida."Veja o trailer:Fonte: Estadão