Do bonde ao ônibus: O início do transporte coletivo de Teresina

Hoje, aos 163 anos, Teresina é uma cidade que possui 123 bairros e 840 mil habitantes. Mas para chegar ao seu porte atual, muitos caminhos foram percorridos. Ao longo do tempo, as ruas se cruzaram e se multiplicaram conforme a população, a migração e a importância da capital piauiense cresciam. Da mesma forma, a necessidade de se deslocar pelo espaço público de forma rápida e segura ficou latente, quando os quarteirões se expandiam em número para além das quadras projetadas e umbilicalmente ligadas ao rio Parnaíba. 

Por falar nele, vem do Velho Monge o primeiro veículo de transporte coletivo, ainda que intermunicipal: a barca, que no século XIX fazia o trajeto Floriano – Parnaíba e parava nas cidades ao longo do rio. 

Entretanto, em terra firme, a primeira iniciativa de transportar a população de forma coletiva surgiu 75 anos depois da fundação da cidade, e veio sobre trilhos. Não, não foi o trem. Ele só chegou em 1938, mesmo com a estação lhe esperando, prontinha, desde 1926. Em 1927, os teresinenses começaram a se locomover de bonde. 

O trecho era pequeno, é bem verdade: cerca de três quilômetros. Contemplava a Rua Grande, atual Álvaro Mendes até a estação do trem, na atual Miguel Rosa. A historiadora Mary Lucia Carvalho, que escreveu o livro “O ônibus só sai depois que estiver cheio”, que trata do transporte urbano em Teresina entre as décadas de 1930-1960, conta em sua obra, a partir de relatos de jornalistas da época e de trabalhos de estudiosos do tema, como os professores Francisco Alcides do Nascimento e Pedro Vilarinho Castelo Branco, que o veículo nasceu para atender os anseios da elite. 

“Nos anos 1920, nós só tínhamos dezoito quadras (de extensão) na cidade. Se você contar a partir da praça da Bandeira até a Miguel Rosa, são exatamente dezoito quadras. E poucas ruas tinham calçamento. A Inspetoria Federal (órgão responsável na época) mandou fazer os trilhos em meio a muita areia. Havia muitos descarrilamentos”, relata.

 

 

De acordo a estudiosa, relatos dos jornais dão conta que o bonde transportava estudantes e trabalhadores sempre pela manhã, mas aos domingos, funcionava durante todo o dia, como um divertimento para a população. O passeio no veículo era ainda uma recompensa para as crianças que se comportavam durante a semana. 

A demanda pelo transporte acabou fazendo com que fosse necessário ampliar o número de assentos, que veio com o Rebocado, uma extensão acoplada ao bonde, que acabou trazendo um fator paradoxal: ao mesmo tempo em que podia ser utilizado por ricos e pobres, as classes tinham seus espaços diferenciados, assim como o valor das passagens não era igual e dependia do local onde o passageiro ficava. 

“Segundo o Ogmar Monteiro, em suas memórias, havia essa diferenciação de os pobres ficarem atrás (no rebocado) e até a questão comportamental. Nos ônibus, nas décadas seguintes, a gente também percebe isso”, diz Mary Lúcia. A diferenciação também se dava pelas vestes e na forma de se portar, como explica Pedro Vilarinho, em trecho reproduzido no livro da autora. 

Dois anos depois de idas e vindas, com a diminuição dos usuários e os problemas da máquina, o bonde foi desativado e posto à venda pela Intendência Municipal no dia 26 de novembro de 1929. 

 

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Carlos Lustosa Filho carloslustosa@cidadeverde.com