Operação Prodígio: líderes têm preventiva decretada e ganhavam 35% por golpe

Foto: reprodução SSP-PI

 

Por Graciane Araújo

Quatro suspeitos de integrar a organização criminosa que causou prejuízo de R$ 19 milhões a um banco tiveram as prisões preventivas decretadas pela Justiça. Anderson Ranchel, Handerson Ferreira Barbosa, Sávio Máximo de Sousa Andrade e Ilgner de Oliveira Bueno Lima são apontados como líderes do esquema e ganhavam cerca de R$ 35% em cada golpe. A investigação da Polícia Civil apontou que cada líder gerenciava um grupo de pessoas que eram divididos em 'corretores' e 'clientes'. 

Foto: Renato Andrade/ Cidadeverde.com

"A soltura dos demais presos [26] é um processo natural no curso da investigação. Pra essa fase ostensiva representamos por 30 mandados de prisão temporária, uma prisão que é necessária por cinco dias, e dessas pessoas só havia a necessidade de converter em prisão preventiva de quatro pessoas que exerciam a posição de liderança nessa associação criminosa. É uma investigação técnica, um trabalho exitoso e que é necessário segregar a liberdade daqueles que efetivamente vinham praticando o crime de maneira seriada, recrutando vários supostos clientes para fraudar o banco", explica Anchieta Nery, diretor de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Piauí (SSP-PI). 

VEJA COMO ERA DIVIDIDO O GRUPO E A PORCENTAGEM NO ESQUEMA CRIMINOSO

- LÍDERES - RESPONSÁVEIS POR OPERAR A FRAUDE (CERCA DE 35%)

- CORRETORES- RESPONSÁVEIS POR PROCURAR CLIENTES (CERCA DE 15%)

- CLIENTES - PESSOAS QUE TOPAVAM EMPRESTAR O NOME PARA SER USADO NA FRAUDE COM PROFISSÃO E RENDAS FALSAS (50%)

A fraude envolveu cerca de 100 pessoas, sendo a maioria 'clientes', todos já identificadas pela Polícia Civil do Piauí. Desse total, 30 foram presos na primeira fase da operação Prodígio, deflagrada na semana passada. 

LEIA TAMBÉM Polícia deflagra operação contra fraude que causou prejuízo de R$ 19 milhões a banco Líder da associação criminosa era vendedor de celular e foi aos EUA 10 vezes em menos de 2 anos Suspeita de golpe milionário diz que começou a estudar medicina aos 10 anos Prints revelam conversas entre suspeitos de fraude milionária em banco no Piauí

 

Dos R$ 19 milhões, R$ 5 milhões foram desviados de agências bancárias no Piauí. Até o momento, R$ 2 milhões foram sequestrados entre dinheiro, carro e até veículo aquático.

"O resto foi gasto em viagem internacional, uísque, farra, roupa de marca. Não roubam para guardar e investir no futuro, eles roubam pra usar", diz o delegado.

Dos quatro presos preventivamente, três se conheciam desde a adolescência e moravam no bairro Parque Piauí, na zona Sul de Teresina. 

"Eram motoristas de app até tomarem conhecimento dessa fraude e passarem a tombar o banco. Aí o padrão de vida deles já muda bastante, mudam-se do bairro para morarem em locais bem mais caros, começam a fazer viagens internacionais, comprar veículos na casa de centenas de milhares", explica Nery.

Com o passar do tempo, a ganância começa a afetar a amizade do trio. Anderson Ranchel, que teria iniciado a fraude e ensinado os demais, demonstra sinais de insatisfação. A partir daí tem início a divisão e cada a um começa a liderar um grupo de pessoas.

Foto: reprodução Instagram

"O Anderson Ranchel entende o golpe e traz os amigos, mas a partir do momento em que eles entendem, o Anderson Ranchel reporta que os outros começaram a passar a perna nele, deixar ele para trás e correr em raia própria. Por isso, no organograma, nós temos quatro grupos criminosos. O quarto é uma pessoa que vinha se apresentando como pré-candidato a vereador da cidade de Amarante, com raízes familiares lá, mas residia em Teresina, e cooptou uma série de clientes lá que, no momento adequado, serão intimados", explica o delegado.

A fraude era realizada por meio do aplicativo bancário e consistia em enganar a instituição financeira. Para conseguir a liberação de crédito, os criminosos alegavam ser médico, engenheiro e jogador de futebol e movimentavam, entre si, altos valores. 

"Eu convido alguém para se passar por cliente do banco e essa pessoa concorda. A primeira etapa da fraude consistia em abrir a conta em nome de outra pessoa inserindo dados falsos, como, por exemplo, a profissão. A segunda etapa era a simulação de transações financeiras entre as contas operadas pela organização criminosa, no intuito que o banco acreditasse que era uma operação legítima", explica o delegado, que dá detalhes de como funcionava o golpe. 

"Eles entenderam que o banco validava certas profissões com um status de maior renda como médico, engenheiro civil e atleta profissional (jogador de futebol). Por exemplo, abro uma conta para uma garota de 19 anos informando que ela é médica e recebe mensalmente R$ 35 mil. De cara, o banco não vai acreditar nisso. Mas daí, após informar essa renda, daqui a dois ou três dias, já cai uma transferência de R$ 35 mil e começam as movimentações. Por trás disso não se tem um operador humano, mas um algoritmo que vai entender essas transações e pensar que é uma cliente legítima, de uma profissão bem conceituada, está movimentando a conta e precisa de mais crédito".

Sobre as profissões, o delegado brinca ao dizer que o Piauí nunca teve tanto atleta profissional. 

"Até cheguei a brincar que o nosso futebol piauiense nunca esteve tão em alta, dada a quantidade de atletas profissionais, classe jogador de futebol, que foram cadastrados nesse banco em Teresina. Na verdade, eram pessoas de verdade com profissões falsas e rendas falsas", comenta o diretor de Inteligência da SSP-PI. 

RECRUTAMENTO

O recrutamento dos 'clientes' era feito por meio de banners digitais e, principalmente, através do "boca a boca".

"Os líderes, por meio de corretores, anunciavam em grupos de aplicativo de mensageria, pelo Instagram, até mesmo nas ruas de bairros da zona Sul, ofereciam a possibilidade de altos empréstimos, aumentando muito o score de quem desejasse uma operação financeira dessa e ainda diziam que depois não era necessário fazer o pagamento. Ofereciam, por exemplo, empréstimos de R$ 40 mil e a comissão variava de 30% a 40%", explica Nery. 

Para ele, os suspeitos que operavam como 'clientes' sabiam que se tratava de um esquema criminoso. Ele frisa que todos já foram identificados e serão intimados.

"Existem diversos tipos de prova no inquérito que demonstram que eles, de fato, sabiam que estavam aderindo a uma conduta criminosa. Todos serão intimados, mas se quiserem se antecipar podem se apresentar espontaneamente na SSP-PI e demonstrar o interesse em colabora. Isso evita qualquer medida restritiva, tipo a prisão, e ganha a atenuante genérica da confissão", finaliza Anchieta Nery.