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A polêmica da atualização de valores na Justiça do Trabalho

A polêmica da atualização de valores na Justiça do Trabalho

 

Por Cláudio Manoel do Monte Feitosa*

Claudio Feitosa - Advogado - Claudio Feitosa Advogados | LinkedIn

Há muito já se discute sobre a questão da atualização de valores devidos em execuções na Justiça do Trabalho, especialmente no que toca ao critério de correção monetária e de juros para a satisfação do credor.

Como as referências de valores variam de acordo com o tempo, em face da natural desvalorização da moeda, é primordial que, no Ordenamento Jurídico Brasileiro, haja regras de proteção para garantir ao credor, particularmente aquele que tem direito à devida recomposição de seus créditos, até ser finalmente concretizado o objetivo maior da Justiça: o pagamento de valores reconhecidos em sentença judicial.

Também, não se nega o componente pedagógico da necessidade da atualização, para que o devedor não fique estimulado a postergar a cumprir suas responsabilidades, pois, se valor não fosse corrigido, a dívida restaria irrisória ao final da demanda, impactando negativamente em demandas que podem inclusive durarem década. Nesta toada, só para ilustrar a questão da desvalorização da moeda, como referência, o salário mínimo de 2011 era R$ 540,00 (quinhentos e quarente reais), o que representa menos da metade do valor que esta referência possui hoje: R$ 1.100,00 (um mil e cem reais), fixado desde janeiro/21. 

O sistema legal do País é complexo, e gera muitas dúvidas acerca de qual forma ou fórmula deverá ser adotada pelo Judiciário para a finalidade da dita atualização de valores, observando-se primordialmente o equilíbrio entre as partes, credor e devedor, para que o primeiro seja plena e adequadamente satisfeito quanto ao seu direito e o segundo pague o importe justo. Ressalta-se que na calculadora do cidadão, contida no sítio eletrônico do Banco Central, há vários índices para correção de valores, como, entre outros, o IPCA (índice de preço ao consumidor aplicado), IGPM (índice geral de preço médio), INPC (índice nacional de preços ao consumidor), sendo que cada um é utilizado por diferente setor do mercado. A construção civil utiliza a referência própria, o INCC – índice nacional da construção civil. Os pactos locatícios são corrigidos por outro índice: IGPM que é medido pela FGV – Fundação Getúlio Vargas. Ou seja, este emaranhado de índices torna muito complexo e confuso o assunto.

Mas, voltando-se à questão da atualização trabalhista, pontua-se que, em 12.02.21, houve a publicação de decisão do plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, sobre os critérios a serem adotados para correção dos créditos trabalhistas, após análise das ações: Ação Direta de Inconstitucionalidade 5867 e a 6021 e das Ações Diretas de Constitucionalidade 58 e 59, sendo que, ao final, por maioria, foi firmado entendimento de que o índice de correção de valores das dívidas trabalhistas seria o IPCA, desde a origem do crédito até ao protocolo da demanda, e que, após o ajuizamento da ação, o índice a ser adotado seria a SELIC, que representa a taxa básica de juros firmada pelo Banco Central do Brasil.  

Pontua-se que a Selic é a principal ferramenta de política monetária do Banco Central para estabilizar a moeda e manter a inflação oficial dentro da meta do governo. Ou seja, não deixa de ser uma referência técnica com pitada política. Inclusive, a SELIC é a referência de correção de valor de impostos em prol do poder público, bem como para as correções de obrigações cíveis em geral.

Assim, a posição citada do STF quebrou o paradigma até então adotado pelo TST – Tribunal Superior do Trabalho que, antes, havia firmado entendimento reconhecendo o IPCA como único índice de correção desde o fato gerador da dívida, mais juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir do ajuizamento da ação. 

A polêmica orbita no fato de que fixação da SELIC pelo STF, após o ajuizamento da ação, teria promovido perdas para o credor trabalhista já que a forma de correção adotada pelo TST era mais vantajosa para aquele credor. As maiores críticas apresentadas no ambiente jurídico, em desfavor da recente decisão do Supremo, residem no fato de que a mesma teria afastado os juros mensais (1% ao mês), após o protocolo da demanda, o que implicaria, pela lógica da decisão, já que a SELIC teria como componente os juros. O Direito Brasileiro veda o que tecnicamente constitui o anatocismo, ou seja, a prática de aplicar juros sobre juros, já que isto produziria robusta desequilíbrio jurídica entre as partes de uma obrigação, credor e devedor.

Apesar da decisão do STF ter sido tomada em sede de repercussão geral, inclusive vinculando a todos os atos do Judiciário Trabalhista, observa-se que há rejeição do julgado em questão nas ações de execução, sendo que, recentemente, em 01.03.2021, o Ministro Alexandre de Morais, do STF, acolheu reclamação em face de um Magistrado Gaúcho que não admitia a forma definida de correção pelo Supremo de correção e que mandou aplicar a atualização nos moldes definidos pelo TST.

Para demonstrar a polêmica, o advogado Carlos Eduardo Dantas Costa, conforme registro do sítio eletrônico www. conjur.com.br, de 14.03.2021, explicitou a seguinte declaração: "A decisão cassada por meio da Reclamação 46.023 retrata um pouco de tudo o que há de pior na Justiça do Trabalho: indisciplina judiciária, insegurança jurídica, ativismo e parcialidade".  

Esclarece-se, também, que na decisão do Supremo, publicada em fevereiro último, há o registro de que a postura adotada pela Corte se refere ao momento jurídico atual do País, pela ausência de regulamentação específica de correção das dívidas trabalhistas, e que a matéria só poderia ser alterada pelo Congresso Nacional.

Portanto, esta polêmica ainda se perpetuará!

 

*Cláudio Manoel do Monte Feitosa é Advogado especialista em Direito Empresarial e Trabalhista.