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Aliança de centrão e governo se mostra instável e depende de negociações e novos testes

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Foto: RobertaAline/CidadeVerde.com

Os 316 votos conquistados na Câmara na quinta-feira (20) para manter o veto ao reajuste de servidores públicos não devem ser, na avaliação de líderes partidários, assimilados como um triunfo do governo Jair Bolsonaro em conquistar uma estável base aliada de deputados.
A aliança com o centrão –grupo de partidos como PP, PL e Republicanos que se aproximou do governo após a liberação de emendas e cargos– rendeu resultados, mas o mapa de votação expõe a forte influência do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no plenário. O que pode não se repetir.

Interlocutores do Palácio do Planalto se mobilizaram e ligaram para deputados. A cobrança foi por fidelidade, já que o centrão entrou de vez no governo e tem poder de fazer indicações políticas em órgãos com orçamento bilionário.
Mas também houve ameaça. Em caso de derrota, o discurso era o de que não sobraria dinheiro para cumprir as negociações em curso: socorro a empresas de ônibus (que já tinha o apoio da equipe econômica), obras (emendas parlamentares) e prorrogação do auxílio emergencial.

Logo após a votação, na qual foi garantido o amplo congelamento salarial de servidores públicos até o fim de 2021, defendido pelo ministro Paulo Guedes (Economia), parlamentares afirmaram que será necessária uma negociação mais robusta para as próximas pautas do governo, como reformulação de programas sociais, privatizações e reforma tributária. É de Maia o título de principal articulador político para assuntos ligados à agenda fiscal (controle de despesas públicas), monitorada pelo mercado financeiro. Foi assim na aprovação da reforma da Previdência e, nesta quinta, na votação que, por 316 a 165, travou reajustes salariais a servidores até o fim de 2021.
O presidente da Câmara, porém, não é próximo a Bolsonaro e deverá colidir com o Palácio do Planalto na eleição para sua sucessão, em fevereiro do ano que vem, e nas eleições presidenciais de 2022.


No centrão, o PP foi o grande puxador de votos. Dos 39 deputados, 36 apoiaram o veto de Bolsonaro. Uma taxa de mais de 92%. O partido, um dos mais investigados por denúncias de corrupção, foi fiel. Ganhou recentemente a liderança do governo na Câmara, ocupada por Ricardo Barros (PP-PR). Além disso, o líder do PP, deputado Arthur Lira (PP-AL), atua como articulador informal do Planalto.
No entanto, o PL, partido que fez indicações para o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), apresentou um saldo menos favorável ao veto: 73,5% dos votantes. A bancada tem 41 deputados. Desse total, 34 estiveram na sessão e 25 votaram com o governo.
Siglas mais ligadas à agenda de Maia, como DEM e PSDB, tiveram um peso maior na votação. Todos deputados estiveram presentes, e o índice foi superior a 82% (pela manutenção do veto).

Se o veto fosse derrubado, seria aberta uma brecha para reajustes a algumas carreiras, como policiais, médicos e professores, o que poderia, segundo o Ministério da Economia, representar um aumento de despesas entre R$ 98 bilhões e R$ 120 bilhões aos cofres da União, estados e municípios.

Na quarta (19), o Senado, por 42 votos a 30, votou pela derrubada do veto. O resultado surpreendeu o governo, que pediu o adiamento da votação na Câmara para ganhar tempo e conseguir negociar com deputados.
Maia foi acionado pelo Palácio do Planalto. Ele, então, montou uma estratégia junto com Barros. Desde maio do ano passado, o diálogo entre Maia e o antigo líder do governo na Câmara, major Vitor Hugo (PSL-GO), estava prejudicado por divergências e ataques ao presidente da Casa.

A avaliação de deputados é que o governo não pode contar com o empenho de Maia nas próximas grandes votações. Em parte delas, há convergência com a agenda do presidente da Câmara, como na reforma tributária. Mas, mesmo dentro desse tema, ele é contra a proposta de Guedes para criar um tributo semelhante à CPMF.

Na discussão do Renda Brasil (reformulação do Bolsa Família), Maia também já indicou que há resistência na Casa à ideia de acabar com benefícios sociais, como o abono salarial. Essa é uma das principais apostas de Guedes para conseguir dinheiro e ampliar o Bolsa Família.
Outro veto de Bolsonaro, previsto para ser votado em setembro, também coloca Maia e governo em lados opostos. O Congresso aprovou a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos, que hoje beneficia 17 setores, até o fim de 2021. A pedido de Guedes, o Planalto vetou.
A medida, que reduz os custos de contratação de funcionários, tem um custo de mais de R$ 10 bilhões por ano. Mas Maia, nesse caso, defende que o benefício deve ser estendido, o que diminui a arrecadação federal.

Com uma base aliada ainda instável, o governo vem pedindo o adiamento da votação desse veto. Apesar dos esforços na articulação, o clima no Congresso ainda é contra o que deseja Guedes.Para conseguir manter o veto à prorrogação da desoneração da folha, o governo precisará de 257 votos dos 513 deputados. Questionado sobre a aproximação do centrão com Bolsonaro, Barros disse que as conversas entre Planalto e Câmara estão mais amadurecidas. Para ele, o governo está em outro momento, o que facilita seu trabalho.

"Eu acho que o presidente amadureceu como presidente da República, o Congresso amadureceu na relação com este presidente e as coisas vão convergindo, o que é natural, ao longo do tempo. Este momento em que estou assumindo é muito diferente do primeiro momento do governo. Então, minha tarefa está mais fácil", afirmou em entrevista à reportagem. No entanto, após a derrota sofrida no Senado na quarta, auxiliares do presidente Bolsonaro chegaram a avaliar uma retaliação a senadores governistas que votaram contra a orientação do Palácio do Planalto.

Foram apontados como traidores Soraya Thronicke (PSL-MS), Daniella Ribeiro (PP-PB), Jorginho Mello (PL-SC) e Izalci Lucas (PSDB-DF). Eles votaram pela derrubada do veto, o que poderia blindar categorias do serviço público do congelamento salarial até 2021.
Uma possibilidade era que Lucas perdesse a vice-liderança do governo no Senado. Mas isso depois foi descartado.
A retaliação era comum em governos anteriores que formavam uma base de apoio no Congresso por meio de coalizões, resultando assim em indicações políticas para cargos até de primeiro escalão do governo.

Fonte: Folha Press

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