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Magreza extrema volta à moda, revivendo o estilo 'heroin chic' com remédios

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Foto: Freepik

 

Muito possivelmente você já tenha lido ou ouvido que a bunda exuberante de Kim Kardashian não é obra da natureza, mas sim de um procedimento chamado, em inglês, de "Brazilian butt lift", BBL para os íntimos. Não há só uma maneira de aumentar o tamanho dos glúteos –pode ser com gordura do próprio corpo, aspirada de outra área, com próteses de silicone ou com injeções de preenchimento.

Mas, pelo que parece, essa é uma técnica que entra em decadência conforme a década de 2020 vai tomando sua forma. Nem Kim Kardashian, que costumava deixar seu "derrière" o mais evidente possível em todas as roupas e poses, tem muito mais o que mostrar.

Depois de perder sete quilos em três semanas no primeiro semestre, para conseguir entrar no vestido de Marilyn Monroe no Met Gala, em maio, Kim continuou emagrecendo e já perdeu, no total, 20 quilos. Sua irmã Khloé também emagreceu 27 quilos, ganhos na gravidez de sua filha, True, de quatro aninhos. Dieta e exercício, as duas respondem quando indagadas.

Elon Musk, que perdeu nove quilos no último ano, tuitou que foi o jejum intermitente o seu método, e aconselhou até o uso de um aplicativo, o Zero Fasting App. Mas, por fim, revelou o segredo: Wegovy, um remédio com o mesmo princípio ativo do Ozempic, a semaglutida. Wegovy ainda não chegou no Brasil, mas o Ozempic, sim, e é vendido sem receita, em qualquer farmácia.

Ambos são do mesmo laboratório, o Novo Nordisk, e foram inventados para tratar diabetes tipo 2. São injetáveis, vendidos em uma espécie de caneta com agulha mínima que os próprios pacientes se aplicam uma vez por semana. Segundo a endocrinologista Silvia Corral, "a estrutura química da semaglutida é semelhante a um hormônio produzido pelo sistema digestivo chamado de GLP-1. Uma das funções desse hormônio é regular nossa saciedade".

Outra coisa que o medicamento provoca é uma lentidão no esvaziamento do estômago, que faz com que a pessoa se sinta –e de fato esteja– com a barriga cheia mesmo tendo comido menos do que o habitual. Por esses dois motivos, quem usa Ozempic, seja para tratar diabetes, obesidade ou simplesmente por vaidade, emagrece.

Corral alerta que nenhum remédio funciona da mesma maneira para todas as pessoas, mas diz que a semaglutida é "uma medicação, de forma geral, segura". Entre seus efeitos adversos mais comuns estão náusea, prisão de ventre e refluxo, e ele não deve ser usado em quem tenha histórico de pancreatite.

Nada disso parece assustar celebridades de Hollywood ou das TVs brasileiras e pessoas ligadas ao mundo da moda, que, de uma hora para outra, têm surgido muitos quilos mais magras.

Nas passarelas, nos editoriais de moda e nas fotos que adornam lojas de grifes caras as magricelas também voltaram a reinar, como nos anos 1990 e começo dos 2000, era do visual "heroin chic", que tinha Kate Moss e seus hábitos pouco saudáveis como ícones.

Um artigo na seção de lifestyle do jornal americano New York Post, que circulou com o título "Bye-bye Booty: Heroin Chic is Back", ou "tchau popozudas: 'heroin chic' está de volta", viralizou no mês passado.

Trazia uma foto de Kate Moss nos anos 1990 com cara de fim de noite, cigarro na mão, camisetinha branca regata e os braços fininhos rodeada por imagens atuais das irmãs Kardashian repaginadas. Havia também uma magérrima de vestido transparente da grife Miu Miu, e Bella Hadid, modelo e celebridade que encerrou a fashion week de Paris no desfile da grife francesa Coperni, em que apareceu só de calcinha, revelando o corpo ultra esguio, e teve um vestido de tinta spray branca pintado em seu corpo, na frente do público.

A ideia da grife era apresentar essa tecnologia avançadérrima, capaz de criar um look sob medida em poucos minutos com tinta spray. Mas o que a performance fez, na verdade, foi coroar a volta do ideal magricela de beleza, que já vinha dando várias amostras para anunciar seu retorno.

Nos anos 1990, era comum ouvir que se Marilyn Monroe fosse uma mulher daquela época, com seu manequim 44, seria considerada uma pessoa gorda.

Pois Kim Kardashian, celebrada nos últimos anos por ter glamourizado o formato de corpo violão, com peitão, bundão e cinturinha, e que ficou bilionária com uma empresa que vende justamente cintas para apertar a barriga e alcançar esse visual sem botar a saúde em risco, emagreceu loucamente para caber no vestido de Marilyn e não parou por aí.

Agora, magra mesmo, até para os padrões dos anos 1990, lota seu perfil no Instagram de imagens não só de biquíni, mas obviamente "photoshopadas" para parecer ainda mais esguia.

E o mercado farmacêutico é que não vai fazer nada para frear essa tendência. Ao contrário, o mesmo laboratório lançou o Ozempic agora em comprimidos, com o nome Rybelsus, que também é vendido sem receita em qualquer farmácia. Não há genéricos de nenhum dos dois medicamentos.

Por enquanto, a única barreira entre qualquer pessoa que queira adotar o look da moda e o uso desses remédios é o preço. O Ozempic custa entre R$ 800 e R$ 1.200, dependendo da dosagem, e dura um mês. O Rybelsus vem em caixas com 30 comprimidos e custa entre R$ 500 e R$ 950, também dependendo da dosagem.

A dermatologista Juliana Mendonça, que tem visto em seu consultório cada vez mais pacientes perdendo peso com o uso do Ozempic, se preocupa que, quando a chegada do Rybelsus for mais popularizada, vai aumentar ainda mais esse número de pessoas que usa o medicamento sem indicação.

"Muita gente tem receio ou não consegue mesmo aplicar medicações injetáveis em si mesma. Mas, por via oral, não há nenhum medo. Acredito que isso será um facilitador para a automedicação", diz.

O problema dessa volta do visual 'heroin chic', segundo as duas médicas ouvidas nesta reportagem, é que fazer de um tipo físico uma tendência de comportamento é algo completamente insustentável.

"Na busca por se enquadrar a um padrão de beleza, as pessoas podem buscar dietas milagrosas ou outros recursos que podem botar sua saúde em risco, além de predispô-las a distúrbios alimentares", afirma Juliana Mendonça.

"Eu me preocupo sempre com os j ovens, que são mais suscetíveis a seguir tendências", diz Corral, a endocrinologista. "Essa tendência de um perfil físico excessivamente magro pode gerar distúrbios de imagem corporal, que geralmente estão associados a outras doenças psiquiátricas, como depressão, ansiedade, abuso de medicações e aumento de risco de suicídio."

Se os últimos 20 anos foram dominados pelo Viagra e pelo Botox, dois medicamentos que surgiram no final do último milênio e logo ocuparam um lugar definitivo no vocabulário da cultura social moderna, o Ozempic e, agora, o Rybelsus, parecem seguir os mesmos passos.

Todos, no fundo, prometem curar feridas profundas que a vida traz, quando leva com ela a juventude, a pele lisa do rosto, o corpo intacto –nem sempre magro, mas sem tantas cicatrizes, e funcionando como Deus quis.

Mas, enquanto a população do mundo inteiro não atinge o nirvana coletivo e supera a vontade de se parecer com modelos e gente linda de Hollywood, a hashtag #Ozempic vai ganhando tração, e já tem quase 300 milhões de visualizações no TikTok.

O corpo humano não é uma moda passageira, que a gente pode experimentar por uma temporada e descartar na próxima. Ao contrário da microssaia da Miu Miu, um pedaço de pano plissado de 20 centímetros, de cintura baixa e preço nas alturas que virou hit absoluto no primeiro semestre, e que a atriz Nicole Kidman vestiu na capa da revista Vanity Fair, aos 54 anos, no primeiro semestre.

 

Fonte: Folhapress

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