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"Elis não tinha medo de entrar de cabeça", afirma biógrafa dos 30 anos

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Elis Regina passou como um furacão pela música brasileira. Chamou atenção nacionalmente cantando "Arrastão" no 1º Festival de MPB, em abril de 1965. Sua morte foi em 19 de janeiro de 1982 --há 30 anos completados nesta quinta-feira (19). Entre as duas datas, foram incontáveis apresentações, quase três dezenas de álbuns e uma produção intensa e marcante, lembrada e cultuada século 21 adentro. 

 
Lançado originalmente três anos depois da morte da cantora, a biografia "Furacão Elis" conta a história da intérprete gaúcha através de entrevistas e relatos, livro-reportagem da jornalista Regina Echeverria. Com mais de cem mil cópias vendidas desde o primeiro lançamento, segundo sua autora, "Furacão Elis" ganha em 2012 nova edição, nas lojas pela editora Leya.

A autora do livro, Regina Echeverria, fala sobre a nova edição da biografia e as lembranças e importância de Elis até hoje.
 

 O que há de novo na edição 2012 de "Furacão Elis"?

Regina Echeverria - O livro saiu originalmente pela editora Círculo do Livro, depois pela Nórdica, aí pela Globo, então pela Ediouro e agora pela Leya, em uma edição nova, com novo projeto gráfico e fotos diferentes. Tentei manter sempre esse livro em catálogo, e isso me deu a chance de mexer nele ao longo desse tempo, colocar entrevistas que eu não tinha colocado, deixá-lo mais completo. Agora acrescentei uma entrevista com o Paulo César Pinheiro. A primeira música que ele fez com o Baden Powell foi "Lapinha" e a Elis ganhou o festival da Bienal do Samba com ela, depois gravou várias outras. Ele também foi casado com a Clara Nunes e me contou sobre a relação das duas --coisa nova para mim, porque eu não sabia. Elas se encontraram muito na casa dele, fizeram coisas juntas, se divertiam juntas. É interessante, porque a Elis era uma pessoa competitiva, quase não tinha amigas cantoras.

A figura de Elis ainda é muito representativa hoje?

Regina Echeverria - Bastante, talvez até mais. Desde que eu lancei esse livro até hoje, todo janeiro sou entrevistada por causa da data da morte. Agora nos 30 anos da morte, claro, tem mais interesse. Por que são três gerações, é um tempo. E ela esta aí, né? Ainda tenho muito retorno de uma geração que aprendeu a ouvir Elis com os pais. Ela morreu nova, com 36 anos, mas deixou uma obra relativamente grande para o tempo dela. Não era uma grande vendedora de discos --fora o álbum "Dois na Bossa" (1965), que foi um dos discos mais vendidos da história-- e, no entanto, quando ela morreu houve uma comoção nacional sem precedentes, comparável à dos grandes ídolos, como Orlando Silva e Carmen Miranda.
 
 Até hoje ela é considerada uma das maiores cantoras do Brasil...

Regina Echeverria - Dá para dizer que foi a maior cantora do Brasil, sem medo de errar. Te dou todos os argumentos. Primeiro: uma voz límpida, de registro popular. Segundo: uma dicção perfeita, talvez pelo fato dela ter nascido no Sul. Terceiro: uma sofisticação adquirida na escolha do repertório --digo adquirida porque nos primeiros discos ela foi lançada para ser uma nova Celly Campelo para um público que não seria o dela. Quarto: deu a sorte de nascer numa geração de compositores muito talentosos que usaram a voz dela como um canal de divulgação de seu trabalho. Ela lançou muita gente nova. E continua, para mim, uma mulher do Brasil, uma cantora do Brasil, com uma voz do outro mundo.


 Ela parece ter sido uma artista inquieta, sempre em busca de coisas novas...

Regina Echeverria - Olha, para você ver: em uma de nossas últimas conversas sobre assunto de música e tal, quando ela ainda morava lá na Cantareira, ela falou que estava procurando novas maneiras de usar a voz, que queria cantar Arrigo Barnabé --que, na época, era algo muito estranho. Era uma inquieta, à procura. Não tinha medo não de entrar de cabeça nas coisas. Agora, também era uma pimentinha. Muita gente brigou com ela, não aguentava a personalidade dela. Era uma pessoa de temperamento, que não levava desaforo para casa, que respondia, que não tinha medo de fazer declarações, sempre dizia coisas interessantes.
 
 Você gosta da Maria Rita? Acha ela parecida com a mãe?

Regina Echeverria - Gosto da Maria Rita, acho que ela é uma grande cantora. Acho que ela pegou o bastão. Ela tem uma coisa de DNA na voz, de timbre parecido, mas tenho certeza que ela conseguiu fazer a personalidade dela longe da mãe. Deve ser muito difícil para ela, imagina? Essa menina é danada, ela tem personalidade. Deve ser cobrada, e por uma coisa natural, ela é apenas filha (risos). Ela não quis imitar a mãe, fez um caminho dela, tem um jeito dela. Achei legal ela fazer agora um show cantando Elis. Se alguém tem direito, é ela. Estou curiosa para ouvir. Ela é uma excelente cantora, mas... eu sou mais a mãe, né? (risos)
 
Que gravações você mais recomenda para ouvir Elis?

Regina Echeverria - A minha faixa preferida é "Rebento", do Gil. Acho que essa música é a Elis. A gravação dela de "Aquarela do Brasil" é um achado. "Fascinação", a gente chora. Milhões de coisas que ela gravou. Ah, "Elis e Tom" (1974) é imperdível. Gosto de tantos discos dela: do "Ela" (1971), do "Essa Mulher" (1979), do "Falso Brilhante" (1976), talvez o que eu mais goste. Vi esse show muitas vezes, adorava. Foi quando ela criou um novo estilo de fazer show, usando o corpo, a dança, a música e a voz dela. Era muito bonito esse espetáculo e ficou muito tempo em cartaz.
 
Trinta anos depois, é tabu falar na causa da morte da Elis?

Regina Echeverria - Tabu para quem? Para mim, não. Os fatos como se deram estão descritos no meu livro. Eu considerei um acidente de percurso de uma novata no assunto, que entrou de cabeça e não segurou. Não tem polêmica na morte dela: morreu numa overdose de cocaína, ponto. Mas ela não entrou para história como uma pessoa que era drogada, você não associa a morte dela à droga. Todos os jornais, revistas e televisões tocaram no assunto, mas parece que ficou numa nuvem. As pessoas não acreditam direito, acham que não é bem verdade. Muita gente não quer saber a verdade.


Fonte: Uol

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