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O que sobrou de nós?

Dois anos de pandemia

A pandemia de COVID-19 deixou muitas lições, sendo que a maioria delas não poderão ser esquecidas por esta geração que viveu intensamente o medo, as restrições e as consequências do momento. O medo do desconhecido, as restrições impostas aos diferentes setores e as consequências a curto, médio e longo prazos povoaram a realidade de boa parte das pessoas, especialmente os ávidos por informações. Outro aspecto inesquecível foi a quantidade de pessoas que revelaram sua verdadeira face com a politização da pandemia. A quantidade imensa de profissionais reconhecidos como bons profissionais que mostraram seus reais posicionamentos anticiência e antivacina, principalmente. Nomes dos quais não se restava a menor dúvida de que eram respeitados entre seus pares e que mostraram sua face real, confundindo pacientes e a sociedade em geral.

Eu jamais vou esquecer da semana do dia 16 de março de 2020. Nesta segunda-feira atípica, o Brasil inteiro fechou com o estabelecimento de regras novas. O fechamento da indústria, do comércio e do setor de serviços. O pavor criado pelos órgãos de imprensa que anunciavam sobre uma doença desconhecida e altamente infecciosa que havia surgido na China e simplesmente afogava o paciente, foi apavorando a população. O medo do desconhecido aliado à boataria, às teorias das conspirações e às Fake News foram tomando de conta das pessoas mais atentas e preocupadas com o desenrolar dos fatos. Na época eu estava na Presidência do Conselho Estadual de Educação do Piauí e o segmento da educação foi um dos primeiros a parar e a ficar praticamente sem perspectivas.

Com a obrigação de buscar meios para tentar amenizar o impacto sobre a educação das crianças, principalmente, procurei pesquisar o que estava acontecendo em vários países do mundo e em outros estados brasileiros. Montamos um grupo de conselheiros que se dispuseram a trabalhar mais fortemente e para rascunhar normas que tornassem válidos os estudos feitos de modo remoto, utilizando as vias que fossem possíveis para compensar a falta do presencial. Foram dias intensos, de muita troca de informações com os presidentes de outros conselhos estaduais e com muitas noites insones. Pesava sobre nós a responsabilidade de gerar caminhos para que a educação não fosse tão prejudicada.

O trabalho resultou em uma nota técnica inicial, orientativa, e logo em seguida as minutas de duas Resoluções. A segunda Resolução, que norteou o calendário escolar, diante das perspectivas do ensino remoto ou híbrido, fez do Piauí o segundo ou terceiro estado brasileiro a regulamentar a matéria. Nossa preocupação em regulamentar, em não deixar crianças e jovens desamparados nos fez de exemplo para os demais conselhos do país. Não sei se o que fizemos foi o melhor, mas sou consciente de que era o que verdadeiramente estava ao nosso alcance.

Passados dois anos, sei dizer que a pandemia nos deixou de legado muitos aprendizados. Continuo achando que os principais prejudicados foram os estudantes. Até hoje as instituições não retornaram às atividades normais. Nas universidades (pelo menos nas do Piauí), o ensino continua sendo remoto e o prejuízo por enquanto é imensurável. No primeiro ano, no qual minha instituição permaneceu sem funcionar, inclusive sem oferta de ensino remoto, as atividades de ensino e extensão pararam, praticamente. Um ou outro professor seguiu com suas pesquisas. Da minha parte fiz uma troca de atividades: usei meu tempo para publicar as pesquisas que estavam em andamento. Estabeleci muitas parcerias, mas tive o prejuízo de não participar de uma missão internacional que está prevista para este ano, se a pandemia deixar. Foi o ano mais produtivo da minha carreira acadêmica. Nunca publiquei tantos artigos e capítulos de livro. O Ciência Viva nunca foi tão lido: tive posts que passaram de 100 mil acessos! Um período muito louco e que jamais esperaria viver.

Passados dois anos entendo da preocupação de todos com a doença: a pandemia não acabou. Acabou a disposição de algumas pessoas seguirem regras e não acabou a sanha de tirar proveito político da situação: situação e oposição fazem isso sem o menor pudor. Passados dois anos, a educação superior pública do meu Estado ainda não retornou às atividades presenciais. A educação básica também está à deriva. Nunca vou esquecer aquele período em que buscamos regularizar a situação da educação no Estado até que as coisas normalizassem. Aguardávamos por uma vacina ou um medicamento. A vacina veio e provou que tem uma boa eficiência. Depois de idas e vindas de políticos negacionistas, o país tem conseguido, brilhantemente, diga-se de passagem, vacinar uma média de 1,2 milhões de pessoas/dia. Já passamos de 80% de imunizados, o que explica, nesta quarta onda, termos hospitais cheios e, proporcionalmente, poucos óbitos. Importante lembrar: 80% dos internados são pessoas que não completaram o esquema vacinal.

A pandemia não acabou. A COVID-19 está virando uma gripe, parecida com as que conhecíamos até aqui. Não é uma “gripezinha”. Matou muita gente. De todas as idades. Quebrou muita gente. De todos os setores. Expôs o pior lado de muita gente. Em todas as famílias. Ensinou muitas lições, mas muitos ainda não conseguiram assimilar muita coisa. Triste isso...

Desculpem pelo texto grande. Estou fazendo apenas um registro de como vi o problema. Perdi algumas pessoas queridas, de quem não pude me despedir. Ninguém do meu ciclo familiar estrito. Estamos sobrevivendo. Há dois meses tive COVID-19. Foi como uma “gripezona”. Já tive até piores. Tive medo. Passou um filme na minha cabeça. Fiquei com algumas sequelas, mas sobrevivi.

Vamos em frente!

Uma boa semana para todos e todas.

 

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