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A ruptura da educação

Esta semana que passou participei de uma banca de Doutorado da Rede Bionorte (Rede de Biodiversidade e Biotecnologia da Amazônia Legal) que abrange uma gama de instituições da região Norte do Brasil e mais instituições do Maranhão, estado que faz parte da Amazônia Legal. A banca foi da bióloga Ingrid Fabiana Fonseca Amorim, formada pela Universidade Federal do Maranhão, que defendeu a tese intitulada “Diversidade e Potencial de Uso das Plantas do Quilombo de Pericumã, Baixada Maranhense, Amazônia Oriental, Brasil”, orientada pelo dileto amigo, Prof. Dr. Eduardo Bezerra de Almeida Jr. (UFMA) e coorientada pelo Prof. Dr. Reinaldo Farias Paiva de Lucena (UFMS), meu colega durante o Doutorado e de PRODEMA.

No estudo, Ingrid fez um censo com moradores do Quilombo de Pericumã, situado na cidade de Bequimão, na chamada Baixada Maranhense. De casa em casa, guiada pelos moradores, ela resgatou a informação tradicional, que se transmite de forma oral, sobre as plantas e seus usos, seja para fins medicinais, alimentícios ou para outras finalidades. Este resgate é o que fortalece o chamado Etnoconhecimento (que inclusive já falei disso por aqui), que reúne a sabedoria dos povos tradicionais, e no caso específico, dos povos de origem africana, trazidos para o Brasil como força de trabalho escravo e que, nas oportunidades que tinham, construíam povoamentos em áreas distantes, constituindo os agora seus descendentes, quilombolas.

A pesquisa foi desenvolvida em plena pandemia, quando as restrições eram muito grandes, especialmente pela exigência da calamidade sanitária de que as pessoas se mantivessem isoladas. No pouco tempo que teve antes da pandemia começar, Ingrid perscrutou a comunidade em busca das informações e depois das plantas citadas nas entrevistas dos moradores da comunidade quilombola. Na minha leitura, verifiquei que havia algo a mais na pesquisa. Nas entrelinhas reconheci a legítima busca de mostrar para o mundo científico a riqueza daquela comunidade que se enraizava em cada parte do texto que li. Depois das perguntas corriqueiras que faço, pontuei sobre a identificação da pesquisadora com a comunidade de estudo. E daí percebi o maior de todos os valores que a pesquisa trazia.

Ingrid passeou sobre as dificuldades que enfrentou para chegar até ali. Desde o passado mais distante, até às vésperas de concluir uma pesquisa no meio de uma pandemia. Uma mulher, negra, de origem humilde, descendente direta de escravizados, estava alcançando o ponto mais alto de uma carreira acadêmica. E mais: em um programa de Doutorado que recebeu Conceito 5 pela CAPES e entrando pela porta da frente, do concurso, da seleção rigorosa até a avaliação por pares. Ingrid fez jus a outras mulheres de fibra como sua conterrânea Maria Firmina dos Reis, professora e escritora maranhense.

Destas suas palavras fortes fez desabar todos os que me sucederam, com base na energia emanada. Foi arguida por todos, mas respondeu com a tranquilidade de uma autoridade que se forjou na força e na resiliência. Ao final: aprovada! Com todos os méritos acadêmicos. Provando que as dificuldades existem, exatamente para serem superadas. Mostrando que “a educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo” como um dia disse o líder Nelson Mandela.

Fiquei muito feliz em participar deste momento. Parabenizei a Ingrid pela conquista e pela representatividade do momento. Parabenizei os colegas Eduardo Almeida Jr. e Reinaldo Lucena pela orientação profícua. Além de mim compuseram a banca a Dra. Patrícia Albuquerque (UFMA), Dra. Maria Carolina Abreu (UFPI) e o Dr. Rafael Rodolfo de Melo (UFERSA).

Este exemplo mostra o quanto a educação pode romper barreiras, mudar destinos e realidades. Por mais Ingrids e Firminas!

Boa semana para todos e todas!

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