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Indústria da seca ajuda a manter políticos no poder, diz Fonseca Neto

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Os professores Fonseca Neto e Antonio Carlos de Andrade, da Universidade Federal do Piauí, debateram durante o Jornal do Piauí os aspectos históricos e políticos que impedem o Piauí de conviver com o fenômeno da seca. 

Fonseca Neto resgatou, primeiramente, o episódio em que Dom Pedro II afirmou que venderia as joias da coroa para resolver o problema. O fato ocorreu em decorrência da grande seca ocorrida no Nordeste em 1877. O resgate foi feito para demonstrar que o problema é falta de vontade política para dar uma solução de convivência com um fenômeno natural e previsível.

"Vou dizer uma obviedade, mas, às vezes, as obviedades nos ofuscam. Nunca se quis resolver esse problema porque a seca é um fenômeno natural, previsível, cíclica. Os índios que antecederam a nós se mudavam de um lugar para outro no tempo que apertava. Não se resolve porque não quer", comentou.


Ainda segundo o historiador, dessa época para cá foi desenvolvida a indústria da seca, que serve às eleições dos políticos e mantém o povo num patamar de subserviência a essa indústria. Ele citou o exemplo da exploração dos carros-pipa, que servem as comunidades mais distantes nas épocas mais quentes.

A indústria funciona com a requisição de verbas do governo federal. A verba, em valores diminutos, chegam aos municípios somente para a satisfação dos aspectos mais emergenciais causados pela seca, como a falta de água para o consumo humano.

"Não se resolve porque não quer. Vem tudo para ajudar e acaba não ajudando como deveria porque as decisões não alcançam do ponto de vista estrutural. O professor Felipe Mendes tematiza três ou quatro fases de extrativismo no Piauí: o do gado, da cera de carnaúba e o extrativismo do dinheiro público, que vem de fora e é extraído nos encaminhamentos da província. Esse dinheiro só enrica os cofres de alguns, no máximo as políticas de emergência, e cria a famosa indústria da seca. Se isso é um nutriente essencial para conservar a estrutura política do Piauí, porque se vai querer acabar assim? Há um nó. Como isso não é problema de um prefeito, um flagelo desse? Vai se dizer que é problema do governo federal e aí manda-se mais dinheiro", explicou.

Para o professor Antonio Carlos, a questão deveria girar na busca de mecanismos de convivência com a seca. Ele afirma que há mecanismos de prever, matematicamente, em quais anos a seca castigará mais ou quando o inverno será melhor e já tentou, na época do governo Mão Santa, alertá-lo sobre isso.

Porém, não foi levado a sério. "Não se combate a seca. Só tem que arrumar mecanismos de convivência. Fiz estágio na Embrapa de Petrolina, maior centro de estudos de mecanismo de convivência com a seca. Divulguei aqui que toda casa tinha que ter uma cisterna porque por menos que chova, chove. Deixei de trabalhar com a seca porque ninguém se interessa. Disse ao governador Mão Santa que no ano seguinte iria ter seca e ele ironizou perguntando se eu tinha ligação com São Pedro", afirmou o professor.

Fonseca Neto questionou o modelo de República que o Brasil vive e lamenta o sofrimento por que passam a maioria dos nordestinos. "Será que há uma República se existem irmãos vivendo um flagelo desse?", finalizou.

Leilane Nunes

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