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Médico Benjamim Vale escreve cartas para Teresina; veja

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O médico Benjamim Pessoa Vale escreveu uma série de cartas para Teresina, resgatando emoções, falando de seus encantos e histórias pessoais pelos bairros.

Confira na íntegra as cartas:

Carta 1

Os primeiros raios de sol iluminam a Chapada do Corisco, muitos dos filhos, já de pé, em pontos específicos agitações, que lhe são peculiares, o Mafuá com suas iguarias, muitos encontros e saudades da Tijubina. A paixão dissemina-se pelos olhares, petiscos e cafés robustos, com jeitos pitorescos que só a Piçarra é capaz de possuir. Muitos fazem como rotina, outros encontros casuais e alguns na tentativa de somar votos para o pleitos vindouros. O central funciona como o equilíbrio de uma teia, com muitas possibilidades de suprir as necessidades sociais de utensílios, vestes, alimentos, em fim aqui tem de tudo! Não! Falta o pão de seu Cornélio e o suco de seu Abrão. A cidade expande-se e as pessoas sabem a onde ir, Matadouro, Parque Piauí, Vermelha e Dirceu. Oh Teresina! Teus mercados interagem com teu povo, teus corredores, com cheiros inconfundíveis, sabores diversos e movimentos frenéticos, repetidos em compasso dia a dia, são espaços públicos que para muitos alimentam o corpo e a alma, e fazem crescer economicamente e socialmente a grande Teresina. Teus bairros têm vida própria. Sociologicamente uma cidade tem vida quanto tem vida seus mercados. 

Carta 2

Navegando em tuas artérias, terrestres e aquáticas, fiz reviver em mim tuas noites, olhei no vácuo onde antes via-se a ponte, a panorâmica, beira rio e outras. Do colosso do Monte Castelo tento ver-te, já não consigo como antes visualizar os limites antes visíveis. Teu verde sucumbe-se, entre as estruturas de concreto, concretizando ares de cidade em evolução vertical. Sinto brotar no peito um sentimento de saudade, de uma Teresina que imaginava ser simples e ser minha. Olho no retrovisor, as pessoas com pressa, já não tens a calma de outrora. Teu povo pacato, esconde-se da violência, das drogas, uns dos outros e muitos de si mesmo. Preocupo-me com teu capital social, tua mobilidade, com poder de construir, preservar e transformar-te. És formadora de talentos, estes ampliam tuas fronteiras. És aldeia, és ecumênica, as proezas dos teus filhos te fazes grandiosa. Miro-a dos teus altos, jurubeba, pitombeira e outros. Percebo a direção do teu olhar em variadas sentidos, já  não somente o velho monge, também o Poti, o encontro dos dois, proporciona múltiplos encontros. Expandiu-se, como gramíneas em terra fértil. Tu és berço de homens de visão e fizeste pela tua educação com os que aqui aportaram abrissem os olhos para ver o mundo. Avançar  com conhecimentos e por estes solicitar do poder público os projetos para ver-te novamente: terra de oportunidades! 

Colocar na mesma equação quantidade e qualidade, assim veremos o empreendedorismo social, setor publico e privado em equilíbrio, vendo nascer um novo momento. Tuas artérias fluindo, como fluem nossos sentimentos, tuas águas límpidas como alma do teu povo. Momento que nos sentimos construtores e em construção. Seremos vetores de tua alavancagem, vivendo teu presente sem destruir tuas memórias e visualizando teu futuro. Teus filhos encontram-se em tuas variáveis estações , educação, saúde, culinária, cultura e poesia. Somos você! 

Teresina confunde-se com nossos desejos e realizações, aqui os rios encontram-se e eu encontrei as forças convergentes para florescer, como as árvores que te fizeram "Cidade Verde" um dia. Sonho em ver-te novamente, verde exuberante, com rios caudalosos e pacata. Cumprindo o principio da equidade, sem desvirtuamento bilateral. És cidade para as pessoas e nós pessoas para uma Teresina com memórias, presente com povo feliz e futuro, uma megalópole  inabalável.

Carta 3

A Da Costa e Silva pede socorro, melhor seria ser triturada pela moenda que sofrer o infortúnio do abandono. Semelhantes agruras estão a passar, os que hora antes inspiravam os poetas e românticos. O rio passa em silêncio como se não sofresse dos mesmos males. Seus lagos, motivo de vidas e olhares, hoje escuros, testemunhando o obscuro. A taberna , meu olhar já não alcança. Os cachimbos fumegam , divididos por muitos. Aquele ar de romantismo, substituído pelo medo, prostituição, violência , pessoas com dignidade exposta , como são as chagas sociais. A praça relembra seus tempos de glórias, tempos poético aos que ali aportavam em segurança , a contemplar a lamina d'agua  e sua capilaridade ao encantar-se com os versos de nosso poeta maior, saudades!

Tudo poderia ser diferente , se não fosse a inércia, a falta de censo de valorização dos espaços públicos e das pessoas que ali hoje só figuram para o cenário de degradação. A que ponto chegamos ? Sigo em meus devaneios e sonhos. Sou menino! Vejo monumento a nosso fundador, bandeira sem tremular ,aflora em teu seio o conjunto de mazelas, teus violeiros em fuga, a insegurança reina. Onde estão teus protetores? A cidade olha o velho monge,com seu olhar de menina , sente-se desflorada , pela violência, pelas atitudes nada ortodoxas de muitos dos seus habitantes. Ergue-se a plataforma, as carnaúbas da Maranhão são lembranças. O metrô  chega e com ele muitos procurando encontrar-se. O troca-troca, assiste uma troca desumana, árvores por concreto. Poucos percebem as mudanças. Visão míope? Ou deliberadamente o progresso é desarmônico com o equilíbrio?

Rio Branco assusta-se! Lixo, delitos... Os idosos tentam fugir é tarde! Olham em completo descrédito, perguntam o que acontece? Não entendo mais nada! Menores fogem, uma carteira a menos! Bolsos vazios, lembram com saudades a plenitude da alma em encontros passados. O tempo aquece do cume do pitombeira. O Liceu a contemplar a Landri Sales. Cenas do cotidiano repetem-se, infelizmente, comuns a tantos santuários.

Das Dores sofre por Saraiva. São Francisco de Sales faz crescer muitos homens e vê minguar o sentimento de preservação. Saraiva, oh Saraiva! Tua feirinha dominical. Ê saudade! A massa olha, não consegue ver-te, quantos por ti passaram? Impossível a mim lembrar teu apogeu e acreditar na decrepitude que te encontras! Vaguei por segundo, és Pedro! Resiste ao tempo e ao homem. O teatro cala-se , final de qual ato? Espero que seja o ultimo. Olhas em silêncio, por um momento pareces soberana, a noite a referenciar te. Lembras de momentos que a sociedade assim fazia. És segundo pelo trono, primeira pela altivez e pelas as recordações renascidas em cada um, fazendo florescer no espírito o mais nobre sentimento do homem: a gratidão. A cidade e muitos dos seus logradouros clamam: “Liberdade, liberdade abre as asas sobre nós!”. Homens públicos, ocultos, pouco sensível ao desenlace, homem - meio. Acordem! Somos Teresina.

Carta 4

Olhem para as águas, as que passam e as que deságuam. Teus rios, tuas lagoas agonizam, em nome da modernidade. Modernidade? Esta que faz sucumbir teus mananciais, sem planejamento! Onde estão as lagoas do Poti? Para onde drenam as águas que ai aportavam? Quantas árvores foram plantadas em nome das que ali naturalmente habitavam? A pujança de qualquer centro urbano, no tangente a satisfazer os desejos individuais e coletivos, tem por base o consumo. A negritude onde eras águas! Shoppings, centro comerciais, pessoas trafegam sem imaginar o quanto o desenvolvimento fez distante da simplicidade imposta pela natureza. É possível avançar sempre perder a simplicidade? Poderia ser diferente? Com traços de crueldade vejo esgotos in natura  juntar-se ao liquido vital, antes límpido, levando a impropriedade, ceifando vidas e tornando visível o verde indesejável dos aguapés. Incrédulos os homens passam, o rio morre, faltam-nos ações. Enquanto isso nas casas legislativas, o horizonte dos votos é o principal. A manutenção do poder é a meta, águas rolam até quando? Apressem-se! Abram os olhos,cuidem! Sem água os centros urbanos são inviáveis, mortes são iminentes, ainda há tempo! A vida segue até quando? Águas responderão por nós e contemplamos as com a simplicidade de criança. Água componente do corpo, fonte de vida, espelho do céu.
Deixem as rolar...

Carta 5

Julho, último dia do mês de minhas primaveras. Inicia-se o das tuas, céu e clima que só nós entendemos. Ensolarado  com brisa, esta balança  as árvores , ainda restam! Penso quantos parques como estes seriam necessários para melhorar a qualidade da cidade e das pessoas. A sombra  de  uma mangueira na Potycabana, o olhar transpõem o rio. Miro  a Ilhotas e esta ao rio. O verde das matas ciliares contrasta-se com o cinza do concreto. O leito  do rio é invadido por outro verde, este maléfico, desastroso, anunciando a catástrofe. Da minha protetora procuro Benjamim Filho, que pedala em muitas direções, sem se preocupar com o equilíbrio, a mangueira é balançada pelo vento em harmonia, como uma dança de balé. Ela protegendo-me , eu sonhando protegê-los: árvores, filho e rio. O clima  aquece, olho o rio. Garças procuram alimentos, estes são escassos. Canoas solitárias testemunham, em silêncio cada passo meu e do rio.Os veículos que trafegam sob a negritude e a ponte a vista. Os passantes, não visualizam o belo e muito menos a destruição. Tento reconhecer as árvores, já não me é possível. Relembro a infância, quando do descanso a sombra das mesmas após fadiga da árdua tarefa. Oos raios solares refletidos nos prédios , anunciam a hora de retirada . Olha novamente o rio, a mangueira... Agradeço a sombra ,gravo no seu tronco minhas digitais como estão gravadas em minhas retinas a Teresina  que sonho. As canoas balançam com as águas, e serão sempre as oculares deste momento em que o homem contempla e é contemplado. Qualquer dia  de julho espero revê-los.

Carta 6

Hoje já não podes competir com os ipês floridos, muito menos com as magnólias. Quantos amores foram jurados tendo a como testemunha? Quantas vezes? Do crepúsculo ao amanhecer a lua a iluminar te, os seresteiros com suas melodias, encantaram se com tua beleza e viram em tuas águas solenemente a alegria que transbordava, de seus elevados espíritos. Teu silêncio a fez imortal aos que por ti passaram. Oh Lagoa da Fazendinha! Os sons de violões e canto dos poetas, silenciaram ou migraram a outras plagas. Hoje encontra se tentando fugir de si mesma, os aguapés a encobrem em totalidade. Já não tens a lua refletida, a tua exuberante beleza registrada no córtex visual de teus amantes. Torna-se invisível aos olhos dos muitos que passam por estas cercanias, tens em companhia o rio, a ponte, a negritude da cajuína, testemunhando  o sofrimento a te imputado. A sede do PMDB já com saudade. Os que o compõem esvaziaram o coração ou a visão foi acometida por um fenômeno  que a torna obtusa. Lembro de aforismo "o mundo não muda, mudam-se os olhos com que nós o vemos", com uma visão surrealista tento alcançar tua magia. Sinto me filho das águas e amante da noite, as margens que hora triste, transbordando em alegria. As luzes incidentes  são refletidas em forma de arco-íris. Voltas aos teus encantos e encanta- me, com um dia encantaste  a muitos. Neste momento introspectivo, em silêncio a testemunhar as dores  que deves sentir, peço licença a William Blake para plagia-lo “:a lagoa que um tolo vê, não é a mesma lagoa que um sábio vê”. Bernardo Soares sabiamente afirmou: “nós só  vemos o que somos”. Somos tolos ou sábios? O essencial é que fossemos todos "Lagoa da Fazendinha".

 

Benjamim Pessoa

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