RIO — Anunciado neste sábado como ministro da Cultura, após protestos contra o fim da pasta terem se espalhado pelo país, o carioca Marcelo Calero, 33 anos, prometeu que vai promover um amplo diálogo com artistas e produtores, independentemente de seu “colorido político”. Diplomata de carreira, ex-secretário de Cultura da prefeitura do Rio (onde será substituído pelo produtor cultural Júnior Perim), Calero passou o sábado cuidando da transição na cidade e estudando nomes para seu ministério. Por enquanto, ele só anunciou Helena Severo para a Fundação Biblioteca Nacional. Em entrevista ao GLOBO, o novo ministro defendeu a cultura como eixo de desenvolvimento nacional e condenou as críticas que têm sido feitas a artistas que usam subsídios do governo; “A a criminalização (do artista) tem que ser combatida.”
Desde o anúncio do fim do ministério, há uma pressão muito grande de artistas e produtores contra a decisão, culminando com ocupações em várias partes do país. Houve recuo do governo?
Ajustes são necessários, já que não houve transição de governo. O que ocorreu agora foi um ajuste, uma resposta a uma demanda da população, um setor que tem uma enorme relação com a identidade nacional.
Qual é o próximo passo?
Vamos dialogar com a classe artística, como fizemos no Rio, e tentar fazer com que os fazedores de cultura se sintam representados no ministério. É importante que a cultura seja tratada como eixo de desenvolvimento nacional. Do ponto de vista econômico e social. A cultura é geradora de emprego e renda e é base da nossa identidade nacional. É o que faz com que a gente se distinga como brasileiro. Agora tenho que arregaçar as mangas e trabalhar
Como ficam os programas implantados na gestão anterior?
Nossa filosofia é preservar as conquistas adquiridas e trabalhar para aprofundá-las.
Isso também vale para a Lei Rouanet, cuja revisão se tornou um dos temas que mais mobilizaram o setor nos últimos anos?
Esse assunto será visto com muito cuidado. Não pode ser tratado com pressa.
De que maneira o senhor pretende aproveitar experiências adquiridas na secretaria municipal de Cultura do Rio?
No Rio, a gente conseguiu muita coisa pela gestão, tornando-a mais eficiente, ouvindo fazedores de cultura, valorizando servidores, economizando onde foi possível, para haver mais dinheiro. Acho que podemos inclusive usar nossa experiência com programas como Ações Locais e Territórios de Cultura (que premiam projetos culturais de impacto local) para aprofundar o programa Cultura Viva (voltado para descentralizar a produção cultural, que implantou pontos de cultura em diferentes partes do país).
O que pretende usar da diplomacia?
A capacidade de diálogo e conciliação. Achar denominadores comuns em posições opostas. Espero honrar os outros diplomatas que passaram pela pasta antes de mim, especialmente o (Sérgio Paulo) Rouanet, que foi secretário nacional de Cultura.
Artistas e produtores queixam-se de que passaram a ser vistos como vagabundos sustentados pelo Estado. Diferentemente de muitos setores da economia que vivem de subsídios. Como responde a isso?
Acho muito ruim criminalizar os fazedores de cultura, ainda mais tendo em vista que a diversidade cultural é a base identitária da nossa nação. Hoje, até a própria prestação de contas de projetos culturais é muitas vezes vista sob um pressuposto de que esteja incorreta. E há tanta gente atuando em condições precárias, batalhando para manter suas produções. Seriedade é fundamental. Mas a criminalização tem que ser combatida. Olhe a nossa história. Olhe o arcabouço cultural que a gente foi capaz de criar: Machado de Assis, Chiquinha Gonzaga, Guimarães Rosa, Carmen Miranda. É difícil encontrar uma nação no mundo com diversidade tão rica. É preciso respeitar e alimentar essa diversidade.
Apesar da recriação do ministério, as críticas ao governo continuam. Como o senhor pretende lidar com isso?
Fazendo uma gestão absolutamente republicana, sem doutrinação, não partidarizada, para que o fazedor de cultura seja protagonista, independentemente do colorido politico
Independentemente de estar ou não com o governo?
Isso seria direcionamento. Numa democracia, nos baseamos pelo principio de igualdade.
E o orçamento da pasta, que caiu nos últimos anos e vive sofrendo com sucessivos contingenciamentos?
O orçamento será revisto para 2017. Mas, antes, a grande emergência é equacionar as despesas não pagas. Vou procurar o (ministro da Fazenda) Henrique Meirelles para detalhar a operação de pagamento de tudo o que se deve. Há editais desde 2014 que ainda não foram pagos. Os pagamentos devem ocorrer num prazo de 120 dias, em quatro momentos diferentes.
E como ficam os prédios ocupados?
O pleito da volta do ministério tinha sua legitimidade. Agora precisamos que os equipamentos culturais voltem à normalidade, até porque oferecem serviços ao público.
Fonte: O Globo