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Relator admite mudar projeto eleitoral e põe em xeque regras para 2020

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Foto: Fábio Pozzebom/Agência Brasil

A pressão contra a proposta que restringe mecanismos de transparência e controle de gastos de partidos políticos fez o relator do texto no Senado, Weverton Rocha (PDT-MA), admitir alterações e colocar em risco a vigência das novas regras para as eleições de 2020. O texto aprovado neste mês pela Câmara dos Deputados altera normas eleitorais e partidárias, amplia as brechas para caixa dois, reduz a possibilidade de punição por irregularidades e eleva as chances de uso de dinheiro público pelas legendas.

Ele depende agora de aprovação do Senado, onde, se houver alterações, pode obrigar a Câmara a se debruçar novamente sobre o tema.
Se isso ocorrer, as novas regras correm o risco de não serem aprovadas a tempo de valer já para as próximas eleições. Pela lei, as novas normas precisam ser aprovadas até um ano antes do pleito, no início de outubro.

"Todo relatório está sujeito a alteração. A princípio vejo mais desinformação [por parte de quem critica o texto]. Muitas coisas vão ser melhor esclarecidas. Será conversado com o conjunto da Casa. Ainda vou conversar com os líderes. Sinceramente, não tenho opinião formada em relação ao texto", disse Weverton à reportagem.

O projeto aparece como o primeiro item da pauta do plenário nesta terça-feira (17). No entanto, só há sessão da CCJ prevista para quarta (18). Os próximos passos devem ser discutidos na reunião de líderes partidário.

O relator chegou a protocolar na manhã de segunda-feira (16) um parecer que acolhe integralmente o texto aprovado pela Câmara há duas semanas e rejeita todas as emendas. Ele afirmou, no entanto, que apresentou o relatório para garantir espaço na pauta de votações, mas que analisará emendas apresentadas durante a leitura do projeto.

"A contratação de advogados de político com dinheiro público é imoral, ilegal e inconstitucional. É um tapa na cara da população brasileira que não tem dinheiro público nos serviços mais básicos. É uma afronta", protestou a presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), senadora Simone Tebet (MDB-MS), referindo-se a um dos trechos mais polêmicos do projeto.

O texto permite o uso praticamente livre das verbas públicas para pagamento de escritórios de contabilidade e advogados para filiados, incluindo aqueles que respondam acusações de corrupção. Hoje a Justiça tem barrado esse tipo de gasto.

Pelo projeto, o uso fica autorizado e seus valores não serão contabilizados para efeito dos limites de gastos pelos candidatos e de doações feitas pelas pessoas físicas. De acordo com especialistas, isso amplia a possibilidade de caixa dois por meio da declaração de serviços fictícios de advocacia ou contabilidade.

O grupo pluripartidário "Muda Senado" tem uma reunião na manhã desta terça-feira (17) para tomar uma posição –senadores da equipe dizem que a maioria deles é contra a proposta.

Na Câmara, o texto-base do projeto foi aprovado por 263 votos contra 144. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), tentou votar o projeto na semana passada, sem passar por nenhuma comissão.

Houve reação de partidos do governo e da oposição. Rede, Cidadania, Podemos e PSL obstruíram a votação e Alcolumbre recuou. Foi feito um acordo de que a proposta seria apreciada nesta semana, primeiro na CCJ e, horas depois, em plenário.

Weverton disse que pretende acatar ao menos duas emendas –em tese, se houver só ajustes de redação ou de supressão não há obrigatoriedade de o Senado devolver o projeto à Câmara. 

Para valer na eleição do ano que vem, o projeto precisa ser sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) até 4 de outubro. A proposta que sob discussão no Senado ameniza a punição às siglas que tenham a sua prestação de contas rejeitada pela Justiça. Pelo texto aprovado, só será aplicada multa e cobrado o ressarcimento aos cofres públicos caso seja provada conduta dolosa do partido – ou seja, se a legenda agiu com pleno conhecimento de que estava cometendo uma infração.

O projeto não estabelece valor para o fundo eleitoral, que será definido na discussão do Orçamento-2020. A expectativa de boa parte dos partidos é a de que o valor de R$ 1,7 bilhão distribuído em 2018 seja reajustado acima da inflação para o pleito do ano que vem, mas essa definição só deve ocorrer no final do ano.

Os congressistas já tentaram, por outros meios, elevar essa cifra a até R$ 3,7 bilhões, mas houve recuo após desgaste público. Uma das emendas que devem ser acatadas pelo relator no Senado suprime trecho que abre brecha para a contratação de advogados para defesa de candidatos filiados que respondem a ações penais e de improbidade administrativa.

A autora da emenda, a senadora Juíza Selma (PSL-MT), diz que sua emenda tem o propósito de evitar que "gestores de má-fé façam uso de recursos partidários para pagar, por exemplo, honorários de advogados criminais".

O afrouxamento da punição por desaprovação das contas beneficiará os partidos que são hoje processados por problemas antigos. O texto estende a esses casos a determinação de que precisa ser provado ato doloso –não meramente erro formal– da sigla.

A proposta ressuscita ainda a veiculação de propaganda dos partidos no rádio e na TV –obrigação que havia sido extinta pela última minirreforma eleitoral justamente em razão da criação do fundo eleitoral. Outra das mudanças trazidas pelo projeto é a que permite que seja criado instituto com CNPJ específico para gerir a cota de 5% do fundo partidário destinado à promoção da participação feminina na política.

O discurso oficial é permitir às mulheres gerir esse instituto e, consequentemente, as verbas. Nos bastidores, a intenção é evitar que dirigentes partidários, que continuarão com poder de definir o destino do dinheiro, sejam punidos por eventuais desvios.

Como a Folha de S.Paulo revelou no início deste ano, o PSL patrocinou em Minas e Pernambuco candidaturas de laranjas nas últimas eleições com uso de verbas da cota feminina.

Fonte: Daniel Carvalho e Ranier Bragon, do Folhapress

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