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Relator vota para tornar Bolsonaro inelegível e cita epopeia de ataques

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Foto: Isác Nóbrega/PR

O corregedor-geral do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Benedito Gonçalves, votou nesta terça-feira (27) para tornar Jair Bolsonaro (PL) inelegível até 2030, afirmou que não é possível fechar os olhos para discursos antidemocráticos com mentiras e discursos violentos, criticou a banalização do golpismo e destacou a epopeia de ataques do ex-presidente com uso da imagem das Forças Armadas.

Benedito disse que Bolsonaro "violou ostensivamente" dos deveres de presidente da República previstos na Constituição em reunião com embaixadores no ano passado, em especial a de "zelar pelo exercício livre dos Poderes instituídos e dos direitos políticos e pela segurança interna".

Segundo ele, o ex-presidente "assumiu injustificada antagonização direta com o TSE, buscando vitimizar-se e desacreditar a competência do corpo técnico e a lisura dos seus ministros para levar a atuação do TSE ao absoluto descrédito internacional".

Para o ministro, Bolsonaro é "integral e pessoalmente responsável pela concepção intelectual" do evento que foi objeto da ação.
Ele também voltou a defender a inclusão, na ação contra Bolsonaro, da minuta apreendida em janeiro deste ano na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres e afirmou que ela era "golpista em sua essência".

Benedito é o relator da ação que pode tornar Bolsonaro inelegível por oito anos. Ele começou a detalhar os argumentos para seu voto na noite desta terça, no segundo dia de julgamento do TSE.

"Em razão da grande relevância e da performance discursiva para o discurso eleitoral e para a vida política, não é possível fechar os olhos para os efeitos antidemocráticos de discursos violentos e de mentiras que coloquem em xeque a credibilidade da Justiça Eleitoral", disse.

"A divulgação de notícias falsas é, em tese, capaz de vulnerar bens jurídicos eleitorais de caráter difuso, desde que sejam efetivamente graves, e assim se amoldem ao conceito de abuso", completou Benedito.

"Conspiracionismo, vitimização foram fortemente explorados no discurso de 18 do julho de 2022 para incutir a ideia de que eleições de 2022 corriam um grande risco de serem fraudadas e que o então presidente da República em simbiose com Forças Armadas estaria levando adiante cruzada em nome da transparência e da democracia", afirmou Benedito.

"A reunião não é uma fotografia na parede, mas um fato inserido em um contexto", disse.

Depois de Benedito finalizar, será a vez dos outros seis integrantes da corte eleitoral votarem. A expectativa é que a conclusão do julgamento seja na próxima sessão, marcada para as 9h de quinta-feira (29).

A inclusão no processo da minuta apreendida pela PF que tratava da decretação de um estado de defesa após a eleição de Lula é questionada pelos advogados de Bolsonaro.

Benedito disse que inserir o documento não contraria a tese firmada no julgamento que absolveu a chapa Dilma Rousseff/Michel Temer, em 2017.

"A admissibilidade do decreto de estado de defesa não confronta, não revoga e não contraria a nossa jurisprudência", afirmou, repetindo entendimento manifestado anteriormente.

A ação protocolada pelo PDT mira Bolsonaro e Walter Braga Netto, ex-ministro que foi candidato a vice na chapa derrotada do PL à Presidência em 2022. O ex-presidente é acusado de ter cometido abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação durante reunião com embaixadores realizada em julho do ano passado.

O ministro mencionou a live que Bolsonaro fez em 2021 na qual ele já questionava a segurança das urnas eletrônicas, e disse que na reunião com os embaixadores em 2022 ele passou a mencionar as Forças Armadas como a instituição que podia "apontar supostas soluções para evitar fraudes no pleito iminente".

"Na reunião com chefes de missão diplomática, o investigado retomou a epopeia dos ataques ao sistema eletrônico de votação sem provas, acresceu mais um capítulo à saga: a derradeira tentativa das Forças Armadas de apresentar supostas soluções para evitar fraudes no pleito iminente."

O relator defendeu o ministro Edson Fachin por ter convocado, quando era presidente do TSE, uma reunião com embaixadores para falar da confiabilidade do sistema de votação.

Ele afirmou que não é possível fazer paralelo deste encontro com a reunião de Bolsonaro com representantes estrangeiros no Palácio da Alvorada.

O ex-presidente já fez essa comparação diversas vezes. Benedito, no entanto, refutou a ideia. "O TSE é instituição constitucional que atua como órgão de cúpula da governança eleitoral e é inerente à sua função difundir informações oficiais sobre sistema eletrônico de votação", disse.

Depois de Benedito, votarão os ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares e, por fim, os membros do STF (Supremo Tribunal Federal) Cármen Lúcia, Kassio Nunes Marques e Alexandre de Moraes.

O cenário é considerado adverso para Bolsonaro, e a tendência é que ele seja declarado inelegível. O advogado do ex-presidente, Tarcísio Vieira de Carvalho, já admite recorrer ao STF em caso de derrota no TSE.

Ao defender a punição para Bolsonaro no primeiro dia de julgamento, na última quinta (22), a representação jurídica do PDT argumentou que houve tentativa de golpe de Estado.

O evento com os embaixadores durou cerca de 50 minutos e foi transmitido pela TV Brasil. Na ocasião, a Secretaria de Comunicação do governo barrou a imprensa, permitindo apenas a participação dos veículos que se comprometessem a transmitir o evento ao vivo.

O vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, considerou a reunião com embaixadores como algo grave, com o objetivo de criar desconfiança sobre as eleições e deslegitimar um eventual resultado negativo nas urnas para Bolsonaro.

"O discurso ganhou difusão nacional por meio de televisionamento em TV federal e nas redes sociais. O discurso, portanto, também se dirigiu ao conjunto da população brasileira e não apenas para o corpo diplomático", afirmou na semana passada.

O procurador disse ainda que o chefe do Executivo tem poder para convocar reunião com embaixadores, mas que esse "poder não é ilimitado".

"O evento, não obstante a sua primeira aparência, foi deformado de forma eleitoreira, traduzindo desvio de finalidade."
Segundo ele, a reunião foi arregimentada para criar desconfiança da comunidade internacional e dos cidadãos brasileiros em um sistema de votação legítimo, por meio de alegações inverídicas.

Gonet, porém, não considerou que Braga Netto deve se tornar inelegível e não viu abuso na atuação do ex-ministro em relação ao evento.

A ação contra Bolsonaro é uma Aije (ação de investigação judicial eleitoral), que pode ser apresentada até a data da diplomação do candidato.

Esse instrumento tem como objetivo apurar condutas que possam afetar a igualdade de disputa na eleição, como abuso de poder econômico, de autoridade ou uso indevido dos meios de comunicação social em benefício de um candidato.

Uma das linhas da defesa de Bolsonaro tem sido sustentar que as falas do evento foram feitas enquanto chefe de Estado e como ato de governo, tendo o objetivo de "dissipar dúvidas sobre a transparência do processo eleitoral".

Além disso, apontam que o público-alvo do evento não eram eleitores, mas pessoas sem cidadania brasileira.

Segundo Tarcísio Vieira, a ação movida pelo PDT é "impostora e eivada de falsidade ideológica" e não está em julgamento o movimento político representado pelo ex-mandatário.

"Não está em julgamento, como quer se fazer crer, o bolsonarismo, não se está a arbitrar uma disputa sangrenta imaginária entre civilização e barbárie", disse.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, Bolsonaro admitiu a possibilidade de ficar inelegível e disse que, mesmo fora da urna, pretende seguir na vida pública. Sinalizou, ainda, que pode passar um tempo fora do Brasil.

 

Fonte: Folhapress/ José Marques e Matheus Teixeira 

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