2008. Um ano simbólico para duas mulheres que tiveram suas vidas indelevelmente marcadas por acidentes de trânsito. Com cicatrizes na pele ou na alma, Adelaide Torres, 22 anos, e Zelina Nogueira, 52, são exemplos de como a imprudência ao volante pode abalar não só os automóveis, mas também o corpo, a mente e até suas próprias famílias. Elas são exemplos de que ações aparentemente banais, como pisar um pouco mais no acelerador ou uma conversa rápida ao telefone celular, podem sim causar tragédias.
A universitária Adelaide Torres, que aceitou conversar com a nossa reportagem sob a condição de ter seu nome verdadeiro resguardado, foi a pivô de um grave acidente em uma das vias mais movimentadas de Teresina ano passado. “Eu estava me dirigindo para o centro da cidade onde ia encontrar alguns amigos. Eu já estava meio atrasada e resolvi ligar para avisar que estava chegando. O acidente, na realidade, foi uma sucessão de erros mesmo. E o primeiro deles foi sem dúvida a pressa. Liguei e, quando já estava desligando, eu não me dei conta que o sinal havia ficado vermelho para mim e passei como se a preferencial fosse minha. O carro que estava na outra direção, veio numa velocidade relativamente alta, aproveitou a troca de sinal e continuou acelerando. Ele bateu na minha porta, eu capotei uma vez e parei com os pneus pra cima”, descreve.
Os momentos seguintes foram uma torrente de sentimentos. “Foi tudo num piscar de olhos, sem o menor exagero. Quando eu me toquei, já tava lá de cabeça pra baixo”. Ela afirma que conseguiu se manter calma, a princípio. Ainda dentro do automóvel, conseguiu ligar para os amigos e para seus pais, dizendo que tinha sofrido um acidente, mas que estava bem. Conforme os minutos passavam, uma multidão se formou ao redor do veículo capotado.
Em 2008, Zelina Nogueira finalmente normalizara sua vida após ser vítima de um acidente que lhe limitou os movimentos da perna direita. Um ano antes, durante o mês de junho, no cruzamento das ruas Anísio de Abreu com Tersandro Paz, centro de Teresina, uma motorista invadiu a via em alta velocidade e acabou colidindo em seu carro. “Eu ia na preferencial e ela na via perpendicular. Lá é uma subida e havia um carro-baú na esquina, tirando a visibilidade. Quando eu estava subindo, o outro carro entrou de uma vez. Ela vinha correndo muito e atingiu o lado do passageiro. Com o impacto, meu carro se desgovernou e bateu de frente no muro”, conta.
Zelina, que é mãe de três filhos e trabalha na assessoria de gabinete do Detran, estava indo para casa de irmã de onde partiria para uma festa junina. A batida não só acabou com sua noite, como também rompeu o ligamento do joelho direito e lhe deixou cicatrizes por todo o rosto. Após meses presa em casa, inúmeras sessões de fisioterapia, uma cirurgia no rosto, vários médicos, a perda total do seu veículo, a funcionária pública se erguia, deixando para trás a cadeira de rodas e as muletas que chegou a usar. Mas para chegar até aqui, teve de superar diversas dificuldades.
Já Zelina teve de mudar completamente seus hábitos. Antes da colisão que lhe deixou quatro meses sem sair de casa, ela trabalhava, fazia compras, pagava contas, cuidava da filha que mora com ela. “Fiquei dependente. Tive de contratar outra pessoa para me ajudar. Fiquei um mês e dez dias em cadeira (de rodas). Foi uma experiência péssima, muito ruim. Isso muda totalmente seu ritmo de vida, mexe muito com o psicológico”, define. A funcionária pública também teve uma série de gastos extras com fisioterapia, consultas e exames que não foram completamente cobertos por seu plano de saúde.
Cautela
A Companhia Independente de Policiamento de Trânsito (CIPTRAN) aplicou em 2008, 104 multas por uso de celular ao volante, o que corresponde a 1,7%. Em todo o Piauí, foram registrados 7.318 acidentes, dos quais 3.522 apresentaram vítimas. Para citar apenas as rodovias federais do estado, a maior parte dos acidentes 44,1% foram causados por falta de atenção. Entretanto, essa estatística pode não revelar um número real de colisões ocasionadas por este tipo de imprudência.
“No mundo moderno nós temos esta cultura da pressa, de que não se pode perder tempo. Por isso, depois de uma batida, nenhum motorista vai admitir depois de uma batida que estava falando ao celular ou que estava em excesso de velocidade e isso acaba provocando um subregistro”, afirma Audea acrescentando que, ao invés de pensarem no respeito ao próximo e a si mesmos, a primeira preocupação dos motoristas é não receber multas.
Sincera