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Selton Melo revela em entrevista que viveu crise na profisão em filme

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O palhaço fazia todo mundo rir, mas não havia quem fizesse o mesmo por ele. Essa é a descrição básica do protagonista do filme "O Palhaço", roteirizado, dirigido e interpretado por Selton Mello, 37 anos. E é também, segundo o artista, um pouco de sua própria história.



“Eu vivi, realmente, uma crise em relação à minha profissão”, conta ele, durante uma entrevista coletiva promovida para apresentar o filme à imprensa, no Polo Conematográfico de Paulínia, município paulista a 118 quilômetros da capital. “O auge disso eu vivi durante a filmagem de Jean Charles (filme de 2009 que ele protagonizou). Estava tudo certo, tudo bem, e eu não estava. Eu não estava feliz.”

 

"O Palhaço" foi um modo que encontrou para elaborar a crise. “Escrevi a história de um palhaço em crise de identidade, achando que não é mais engraçado. Parte de um sentimento sincero que eu mesmo vivi: faço as pessoas rirem, mas quem vai me fazer rir?”


Busca respostas com um filme “solar”, que quer agradar, se comunicar, fazer divertir. Como diretor, ele é ainda um ator, daqueles que vivem para servir prazer de bandeja a seus espectadores. “Falei com (o escritor) Raduan Nassar antes de começar a filmar, ele tinha visto 'Feliz Natal' (o primeiro trabalho de Selton como diretor, de 2008), e disse: ‘Nossa, Selton, seu filme é tão sem esperança’. Isso foi dito pelo escritor de 'Lavoura Arcaica' (livro transformado em filme homônimo em 2001, e também protagonizado pelo onipresente Selton)! E eu estava começando um filme solar, que se passa no Circo Esperança. Cheguei à conclusão de que sou um cineasta bipolar”, graceja.

 

Ao seu lado está Paulo José, um dos maiores atores brasileiros. Na produção que segue em filmagem até 13 de abril, ele interpreta também um palhaço, Puro Sangue, pai do Pangaré de Selton Mello. Puro Sangue e Pangaré, se é que você os entende.

 

Egresso do teatro, onde atuava e fazia de tudo um pouco (ou muito), Paulo comemora com humor sua participação na empreitada: “O ator de cinema não precisa fazer fotografia, cenário, dirigir, nada. Não faz nada e é muito bem tratado. É maravilhoso ser ator de cinema, você não faz nada (risos). É verdade”.



E continua brincando: “Vi ontem 'O Cheiro do Ralo' (outro filme protagonizado por Selton, de 2006). Ele está no limite do não estar fazendo nada, mas é superexpressivo”. Seu diretor lhe abre um sorrisão de palhaço que alguém soube como fazer rir.

 

 


Como diretor, Selton é dono do próprio filme, como os saltimbancos pai e filho do filme são proprietários do Circo Esperança. A produtora Vania Catani diz que "O Palhaço" custará, a princípio, R$ 5 milhões, inclusos incentivos federais e do município de Paulínia, cuja prefeitura (hoje sob controle do DEM) ergueu o Polo Cinematográfico.

 

O secretário municipal de cultura, Emerson Alves, está presente, e dá justificativa-padrão para o interesse de Paulínia pelo cinema: “O ganho que a cidade de Paulínia tem é poder difundir a cultura nacional, e trazer essas figuras maravilhosas para cá”. A seguir, entra em maiores detalhes: “Claro, tem dinheiro envolvido, e essa é uma das razões de Paulínia investir”. O cinema se torna subproduto do polo petroquímico instalado na cidade – como, de resto, tem acontecido com o cinema brasileiro em geral.

 

Paulo José tem um eletrodo implantado no cérebro. “Está enfiado dentro da cabeça, emite frequência elétrica regular para tirar os tremores.” Palhaço experiente, ele faz graça com a condição de portador de mal de Parkinson: “O médico receitou um remédio, perguntei até quando ia tomar. Ele disse ‘pra toda a vida’, com um prazer de dizer (Paulo imita a expressão do médico, e fica de repente parecido com o riso de Selton). Disse que minha doença é degenerativa, progressiva e irreversível. Olhei para a careca dele e falei: “O senhor também, né? Degenerativa, progressiva e irreversível…”. Conquistada, a arquibancada de repórteres gargalha.


Paulo vai em frente e enternece os palhaços da plateia: “Nos dias mais difíceis, eu fico mais recolhido, me escondo, não fico me expondo. A entrevista coletiva me incomoda. Fico fazendo palhaçada para esconder meu mal-estar. É complicado. Mas gosto de estar aqui, de ver os sorrisos de vocês”.

 


Um repórter faz a pergunta crucial a Selton: "O Palhaço" tem o ajudado a contornar a crise? Faz-se breve silêncio. “Então, filmar é bom, né?”, ele responde enfim. “Você fica envolvido com várias coisas, figurino, cenário, circo... Assim pensa menos na ideia da morte”.



 

Entre as influências e teferências para compor seu Pangaré, o palhaço-ator-diretor cita Oscarito, Piolim, Benjamim de Oliveira, Mazzaroppi, Didi Mocó... A máxima é manjada, mas o palhaço é, antes de tudo, um triste. Reformulando a proposição inicial de Pangaré-Selton, o palhaço faz rir porque ele mesmo não sabe ou consegue sorrir. No meio do caminho, vai enchendo o mundo de risos e de sol, enquanto persegue a própria liberdade.


Fonte: Ig

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