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Benedito Rui Barbosa critica novelas que não falam do Brasil

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Há um mês, a coletiva de lançamento de Paraíso, remake do sucesso dos anos 80 de Benedito Ruy Barbosa, foi agitada por declarações ácidas do noveleiro. Ele questionou a decisão da Globo de fazer uma novela sobre a Índia (caso da trama das 8 de Glória Perez), em vez de focalizar o próprio Brasil. Reclamou também de os folhetins trocarem o romantismo pela promiscuidade.
 
 "Quando vou ao interior, as pessoas me dizem que na Globo só tem bicha e sapatão", afirmou. Mais tarde, ainda que o estrago já estivesse feito, negou a intenção de criticar os colegas. "Toda vez que viajo por este Brasilzão, as beatas me importunam com barbaridades", disse ele a VEJA na semana passada.
 
Concorde-se ou não com tais opiniões, um fato é irrefutável: às vésperas de completar 78 anos, e desde 2002 sem escrever em razão de problemas de saúde, Benedito é o representante solitário de um jeito de fazer novela – aquele que celebra as paisagens, o ritmo de vida moroso e a suposta pureza do interior brasileiro. É uma fórmula em risco de extinção. "Hoje, as novelas não vão além do Leblon e de Ipanema, ou da Avenida Paulista. É uma limitação triste", diz o autor.

No ano passado, uma reexibição de Pantanal, que na década de 90 permitiu à extinta Manchete impor uma derrota histórica à Globo, tirou o SBT de Silvio Santos do limbo no ibope. E, desde Cabocla (2004), os remakes de suas tramas são um trunfo da Globo. No ar há duas semanas, a história de amor entre a filha de uma beata e um peão endiabrado tem a missão de resgatar o público tradicional do horário das 6, as mulheres maduras, afugentadas pela moderninha Negócio da China. Mas, com audiências próximas dos 20 pontos (a anterior teve média de 19), Paraíso ainda não disse a que veio.

Não são poucos os noveleiros que escalam parentes ou amigos para suas tramas. Benedito foi mais longe. Casado há 54 anos (com Marilene), ele é um patriarca que transformou sua obra em negócio familiar. As filhas Edmara e Edilene fazem as readaptações. O filho Ruy administra os negócios. E o caçula, Marcelo, cuida das trilhas musicais. Além do belo salário de Benedito, na casa dos 250 000 reais mensais, a Globo remunera as filhas e Marcelo por esses trabalhos.
 
A terceira geração dos Barbosa já dá continuidade à tradição – não sem provocar celeuma no clã. Edilene reivindicava um papel de destaque em Paraíso para Paula, sua filha, cujo currículo não ia além de algumas peças teatrais. Edmara discordava. Quando o debate entre as filhas encrespou, Benedito interveio: "Eu disse a elas: ‘Quem decide sou eu. E chega de briga’ ". Paula ganhou uma personagem quase figurativa. Justifica Benedito: "Não é por ser minha neta que ela faria um papel importante sem ter condições".
 
Ainda que não pegue mais no leme, Benedito continua a ser o árbitro em tudo o que diz respeito à sua obra. Depois da confusão, decidiu que cada filha trabalhará num projeto diferente, para não haver ciumeira. Dias atrás, reclamou com Marcelo da indigência do tema instrumental da abertura da novela (trocado, enfim, na semana passada).
 
Foto: AE

O autour com as dias filhas também colaboradoras em suas obras.

 
Na readaptação de Paraíso, por outro lado, permitiu que Edmara desse um viés, digamos, pragmático à mensagem ecológica da trama. Enquanto a novela original denunciava a destruição da Mata Atlântica, a nova faz apologia das belezas de Mato Grosso. "O estado foi muito atacado por causa do desmatamento da Amazônia. Vamos mostrar seu lado bom", diz Edmara. O governo local está bancando a logística da Globo. Por coincidência, é claro, a novela elogiará seus programas ambientais. E o personagem Eleutério (Reginaldo Faria) é um fazendeiro ecologicamente correto.

Benedito vem anunciando sua aposentadoria desde que teve um colapso nas gravações de Esperança (2002). Na ocasião, sua mãe estava no leito de morte e os médicos o haviam obrigado a parar de fumar (eram quatro maços por dia). "Eu disse para a Globo: ‘Se tiver de escrever a novela até o fim, vou morrer’", conta. A emissora escalou às pressas o colega Walcyr Carrasco. "Ele mudou minha novela completamente. Fiquei com tanta raiva que parei de ver. Fui pescar", diz. Em 2006, Benedito teve um derrame cerebral. Estava sozinho no seu sítio, no interior paulista, quando tropeçou e bateu a cabeça num guarda-roupa. Por três dias, suas tonturas foram tratadas como labirintite. Ele teve de ser submetido a uma operação de emergência e ficou 21 dias em coma.

Benedito se recupera de sequelas nos movimentos e faz questão de mostrar que a memória ainda funciona. Mas se diz "sem vontade" de criar. Mesmo assim, a Globo lhe cobra mais uma novela das 8. Ainda que Benedito não escreva uma linha a mais, o patrimônio do clã não parará de engordar. O contrato com a emissora vai até 2012 e seus 34 folhetins ainda podem render muitos remakes. Mas seu maior sonho – uma readaptação de Pantanal – foi adiado. Benedito, que havia vendido os direitos da novela à Globo com esse fim, entrou na Justiça contra o SBT por exibir a obra sem autorização. "O Silvio nem me ligou para falar: fiz um bom negócio, agora vamos discutir isso. E olha que ele é meu amigo – até onde Silvio Santos pode ser amigo de alguém", diz.

Fonte: Veja

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