Cidadeverde.com

Governador diz não ser "idiota" para defender usina nuclear no Piauí

Imprimir
Após três mandatos como deputado estadual, o médico Wilson Martins (PSB) chegou ao Palácio de Karnak, sede do governo piauiense, em 2007, na condição de vice-governador. Assumiu a chefia do Executivo estadual em abril de 2010, quando seu antecessor, o atual senador Wellington Dias (PT), renunciou ao cargo para disputar uma vaga no Congresso Nacional.

Marcello Casal Jr/ABr

Nas eleições de 2010, Martins foi reeleito governador prometendo dar continuidade aos projetos iniciados durante a gestão de Wellington Dias, priorizando os setores públicos básicos (educação, saúde e segurança) e os investimentos em infraestrutura.

"Agora, quem é que vai, em meio à atual discussão, dizer “eu quero agora uma usina nuclear para o meu estado"? Só se for idiota. E eu não sou idiota. Mas eu continuo cobrando grandes investimentos do governo federal no estado"
Wilson Martins (PSB) - governador do Piauí
Em entrevista à Agência Brasil, Martins afirmou que os números da saúde no estado estão melhorando, principalmente nos atendimentos ambulatoriais. Na área de segurança pública, governador disse que o Ronda Cidadão, programa de policiamento comunitário, vem reduzindo a criminalidade em Teresina.

A preocupação do governador é com a folha de pagamento do servidor público, em torno de R$ 180 milhões, dentro do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas que aumentou cerca de 208% desde 2003.


O senhor pode fazer um balanço de sua gestão desde que assumiu o governo, em abril de 2010?
Os oito meses [de 2010] foram complicados pelo fato de eu ser candidato à releição. Nestas condições, a Lei Eleitoral nos coloca muitas amarras. Ainda assim, dividimos bem as tarefas e avançamos em termos de organização administrativa, priorizando a saúde, educação e a segurança pública. Atualmente estamos trabalhando um programa de gestão pública com metas e resultados a serem cumpridos pelos servidores. Já adotamos métodos nos moldes da experiência pernambucana, mas estamos desenvolvendo um novo modelo que pretendemos colocar em prática a partir do segundo semestre, com a consultoria do Movimento Brasil e a partir de experiências privadas e públicas bem-sucedidas.

O senhor pode citar alguns exemplos do que já foi feito de efetivo nas áreas consideradas prioritárias?
Uma série de ações como a construção de escolas-modelos, de estradas e a reforma, ampliação e modernização de dois importante hospitais da capital. Saltamos de cerca de 3 mil atendimentos ambulatoriais para 5 mil atendimentos mensais. Já o número de procedimentos cirúrgicos mensais dobrou, passando de 300 para 600. Na segurança pública, o programa de policiamento comunitário Ronda Cidadão reduziu a criminalidade na capital, sobretudo os assaltos e pequenos delitos. E implantamos o Programa Guardião Eletrônico, com a instalação de câmeras de vídeo nos principais pontos de Teresina.


Qual é a real situação do estado, tanto em termos financeiros como administrativos?
Fizemos uma reforma administrativa, extinguindo 12 unidades gestoras que foram transferidas à administração direta. Diminuímos despesas e incrementamos a arrecadação própria do estado. Financeiramente, ainda são precisos muitos ajustes. Nossa receita corrente líquida está em torno de R$ 3,5 bilhões, mas ela está muito comprometida em função do pagamento da dívida de curto prazo, que está nos sufocando. Devemos em torno de R$ 2,4 bilhões. Apesar disso, o Piauí está em uma situação privilegiada por sua capacidade de endividamento, que é de duas vezes nossa receita corrente líquida, ou seja, podemos, se preciso, contratar [empréstimos de] quase R$ 5 bilhões.

Esta dívida compromete os investimentos do governo estadual?
Compromete. Ganhamos fôlego graças aos R$ 300 milhões extras que recebemos do Tesouro Nacional, mas a renegociação da dívida é uma prioridade e estamos tentando alongar o prazo para saldá-la. O grande problema é até o final de 2012. Em 2010, ano em que pagamos R$ 400 milhões de dívidas, foram investidos cerca de R$ 700 milhões em grandes projetos no estado. Destes, apenas R$ 185 milhões eram recursos próprios. O resto vinha de contratos firmado com bancos, emendas parlamentares e de investimentos do governo federal. A previsão é que, este ano, paguemos um terço a mais de dívida do que no ano passado, ou seja, R$ 600 milhões.

O senhor considera satisfatório o número de servidores públicos estaduais?
Há aí um grande problema. O Piauí tem cerca de 85 mil servidores públicos. Destes, cerca de 25 mil estão aposentados. Fora isso, há uns 4 mil pensionistas. Nossa folha de pagamento está em torno de R$ 180 milhões. Está dentro do limite da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas é, hoje, a nossa maior preocupação, pois desde 2003 ela aumentou cerca de 208%. Há muitos servidores se aposentando e o estado tem necessidade de contratar novos funcionários. Além disso, a Previdência é outro grande ralo. Todos os anos temos que colocar entre R$ 25 milhões e R$ 30 milhões todos os meses para cobrir o déficit do setor.

Como melhorar a educação pública, ainda mal avaliada em indicadores nacionais?
Já melhoramos muito. Se compararmos a situação no interior dos vários estados da Região Nordeste, somos um dos que mais avançaram. Universalizamos o ensino médio. E o Ministério da Educação já aprovou um projeto de ensino médio profissionalizante a distância com a utilização de recursos tecnológicos como a teleconferência. Serão implantadas 300 salas a partir do segundo semestre deste ano, a um custo de cerca de R$ 12 milhões. A formação profissional será feita de acordo com a vocação de cada região. Vamos também combater o analfabetismo, que vem decrescendo, mas continua alto. O problema é que, ao longo dos anos, o estado foi esquecido [pelo governo federal]. O último grande investimento foi a construção da Barragem de Boa Esperança, há 40 anos. Mesmo assim, o estado tem avançado.

Em pouco mais de dois meses o senhor enfrentou duas paralisações na área da educação. A primeira de servidores do estado. A segunda do pessoal da Universidade Estadual do Piauí (Uespi). Em ambas, a queixa era a falta de condições de trabalho...
Eu já fui sindicalista. Sempre colocamos [a queixa quanto] a falta de condições, mas, no fundo, o que se quer é aumento salarial. Está prevista a realização de um concurso público para contratação de mais servidores, mas quanto à ampliação do número de vagas, isso não é possível. A Uespi se expandiu de forma exagerada entre os anos de 1994 e 2001 e nós, agora, estamos primando pela qualidade. Já a greve da rede estadual teve uma adesão muito grande, mas foi política, desnecessária, e foi pela aprovação do piso nacional para a categoria e não contra o governo estadual. Estávamos apenas aguardando uma resolução do Ministério da Educação quanto ao piso nacional. Eles queriam fortalecer o sindicato e pediram o que já estava certo que seria dado, mas não naquele momento. Tanto que a Justiça considerou a greve ilegal.

Qual o grau de interesse do estado em sediar uma das quatro usinas nucleares planejadas pelo governo federal?
Tínhamos o mesmo interesse que tinham todos os outros estados nordestinos que estavam disputando com todas as suas forças os investimentos que seriam feitos. Agora, com o acidente no Japão, mudou tudo. O mundo inteiro está repensando os investimentos em energia nuclear – até agora considerada mais limpa e segura – e o Piauí não vai deixar de fazer o mesmo. Nós também estamos repensando. Agora, quem é que vai, em meio à atual discussão, dizer “eu quero agora uma usina nuclear para o meu estado"? Só se for idiota. E eu não sou idiota. Mas eu continuo cobrando grandes investimentos do governo federal no estado e queremos esses recursos para construirmos as cinco hidrelétricas que projetamos construir no Rio Parnaíba. E também para investirmos em um parque eólico. O importante é gerarmos energia, emprego e renda e termos investimentos.

A Agência Nacional de Petróleo (ANP) já investiu R$ 50 milhões na prospecção de gás natural no estado e pretende, em breve, furar um poço para confirmar a existência do combustível. Quais sao as suas expectativas?
Primeiramente, a ANP investiu muito pouco no Piauí. Por isso, estamos cobrando a continuidade dos investimentos. Já realizamos vários estudos e há indícios seguros de que há gás natural na Bacia do Rio Parnaíba. Queremos que um poço estratográfico que custa R$ 15 milhões seja perfurado para verificar se há, ou não gás, natural no estado. E queremos também que o Conselho Nacional de Energia inclua o estado, em particular a Bacia do Rio Parnaíba, em lotes que serão leiloados pela ANP. Com isso, a região merecerá investimentos da Petrobras, o que irá gerar empregos e renda.

O senhor teme que o corte de R$ 50 bilhões no Orçamento da União afete projetos sociais ou de infraestrutura no estado?
Não e sim. Ele vai afetar todos os estados, mas o que me preocupa mais é a sistemática do repasse do Fundo de Participação dos Estados. A Região Nordeste, como um todo, depende demais desses repasses. Em fevereiro, o Piauí arrecadou em torno de R$ 202 milhões pelo fundo. Em março, foram apenas R$ 128 milhões, muito menos do que esperávamos. Por isso, eu acho que essa questão deve ser repensada, principalmente porque são recursos que não contribuem muito para estados mais ricos, como São Paulo e Rio de Janeiro, enquanto são fundamentais para os que ainda estão em desenvolvimento. E são justamente estes que deveriam ser privilegiados.

Alex Rodrigues
Repórter da Agência Brasil

Você pode receber direto no seu WhatsApp as principais notícias do CidadeVerde.com
Siga nas redes sociais