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Sentença de Vida: Livro de Marcia Rachid - pioneira na luta contra AIDS

A coluna ‘Senta Aqui, com Marina Vergueiro’ recebeu na noite da última segunda-feira (8), no Instagram da Agência, a médica infectologista Marcia Rachid, pioneira na luta contra aids no Brasil. Ao longo dos quase 40 anos tratando pessoas que vivem com HIV, ela foi colecionando histórias, como num diário, como em um desabafo. Há o paciente que queria ver sua escola de samba favorita, porque pressentia a vitória naquele Carnaval. Ou o que deixou com ela uma chave de casa para que buscasse a roupa de seu funeral – um terno, para surpresa da médica. Rachid, uma das fundadoras do Grupo pela Vidda, não sabia exatamente o que faria com aquele material. Acabou escrevendo um livro, “Sentença de vida”.

 

No bate-papo com Marina, ela falou sobre a relação muito próxima com seus pacientes e o que aprendeu lidando com a morte naquele começo de epidemia nos anos 1980, quando não havia nenhuma medicação para quem ficava doente.

 

No livro, uma das histórias é sobre um sujeito que teve infecção por transfusão, e os moradores fizeram um abaixo-assinado para expulsá-lo do prédio. “É um exemplo clássico do que acontecia naquela época. As pessoas ficavam isoladas. No caso desse rapaz, a mãe estava sempre a seu lado. Mas muitos não tinham nem um familiar. Por isso a gente acabava ficando próxima deles. Aquele isolamento, aquela solidão, mexiam demais comigo e com outras pessoas que trabalhavam comigo”, disse.

 

Transmissão pelo HIV

 

A dra. Marcia Rachid reforçou na live que o HIV não é transmitido por contato físico ou vias respiratórias, igual a Covid-19, e que desde o primeiro momento, na década de 1980 e 1990 quando surgiram os primeiros casos, os estudos e pesquisas já passavam essa informação.

 

“Eu fico bastante impressionada com o rumo que o preconceito relacionado ao HIV tomou, eu e as outras pessoas que trabalhavam no ambulatório do UNIRIO no início da epidemia não tínhamos preconceito ou receio de atender as pessoas, não existia tratamento ou roupa especial, depois de um tempo foi que começou a surgir essa ‘maluquice’ de querer excluir e separar as pessoas só porque estavam com vírus”, lembrou a infectologista.

 

A médica aproveitou o momento para esclarecer ainda que o HIV não é transmitido por objetos, mencionando uma história que aconteceu com ela enquanto profissional trabalhando na linha de frente da luta contra a aids.

 

“Tem uma coisa que queria deixar bem clara, coloquei isso no livro, e queria frisar aqui também, desde o início da epidemia de HIV já se sabia que o vírus não era transmitido por contatos sociais ou por utensílios, como: cadeira, copo, talher… então de onde saiu tanta paranoia das pessoas acharem que se uma pessoa com HIV sentar em uma cadeira e uma pessoa que não vive com HIV sentar na mesma cadeira ela vai se infectar?”, questionou a médica.

 

Ela continua: “Eu fui expulsa de um consultório por causa disso, alugava o horário nesse consultório e o médico responsável me disse que gostaria que eu não trabalhasse mais lá. Ao questionar o motivo, ele me falou que tinha descoberto que meus pacientes viviam com aids e ele não queria que os pacientes dele sentassem na mesma cadeira que os meus, aí eu falei me desculpe, mas depois dessa situação, eu jamais ficaria no seu consultório, muito obrigada pelo tempo que eu trabalhei aqui. Disse a ele que aquele comportamento era ignorante e que ele deveria estudar mais, porque já estava comprovado desde 1983 que o vírus não é transmitido dessa forma”, pontuou a médica.

 

Marcia classificou esses comportamentos como um surto coletivo.  “Esse surto coletivo mata, porque isola as pessoas.”

 

O avanço da ciência

 

Em um momento da live, a médica disse ser grata por todo o avanço no tratamento de pessoas com HIV e pelas novas tecnologias de prevenção à doença. “Eu me lembro de chorar no corredor do hospital, falava comigo que um dia eu tinha que ver a situação mudar, eu não aguentava mais perder paciente, e sou muito feliz e grata porque realmente vi isso acontecer, hoje eu não perco mais pacientes, até porque já estou aposentada, mas os pacientes não morrem com a mesma frequência que antes”, comemorou a médica.

 

Sentença de vida

Ao relatar a história do seu livro, Marcia falou como surgiu a ideia e revelou que o nome da publicação não foi escolhido por ela. “O meu livro foi acontecendo de forma muito natural, era mais um desabafo, uma maneira de falar sobre o que passei. Então no livro eu conto algumas histórias, principalmente sobre experiência pessoal que eu tive com um paciente que conheci em dezembro de 1986 e ele morreu em agosto de 1987. Nesse meio tempo ele mudou a minha vida, sempre falava para eu ampliar meus horizontes e a forma como ele insistia nesses assuntos comigo mudou a minha forma de ver e pensar sobre a vida e sobre o HIV/aids”, narrou.

 

“O nome do meu livro não fui eu que escolhi, foram os editores, eles me explicaram que apesar de eu contar histórias de morte, eu também contava histórias de vida, de pessoas que estavam vivas há mais de 30 anos, falaram que independentemente do tempo que essas pessoas viveram, elas me passaram experiências de vida. E foi isso que aprendi com meus pacientes, precisamos valorizar a vida, independentemente do tempo que tenha, a força da vida é maior do que qualquer diagnóstico”, finalizou.

 

Assista a live na íntegra: CLIQUE AQUI

Fonte: Agência de Notícias da AIDS                                         

 

 

 

 

 

 

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