Por Herbert Medeiros
As
redes sociais apresentam-se como mais uma prodigiosa ágora do mundo
contemporâneo. Ganha a democracia e os cidadãos. Pois bem, estava eu a ler um artigo publicado originalmente na Folha de
São Paulo mas que tive acesso via facebook. O texto intitulava-se “Marcelo Cerrado, o equivocado”, do escritor e
diplomata Alexandre Vidal Porto. A reflexão ali
lançada descortinava o teor homofóbico da declaração do ator global que
afirmou em entrevista ao jornal da Folha
não desejar que sua filha de
sete anos presenciasse um beijo gay na
tv.
Volto
a falar do valor das redes sociais para o debate democrático. Abaixo do texto
de Alexandre Vidal muitos comentários no face dialogavam de forma plural com o artigo do escritor. A partir de um texto-fonte gestado em outra
mídia e migrado para o universo da
cibercultura, representada aqui pelo facebook e blogs, permitiu-se que múltiplos pontos de
vistas promovessem uma análise do papel educativo das telenovelas
quando retratam pessoas homoafetivas.
Também
resolvi entrar no debate que se dava no face. Na medida em que lia os
comentários fui desenhando umas perguntas cá comigo: O que são gays caricatos?
O que eles revelam de tão assustador ou sublime? Onde guardamos o Crô que está dentro de nós? O que
significa ser um gay comum? Gays
afeminados também não são sujeitos políticos que fazem da sua ‘feminilidade’ uma
forma de ação política?
Como
caracterizar a fauna LGBT em sua diversidade? É desejável defini-la,
caracterizá-la, estabelecer as fronteiras? Aqui são os gays afeminados. Lá são
as barbies. Lá acolá são os gays sérios e comuns. Ali estão as lésbicas
masculinizadas e do outro lado da pista estão as lésbicas femininas. Essa aqui
é uma transexual de verdade e aquela lá é falsa. Fulana não é travesti, mas a
cicrana é uma travesti legitima. Olha,
fulana, aquela lá não é travesti não, é uma mulher transexual.
O
que é falso e verdadeiro em relação à sexualidade, à identidade de gênero e à
orientação sexual? Só temos mesmo as orientações sexuais homo, bi e hetero? O
que as define? É só a atração afetiva-sexual que delimita nossa orientação
sexual? Aonde nos leva nossos desejos? Enfim, as encruzilhadas dessas questões nos provocam a
refletir continuamente sobre...Decifra-me ou te devoro.
Em
relação à telenovela e o personagem Crô,
percebemos o quanto o mesmo é alvo do deboche e da violência homofóbica na teia
da narrativa. É o bode expiatório para
as vilanias da Teresa Cristina, do motorista sexista e dos ‘homens’ saradões
que circulam na praia. O discurso da novela eletrônica banaliza e naturaliza a
homofobia cultural que traz danos físicos,
psicológicos e sociais à população LGBT. Alexandre Vidal tem razão
quando afirma que a atual novela global presta um desserviço à cidadania ao não retratar o
universo lgbt em sua pluralidade e ainda por cima reforçar o discurso homofóbico.
É Inegável que as telenovelas têm um papel social, educativo e
simbólico e seus roteiristas deveriam criar com mais regularidade personagens
(heteros, homos, bi, tri, poli ) que refletissem a diversidade humana em sua
complexidade. Gilberto Braga, autor de
novelas da Globo, trouxe no seu último
folhetim eletrônico um elenco bem mais diverso do universo LGBT. Tinha o gay
afeminado, o advogado assumido e bem-sucedido, o professor universitário, o
administrador de empresa, o jornalista, o funcionário de lanchonete.
Infelizmente a emissora ainda tem o tabu de mostrar cenas de carinho entre
casais homoafetivos. Trata esses casais como seres assexuados. Desejamos que novos ventos tragam mudanças.
Mas
independente das críticas às telenovelas
- críticas legitimas, diga-se - penso que cabe a espaços como as redes sociais,
escola, universo acadêmico, pesquisadores, grupos de intelectuais, movimentos
sociais, mídias alternativas problematizarem o conteúdo dos produtos oferecidos
pela TV e outras esferas sociais, pois, quem sabe assim vamos democratizando e
interferindo nos bens culturais que nos são oferecidos.