GAY [guêi] adj. Informal. 1.
Homossexual. Que se refere a homossexualidade: relacionamento gay. 2. Que
demonstra comportamentos, particularidades e/ou ações características de
homossexual: evento gay. s.m. e s.f. Aquele ou aquela cuja atração (afetiva e/ou
emocional) é demonstrada e/ou direcionada a pessoas do mesmo sexo: ela é gay,
logo, tem uma namorada. 3. (Etm. do inglês: gay) Alegre, vistoso.
A apropriação de termos
ofensivos é um dos pilares da cultura de resistência. A palavra “gay” era
utilizada em tom pejorativo por significar “alegre”, para deixar claro que a
frescura – ou “alegria” – não era um traço desejável em um homem. Como o machismo
necessita da constante afirmação do masculino, transforma tudo que é afeminado
– ou seja, gay – em algo desprezível, menor. Chega a ser irônico que a palavra
usada para definir homossexuais seja essa…
Ser gay dói. É difícil.
Apesar de impressionantes avanços dos últimos 40 anos, perceber-se homossexual
ainda envolve muita negação e rejeição. Há o medo de contar para a família, o
medo de passar a vida sozinho, o medo de sofrer com a violência das ruas, o
medo do preconceito nos espaços de trabalho… Tudo isso parece passar quando
vivemos o momento libertador de “sair do armário”, já que admitir essa
identidade tira o peso do segredo, de uma dor solitária. Acontece que esse
“assumir-se” é uma resposta à pressão social por uma definição. Por mais
gostoso que seja, transforma-se em outro pedido desesperado por aceitação, como
um “tá bom, sou isso mesmo, já podem me encaixar em X modelo de sociedade”. E
não há nada de alegre nisso.
Seria natural que a
“Comunidade Gay” fosse um paraíso de aceitação pronto para receber seus filhos,
inclusive com as variantes que formam nossa sigla atual, ALGBTTIQ. Entretanto,
não é isso que acontece. Ao invés de buscarmos o respeito à diversidade – que
gostamos tanto de dizer ser nosso objetivo – seguimos na eterna busca da
aprovação dos heterossexuais. Por sermos definidos como divergentes do “padrão
de referência”, procuramos obsessivamente “nos desculpar pelo incômodo” e
corrigir a nossa falha, entrando num
padrão definido para nós, por aqueles que nos rejeitam.
Alteramos nossos corpos.
“Gay” é um padrão que vai
muito além de desejos sexuais ou de identidades culturais. É um nicho social
que tem regras rígidas, reproduzidas quase sem pensar. Um “homem gay ideal”
precisa ser melhor do que um heterossexual. Mais bonito, culto, bem cuidado,
estiloso… É como se a “falha” da homossexualidade tivesse que ser compensada
com uma série de qualidades fabulosas de anúncio de revista. Dentes brancos,
cabelo liso e bem penteado, corpo sarado, porte atlético, barba desenhada
porque a aparência masculina deve ser cultivada. Somos lindos e gays, mas
apenas quando parecemos uma coleção de bonecos Ken!
A cada final de semana, as
redes sociais são inundadas por milhões de fotos de homens gays, sempre
exibindo a felicidade conjunta de festas e eventos badalados. É fumaça, bons
drink com energético, corpos brilhando de suor e raios laser iluminando as
pistas. Curiosamente, ninguém usa camisa. Somos lindos e nossos corpos
conquistados à duras penas nas academias precisam ser exibidos. Ao que parece,
é o único meio de sermos desejados e admirados. Validados pela luxúria alheia.
Padronizados. Aceitos.
É o “bom estereótipo gay”,
já que essa beleza branca e endinheirada nunca é questionada. O gay que
incomoda é a “bichinha pão com ovo”. Os “machos sarados” são motivo de inveja
entre homens HT e um desperdício na opinião das mulheres. Gordos “nem parecem
gays”, e como não são aceitos pelo padrão vigente precisam criar um nicho
próprio, a toca dos ursos. Negros são a minoria da minoria, transformada em um
fetiche por pau grande.
Nesse mar de generalizações,
só temos em comum o estigma da promiscuidade. Nossa liberdade sexual goza do
sabor predatório que o machismo empresta à sexualidade de todos os meninos, com
a vantagem de que nossos parceiros são nossos iguais, sem repressão. Talvez
seja esse o nosso pecado imperdoável, que precisa ser coberto de culpa como
forma de punição. Ao sermos reduzidos a nossos desejos sexuais, somos privados
de nossa identidade e considerados um pouco menos humanos. Viados mesmo.
Esse castigo é doloroso
porque não importa o tamanho do esforço, pois continuaremos à margem. Somos
lindos, mas sacrificamos nossos afetos para manter um padrão inatingível, que
nos oprime. Na busca por uma perfeição inventada, criamos outra coisa para
rejeitar em nossos corpos e nossas subjetividades. Não há nada de alegre nisso…
O que é TÃO gay!
Fonte: Os Entendidos