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5 Lições para sair bem do armário: LGBTS narram caminhos para autoestima

Por Thiago Araújo

"Eu sou gay". Três palavras e... um pé na porta do seu armário, certo? Não é bem assim. Confesso que escrevendo agora parece fácil, e pode até ser que para alguns tenha sido, mas falar assim com tanta naturalidade sobre minha orientação sexual demorou um certo tempo, algum planejamento e bastante confiança.

Nas últimas semanas, conversei com amigos e amigas homossexuais em busca de experiências para escrever esta reportagem. Apesar de cada um ter seu caminho, separei fatos em comum que auxiliaram a jornada de nossos personagens pra achar a “saída do armário”. São 5 dicas baseadas nas histórias deles para ajudar você a sair do seu.

1. Antes para você mesmo, depois para os outros

“Se você não consegue amar a si mesmo, como você vai conseguir amar outra pessoa?”

Uma unanimidade entre as pessoas com quem conversei foi a autoaceitação. Antes de se assumir pra qualquer pessoa, você precisa estar confortável com você mesmo. Eu sei que parece papo de auto-ajuda, mas é mais pura lógica: para encarar o mundo, é preciso encarar antes o seu próprio espelho.

É uma experiência libertadora a primeira vez em que falamos em voz alta a frase “eu sou gay”. Mas, até chegar esse momento, rolam milhões de perguntas na cabeça, inclusive se nos sentimos assim mesmo ou se esta é só uma fase. Tanto fisicamente, quanto emocionalmente: você gosta de verdade de pessoas do mesmo sexo que o seu?

O primeiro caso é um tanto óbvio de perceber: na época da puberdade, os hormônios mexem com todo o nosso corpo, ativando as área do cérebro responsáveis pela sexualidade. Quando conversei com a gerente de contas Amanda Sanches, 26, ela disse que, aos 14 anos, percebeu que era lésbica: “(Foi) quando uma amiga ficou nua na minha frente e eu, estranhamente, olhei (para) ela de um jeito bem diferente”. Um ano depois veio o lado emocional, quando ela se apaixonou pela melhor amiga.

“Quando você percebeu que você era gay?”

Já para o publicitário Rafael Lungwitz, 27, foi um pouco mais difícil de se aceitar: “Achava que fosse algo que passaria quando eu arrumasse uma namorada e acontecesse algo sério entre nós. Esse dia nunca chegou. Aos 17 anos, me apaixonei por um outro garoto. Foi então que eu parei pra entender o que estava acontecendo e percebi: ‘sou gay… não vai passar, não quero uma namorada’.”

No início é meio difícil mesmo e você se sente sozinho no mundo, mesmo cercado de todo tipo de referência com a internet hoje em dia. Uma dica do arquiteto André Abrão, 27, é se informar muito: “Eu recomendo informação. Antes de tudo, para que você supere a homofobia interna. Veja séries e filmes com temáticas gays, leia livros sobre o assunto”.

2. Devo planejar para quem contar primeiro?

Escolher bem a primeira pessoa para contar pode ser chave para te ajudar em todo o processo. Um irmão, seu melhor amigo ou uma tia que sempre te entendeu melhor que todo o resto da família fazem a diferença na hora do pontapé inicial. Confiança (e algum planejamento) é o grande segredo aqui, foi o que disseram os meus entrevistados.

O músico Rafael Miranda, 26, e a designer Fernanda Caetano, 24, ambos contaram para suas respectivas melhores amigas em quem confiavam muito. “Planejei durante muito tempo e contei para minha melhor amiga de infância que era gay. Ela ficou muito surpresa, mas super me apoiou”, conta Miranda. Já a amiga de Fernanda não achou nada estranho: “Ela disse que não a surpreendia, que tinha a ver comigo, e que nada mudaria entre nós. Em geral, todos os meus amigos reagiram de uma forma muito natural. Acredito que a dificuldade maior seja contar para pessoas mais velhas, pois existe o choque entre as gerações.”

Pra enfrentar essa diferença, André Abrão contou com a ajuda da irmã e falou primeiro para ela e depois para o restante da família: “Ela entendeu que eu não podia mais viver uma mentira e foi uma grande aliada. Eu já não suportava viver escondido. Me sufocava. Assim, quando chegou no meu limite, eu decidi viver quem eu era, porém antes abri o jogo com minha família.” E a reação deles? “Minha mãe desmaiou, meu pai ficou muito quieto. Mas, foi questão de pouco tempo para eu ter todo o apoio e carinho deles.”

 

Mesmo planejando, às vezes é você quem se surpreende quando quebra as portas do armário: “Contei para meu melhor amigo e para minha melhor amiga. Semanas depois eles vieram se assumir para mim também”, revelou Rafael Lungwitz sobre a escolha de falar com os dois ao mesmo tempo. E deu super certo: “Estávamos os três muito confusos, mas um ter saído do armário ajudou os outros dois a saírem também. Um apoiava muito o outro. Assumimos no mesmo período para as famílias.”

3. Se não consegue falar, escrever vai te dar a confiança que você precisa

Amanda Sanches é dessas: já tinha se aceitado e escolheu a prima para ser a primeira pessoa para quem contar, mas não conseguia falar de jeito algum. “Eu planejei contar, mas tinha medo de falar pessoalmente, então escrevi uma carta”. Lembra da primeira paixão de Amanda por uma amiga? Esse foi o tema da carta que a prima respondeu: “Ela disse que poderia ser só uma admiração mais forte e que poderia passar. E que se não passasse, também não teria problema”.

O DJ e produtor de elenco Arrigo Araújo, 26, fez algo parecido, mas usou a internet para isso. Escolheu uma amiga que havia se mudado de colégio na época - “Achei que seria mais fácil contar para alguém com quem eu não tivesse um convívio diário. Caso ela não aceitasse, tudo seria mais fácil” - e pediu para ela entrar no ICQ, um programa de chat bem popular nos anos 2000: “Ela achou divertido, me questionou muito se eu tinha certeza, logo depois começamos a fofocar sobre meninos imediatamente e tudo correu bem”.

4. Internet é uma grande aliada

“Eu cresci em uma cidade rural e muito pequena do interior. Como estudava em outra cidade, não convivia com os colegas da escola, e também não tinha muitas referências sobre como eu tinha que ser. Sentia atração por mulheres, e isso era ok pra mim, já que não percebia que outras meninas não sentiam. Um dia, eu tive este insight incrível: notei que as meninas voltavam do fim de semana contando casinhos sobre os meninos que elas paqueravam na pracinha. Os casais de adultos que eu conhecia, eram todos formados por um homem e uma mulher. E aquela amigona do meu pai, aquela, de cabelo curto, com jeito de homem... era solteira. Foi nesse dia que eu percebi que o mundo não era gay. Eu sim.”

Este depoimento é da estudante de pós-gradução em biologia vegetal Thaíssa Engel, 24. Moradora atualmente da cidade Campinas, ela cresceu no interior do estado de São Paulo e mesmo com a consciência de que era lésbica, Thaíssa não tinha como sair do armário: “Eu não podia contar pra familiares, a minha única amiga de escola tinha se mudado. Sabia que era gay, mas não conhecia mais ninguém que fosse”. Aos 15 anos, ela se mudou para uma cidade um pouco maior, onde se conectou pela primeira vez na internet: “Um mundo novo! Isso foi um divisor de águas. Fiz vários amigos virtuais, e com esses desconhecidos, eu não precisava fingir nada. Eu era eu.”

5. Não corra: entenda o seu tempo e o do outro

 

É dever de cada um saber o seu melhor momento, mas o consenso entre as pessoas com as quais conversei é de quando ele chega, não dá mais pra segurar e você percebe que é a hora de falar para alguém. Para Arrigo, o importante é saber como dizer e respeitar o tempo de cada um:

“Acho que o ideal é não ser combativo. Sair do armário é mostrar para as pessoas quem você realmente é, mas também se abrir para que te aceitem. Muita gente, principalmente os pais, ainda não sabe como lidar com a novidade de ter alguém próximo sendo gay. Então, é uma mão de duas vias: enquanto você espera que eles te aceitem, você tem que dar para eles o tempo e o espaço necessários para que processem a informação e lidem com isso”

O geólogo Fernando Rodrigues, 24, concorda que cada um tem o seu timing e deixa um recado para quem ainda não encontrou o seu: “Se assuma para você mesmo. Depois, se assuma para amigos mais próximos que você achar que devam saber. Eu vivi por muito tempo sabendo disso, mas não queria acreditar. Posso dizer que ter um conflito interno é a pior coisa que nós podemos fazer conosco. Hoje em dia é como se eu tivesse tirado um peso das costas”.

“Se você ainda é adolescente, não queime etapas, dê tempo ao tempo e uma hora você vai perceber que precisa contar para alguém”. É o que acredita o designer Marcel Pace, 28. No entanto, ele ainda acha que há sim aquele momento limite para sair do armário e que isso tem a ver com idade e respeito:

“Se é adulto, já é hora de compartilhar com os amigos de um jeito ou de outro. Eu imaginava que as pessoas tinham o direito de se afastar de mim, caso elas não achassem ok. Coisa nenhuma! Ninguém tem o direito de te julgar ninguém. Se as pessoas realmente gostam de você, elas vão te aceitar do jeito que é. Pode parecer um chavão, mas é a mais pura verdade, e quanto mais o tempo passa, mais vou entendendo”

 

Fonte: HUFFPOST

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