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BEM DE FAMÍLIA. ASPECTOS FÁTICOS E JURÍDICOS.

 

JOSINO RIBEIRO NETO.

BEM DE FAMÍLIA. ASPECTOS FÁTICOS E  JURÍDICOS.

A coluna decidiu pesquisar na doutrina e na jurisprudência sobre BEM DE FAMÍLIA, instituto jurídico dos mais importantes, sob o aspecto social “das famílias”, restando modesta contribuição para os leitores interessados no estudo da matéria.

Antes de adentrar objetivamente no estudo pretendido segue a transcrição de opinião doutrinária de autoria de ÁLVARO VILLAÇA AZEVEDO  no seu livro “BEM DE FAMÍLIA, 4ª edição, RT, p. 15, acerca da importância do bem de família:

“Dizer da importância do mesmo é desnecessário, pois tudo que vem ao encontro da proteção da família, em última análise, dá fundamento à própria estrutura do Estado, que vive sob a condição de que seja estável o órgão familiar, com direção profícua, sólida proteção e cuidados especiais.” E prossegue (ob. cit. p. cit):

O bem de família representa um meio de assegurar essa mais cara instituição, quanto ao mínimo necessário, quando ao mínimo suficiente à sua existência, equilibrando os interesses particulares com os coletivos”. Em sede de conclusão afirma (ob. cit. p. cit):

“Toda vez que se desgastou a instituição da família, mostra-nos a História, desmoronaram-se os Impérios, perderam sua base, seu sustentáculo.”

O mesmo autor (ob. cit. p. 94) oferece a seguinte definição para o referido instituto: “O bem de família é um meio de garantir um asilo à família, tonando-se o imóvel onde a mesma se instala domicílio impenhorável e inalienável, enquanto forem vivos os cônjuges e até que os filhos completem sua maioridade.”

Feita a breve digressão  da importância do bem de família, como meio de lhe assegurar alguma proteção, se faz necessário  o entendimento acerca da etimologia da palavra bem, que na definição de Laudelino Freire, no seu “Grande e Novíssimo Dicionário da Lingua Portuguesa” – ed. José Olímpio, Rio, 3ª ed. 1957, v. II, p. 1.01, “significa tudo que é bom, aquilo que é útil à existência e à conservação ou auge de alguma coisa, física ou moralmente; é proveito, propriedade, domínio, sendo substantivo que descende de bene (bem), advérbio latino provindo do adjetivo bônus, a, um (bom).”

Em sede de antecedente histórico, no Direito Romano, no período da chamada República Romana, existia nos costumes e nos ordenamentos jurídicos da época a proibição de alienar patrimônio da família. Todos tinha caráter de inalienabilidade, considerando os rigores dos princípios (pétreos) de perpetuação dos bens dos antepassados, que eram considerados sagrados.

Então, até o fim da República Romana era considerada um desonra a venda de bens herdados dos antepassados.

O instituto jurídico do bem de família existe regulamentado na legislação de todos os países civilizados, como parte da segurança dispensada às famílias, por serem o alicerce básico de todas as nações.

Dada  a exiguidade de espaço a coluna deixa de fazer estudo da matéria à guisa de DIREITO COMPARADO com a legislação brasileira.

No Brasil, após repetidos debates por renomados juristas da época, finalmente foi o acolhido no PROJETO  DE CLÓVIS BEVILÁQUA, resultante de emenda votada no Senado,   então, foi incluído  no sistema legislativo brasileiro em 05.12.1912.

Após essa fase inicial passou a constar dos diplomas civis sucessivos e atualmente, consta dos arts. 1.711 e 1.712 , do Código Civil:

Art. 1711 “ Podem os cônjuges, ou entidade familiar mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial.

Parágrafo Único. “O terceiro poderá igualmente instituir bem de família por testamento ou doação, dependendo a eficácia do ato da aceitação expressa de ambos os cônjuges beneficiados ou da entidade familiar beneficiada.

Art. 1.712 - O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicilio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.

A matéria é legalmente complementada nas regras postas nos  artigos 260 e 261 da Lei nº 6.015 de 31 de dezembro de 1973 (LEI DOS REGISTROS PÚBLICOS):

Art. 260. A instituição do bem de família far– se-á por escritura pública, declarando o instituidor que determinado prédio se destina a domicílio de sua família e ficará isento por dívida.

Art. 261. Para a inscrição do bem de família o instituidor apresentará ao oficial do registro a escritura pública de instituição, para que mande publicá-la na imprensa local e, à falta, na da Capital do Estado ou do território.

Mas a solução tradicional dada pelo Código Civil sempre foi considerada burocratizante, com entraves e, assim, de pouca utilização pelas famílias, resultando repetidas cobranças pela edição de normas mais objetivas, pretensão tolhida por portentosas instituições financeiras, em especial, as bancárias, com crédito a receber e que necessitam de garantias sobre o patrimônio total dos devedores.

No Governo José Sarney, que contava com a genialidade da inteligência e do preparo jurídico do Ministro da Justiça SAULO RAMOS, foi encaminhada ao Congresso Nacional a Medida Provisória nº 143, de 08.03.1990, que aprovada, resultou na promulgação da Lei nº 8.009, de 29.03.1990, pelo Presidente do Senado Nelson Carneiro.

A maioria dos doutrinadores registram o enaltecimento da referida lei, que além de fortalecer e tornar objetivo e facilitado  o importante instituto do bem de família, o referido diploma legal surgiu em boa hora, considerando que Nação brasileira atravessava séria crise, principalmente de ordem econômica, resultando em apenações às famílias, na inadimplência de seus compromissos financeiros.

Mas, promulgada a Lei 8.009/90, portentosas empresas que figuram como credores da população, em especial, as instituições financeiras que “vendem dinheiro” (os bancos), contrataram profissionais de reconhecida competência jurídica, para questionar a constitucionalidade da lei.

Dentre outros, Carlos Callege, publicou judicioso trabalho na Revista dos Tribunais ( RT 662/58-63), defendendo a inconstitucionalidade da referido lei, onde afirma que a impenhorabilidade geral de bens posta na legislação sob comento, “torna inócuo o princípio universal da sujeição do patrimônio às dívidas, acolhido pela Constituição brasileira (art. 5º , incs LXVII e LIV), e atinge o próprio regime econômico básico adotado pela Carta, que pressupõe relações obrigacionais das mais diferentes espécies, suprimindo as garantias e a eficácia coativa do direito de crédito.”

Não obstante a reconhecida juridicidade dos argumentos, mas o aspecto social do texto legal falou mais alto  e a primeira decisão reconhecendo a constitucionalidade da Lei 8.009/90, resultou de decisão  do Tribunal de Justiça de São Paulo, através da 11ª Câmara, em 24.09.1992, por votação unânime, de relatoria do Desembargador ITAMAR GAINO, que entendeu no seu voto, que a ampliação do bem do bem de família, já que a mesma recebe proteção do Estado, considerada e reconhecida como a base da sociedade pelo disposto no art. 226 do Texto Fundamental tem foros de juridicidade, fazendo constar do seu voto:

“Não é considerada inconstitucional a ampliação do instituto do bem de família pela Lei Federal 8.009, de 1990, uma vez que objetiva garantir um abrigo para a família, em condições de habitabilidade.”

Então, sede de conclusão, que se faz à guisa de justificar a importância do bem de família conforme consta da Lei 8.009/90, pois a sua constituição é imediata, isto é, ex lege, desde que ocorram hipóteses previstas no dispositivo de emergência, incluindo, ainda, bens móveis, ao contrário do bem de família previsto no art.1.711 e seguintes do Código Civil, que depende da vontade do instituidor, por isso é voluntário e que enfrenta enormes formalidades e entraves burocráticos, que até desestimulam quem pretendo instituí-lo.

Na próxima edição será objeto de enfoque as regras postas na lei 8.009/90, com destaque para as exceções, a opinião dos doutrinadores e a jurisprudência mais recente sobre a matéria.   

     

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