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Sinalização aéreas em Linhas de Transmissão

Esfera usada na sinalização áerea de Linha de Transmissão. Crédito: Karolina 

O acidente com a aeronave que vitimou fatalmente a cantora Marília Mendonça suscita um importante aspecto no que se refere à segurança das instalações elétricas: a sinalização aérea das linhas de transmissão. O avião que transportava a cantora e sua equipe colidiu, antes de cair, com cabos de uma linha de transmissão que ficava no entorno do aeroporto de Ubaporanga, em Caratinga, onde o mesmo deveria pousar. Vale ressaltar que a linha de transmissão estava em construção, portanto não estava energizada. Ainda que a linha estivesse energizada, há que se descartar a possibilidade dos ocupantes da aeronave virem a ser eletrocutados, graças a fenômeno conhecido como Gaiola de Faraday, mas esse é um tema para uma outra postagem. 

Inicialmente é importante destacar que as Linhas de Transmissão são estruturas extremamente importantes para que a energia elétrica chegue até o consumidor final. São portadoras de tensões que podem chegar a 750.000 volts. Sua instalação em áreas próximas de aeroportos requer atenção ao que prescreve a norma. Na proximidade de aeroportos, na área retangular com início na cabeceira da pista medindo 100 m de largura por 1.000 m de comprimento, não poderão serem feitas implantações de quaisquer edificações. Divulgados nos dias 3 de julho e 13 de setembro, os relatórios, chamados Infotemp, informavam que as torres que estavam sendo instaladas violavam o plano básico de zona de proteção do aeroporto de Ubaporanga. A Cemig (distribuidora de energia de Minas Gerais) garante que as torres de transmissão estão instaladas fora da zona de proteção do aeroporto. 

A fim de garantir uma melhor identificação visual diurna das linhas de transmissão são utilizadas esferas de sinalização, as quais são colocadas para destacar a presença de linhas elétricas em áreas com alta densidade de tráfego aéreo, seguindo as orientações da NBR6535 e NBR7276. O(a) caro(a) leitor(a) certamente já dever ter visto umas dessas esferas, geralmente na cor laranja ou vermelha, em linhas de transmissão que “cortam” as rodovias. Em áreas próximas a aeroportos ou com densidade de tráfego aéreo excepcionalmente alto, as esferas devem ser instaladas a cada 30 m em vãos selecionados da extensão dos cabos. No caso do acidente com a aeronave, a Cemig afirmou em nota que “ a sinalização por meio de esferas é exigida para torres em situações específicas, entre elas estar dentro de uma zona de proteção de aeródromos, o que não é o caso da torre que teve seu cabo atingido. 

Independentemente de qualquer coisa, quando se fala em energia elétrica, segurança nunca é demais. Ainda que a situação não exigisse a instalação das esferas sinalizadoras, a proximidade com o aeroporto (ainda que dentro do permitido) é um fator que inspira cuidado. A nós, o que resta, além de lamentarmos profundamente a morte dos passageiros e tripulação da aeronave é acompanharmos as investigações das causas da queda e saber se o fator sinalização aérea da linha de transmissão foi preponderante no acidente.

 

O dia D da energia na COP26

Fonte: gov.uk

Hoje aconteceu o Dia da Energia (Energy Day) na COP26. Pelo menos 23 países assumiram novos compromissos para eliminar a energia à base de carvão, combustível fóssil com elevado potencial de poluição. A maior aliança mundial para a eliminação progressiva do carvão ganhou 28 novos membros. Chile e Cingapura foram duas nações que se juntaram à Powering Past Coal Alliance, que é co-presidida pelo Reino Unido e Canadá. 20 novos países, incluindo Vietnã, Polônia e Marrocos, se comprometeram a não construir novas usinas.

"Assegurar uma forte coalizão de 190 países para eliminar a energia à base de carvão e acabar com o apoio a novas usinas a carvão e a Declaração de Transição Justa assinada hoje mostram um compromisso real e intencional de não deixar nenhuma nação para trás", disse Alok Sharma, presidente da COP26. Vários grandes poluidores ainda estão faltando na grande promessa de eliminação do carvão. Embora as metas de aquecimento global existentes exijam que os países parem de queimar carvão, muitas das principais economias não definiram uma data para encerrar seu uso. A ONG internacional Global Witness também afirma que o anúncio fica "espetacularmente aquém" do que este momento exige. Um acordo que trata apenas do carvão não resolve nem metade do problema", disse Murray Worthy, líder de campanha da organização. “As emissões de petróleo e gás já ultrapassam de longe o carvão e estão crescendo, enquanto o carvão já está entrando em declínio terminal."

Worthy acrescenta que a ciência é "absolutamente clara" quanto ao fato de que os combustíveis fósseis devem ser totalmente eliminados se quisermos evitar os piores impactos da emergência climática. "Este é um pequeno passo em frente quando o que precisávamos era de um salto gigante."

 

A dimensão jurídica do acesso à energia

Créditos: Anete Lusina

O estabelecimento e a quantificação das necessidades básicas do ser humano vêm sendo há algum tempo debatidas por economistas e planejadores. Contudo, a maioria concorda que os programas de atendimento das necessidades básicas deveriam garantir padrões mínimos de nutrição, habitação, saúde, vestuário, educação, condições sanitárias e trabalho decente. Embora a energia elétrica não esteja mencionada nessa lista, o atendimento de cada necessidade básica implica consumo deste recurso (GOLDEMBERG, 2010; WHITTON et al., 2015). Uma vez que o acesso à energia elétrica pode ser concebido como uma condição essencial para que a população alcance melhores condições de vida, é possível apresentar a relação desse tema com as legislações que abordam os direitos fundamentais, tanto em âmbito nacional como internacional.

Assim, as discussões atuais acerca do tema têm admitido o acesso à energia elétrica como condição para a concretização da dignidade da pessoa humana, tema sobre o qual versam tantos tratados, leis e constituições. Dessa forma, apesar de o assunto não figurar explicitamente entre os termos das leis, percebe-se que tal direito também faz parte desses dispositivos legais. Nesse contexto, segundo o art. 3º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos: "ninguém deve ser submetido a tortura ou a tratamento ou a punição desumana ou degradante”. Se partirmos da ideia de que o acesso à energia elétrica de qualidade é uma das condições para a dignidade humana, torna-se claro que o assunto tem sido abordado - ainda que indiretamente - em importantes instrumentos normativos. Outro documento importante no cenário internacional é o chamado "Electricity Directive" 2009/72, que traz o dever dos Estados-membro de oferecer acesso à energia elétrica de qualidade e a preços acessíveis, reduzindo a desigualdade que existe em relação a esse direito importante. Além disso, também é importante a visão que traz acerca da compreensão dessa questão como uma das nuances dos direitos humanos. O Departamento Internacional de Desenvolvimento do Reino Unido também defende a compreensão do acesso à energia como questão de direitos humanos.

No âmbito nacional, uma análise do texto da Constituição Federal de 1988 revela um alinhamento de seu preâmbulo com o que foi discutido sobre os dispositivos anteriormente, posto que atribui ao Estado Democrático brasileiro a responsabilidade de promover e assegurar o desenvolvimento da sociedade. Além disso, o art. 1°, III versa sobre o Estado Democrático de Direito e institui a dignidade da pessoa humana como uma de suas bases, o que perpassa todas as condições entendidas como necessárias para a efetividade desse ideal, incluindo os benefícios alcançados a partir de um correto provimento de energia elétrica de qualidade (tais como educação, lazer, saúde, etc.). Em seu art. 3°, II dispõe sobre a garantia do desenvolvimento nacional, que também está relacionado com o tema debatido, conforme analisado. Outros artigos importantes trazidos pela CF/88 são o art. 22, que institui a União como o ente responsável pela elaboração de leis e demais dispositivos legais relacionados a água, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão. Além disso, o art. 175 também merece destaque, porque trata do fornecimento de energia elétrica, que o Poder Público deve oferecer/garantir.

Além disso, a necessidade de fontes alternativas renováveis para a produção de energia elétrica no cenário nacional também está alinhada àquilo que é disposto no art 225 da Constituição Federal de 1988, segundo o qual: "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações." É perceptível, portanto, que o acesso à energia elétrica no cenário contemporâneo está elencado entre uma das necessidades essenciais para a materialização de direitos, os quais são tão discutidos e amparados pelas leis, nacional e internacionalmente. Para além do texto constitucional, um marco muito importante para o contexto da legislação sobre energia elétrica no Brasil é a lei através da qual foi criada a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), trata-se da lei n° 9.427/96. A ANEEL é responsável por regular o setor de eletricidade brasileiro. Nesse sentido, é importante novamente citar a criação do Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica, o Luz Para todos, como ficou conhecido. O decreto que o institui data do ano de 2003 e tinha por fim uma maior universalização do acesso à energia elétrica, envolvendo as camadas da população mais vulneráveis socialmente, como a parcela que residia em meio rural, por exemplo.

A Lei n° 10.438/2002 também não pode deixar de ser apontada nessa análise, pois foi a partir dela que foi criado o PROINFA (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica), o qual visa a aumentar a participação de fontes renováveis para a produção de energia elétrica. Outras leis brasileiras também possuem um enfoque maior nas questões envolvendo o setor elétrico, como a Lei n° 9.487/97, que trabalha as soluções para o oferecimento de energia às diversas regiões do país; a Lei n° 9.991/2000, que trata sobre o investimento em Pesquisa e Desenvolvimento em relação à eficiência energética; a Lei n° 10.438/2002, a qual se volta para o estabelecimento da Tarifa Social de Energia (sendo importantíssima para o cenário brasileiro, intensamente marcado pela desigualdade social). Além das referidas leis, existem muitos outros dispositivos legais que versam sobre o assunto. A partir dessa visão mais ampla, é possível perceber o impacto que tais medidas possuem para a distribuição de energia no cenário nacional, no sentido de aumento da eficiência na produção e distribuição e também na redução de desigualdades.

 

Energia deve ser destaque na COP26

Crédito: divulgação COP26

De 1º a 12 de novembro acontece, em Glasgow, capital da Escócia, a 26ª Conferência das Nações Unidas (COP-26), reunião internacional mais aguardada dos últimos anos para discussão das mudanças climáticas. Existe uma grande expectativa pelo pronunciamento das nações e as medidas a serem implementadas pelas mesmas para a redução das emissões de gases de efeito estufa até 2030. A partir do panorama atual e do planejamento apresentado por cada nação será possível estimar se o mundo está no caminho certo para alcançar a meta do Acordo de Paris, assinado em 2015, o qual definiu um limite do aumento da temperatura média da Terra numa faixa de no máximo 1,5°C a 2°C acima dos níveis do período pré-industrial.

Os gases de efeito estufa, entre eles o gás carbônico, são os principais responsáveis pelo aquecimento do planeta. A intenção do debate, mesmo que numa perspectiva de longo prazo, é eliminar até 2050 as emissões globais de carbono causadas pela queima de combustíveis fósseis. O setor de energia é responsável por um quarto das emissões globais de gases de efeito estufa. Para cumprir os objetivos do Acordo de Paris, precisamos nos afastar do carvão e investirmos em energias limpas numa velocidade 5 vezes mais célere do que ocorre atualmente. Os cenários são favoráveis: as energias solar e eólica agora são mais baratas do que o carvão na maioria dos países. Portanto, é preciso uma soma de esforços para acelerar a transição global do carvão para energia limpa que beneficie empregos, trabalhadores e comunidades. 

A expectativa é de que além das diretrizes para a redução das emissões, sejam anunciadas, durante a conferência, medidas catalisadoras para a difusão do uso das energias renováveis, além de aspectos relacionados à mobilidade urbana, sobretudo no que se refere à redução dos custos para aquisição de carros elétricos. No Conselho de Transição de Energia, os líderes políticos, financeiros e técnicos do setor de energia global estão trabalhando juntos para garantir que a energia limpa seja a opção mais atraente para a nova geração de energia para todos os países. Um documento oficial deve ser apresentado ao final da COP-26, onde serão listados os compromissos, inclusive àqueles mais específicos. A tendência é que todos os caminhos levem ao estímulo de empresas e nações a investirem na economia de baixo carbono e em energias limpas. As metas apresentadas devem ser ambiciosas. Se serão cumpridas ou não, só o tempo dirá. O certo é que há hoje um consenso de que uma transição energética baseada em fontes e tecnologias renováveis é a única maneira realista de cumprir as metas globais da Agenda das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (ODS) e do Acordo de Paris. 

 

O dispositivo de proteção que pode evitar uma tragédia

Créditos: Leo Caldas

No setor elétrico podemos enumerar diversos dispositivos destinados à proteção de pessoas, instalações e edificações contra anomalias e surtos que podem vir a ocorrer nos circuitos. Hoje vamos abordar um desses dispositivos, o DPS (Dispositivo de Proteção contra Surtos). Mas o que é um surto? Podemos definir surto como sendo uma onda transitória de tensão elétrica, o que provoca um elevado valor de corrente elétrica em um curtíssimo intervalo de tempo. Ele pode se propagar ao longo de toda a instalação elétrica, danificando equipamentos e dependendo da intensidade, provocando incêndios.  Frequentemente, os surtos elétricos advêm de descargas atmosféricas (raios) diretas e indiretas, mas também podem ter origem na operação de ligação e desligamento de máquinas e até da própria rede elétrica de distribuição de energia (caso de blecautes) onde o abastecimento de um bairro pode ser desligado e religado. 

Para proteger a rede elétrica e os demais equipamentos o DPS atua com um desvio da descarga para o sistema de aterramento. O processo ocorre em apenas uma fração de segundo. No entanto, o DPS tem vida útil, sendo necessária sua substituição depois de um tempo de uso. É extremamente importante que o projeto elétrico da instalação seja elaborado e executado por profissionais qualificados. O DPS pode ser instalado antes ou depois do disjuntor geral da instalação a depender do caso concreto e o quão protegido queremos deixar a edificação. Agora, um ponto importante: é essencial proteger não somente os condutores fase, mas também o condutor neutro (em sistemas monofásicos e trifásicos). 

A instalação do DPS protege não só a edificação de surtos elétricos, mas também prolonga a vida útil dos equipamentos eletroeletrônicos conectados à rede elétrica. Não tem como prever quando seremos submetidos a uma queda de um raio, picos de energia ou um blecaute geral. Os prejuízos evitados podem ir além dos materiais. No caso de um incêndio, vidas podem ser salvas por conta do uso do DPS. Sua instalação não deve ser negligenciada. Não é um acessório, mas sim necessidade fundamental no projeto. O seu uso não dispensa a instalação de SPDA (sistema de proteção contra descargas atmosféricas), a depender do tipo de edificação. Dependendo da aplicação e da classe, o DPS tem valor estimado entre R$ 150,00 e R$ 400,00. 

 

Tempo seco aumenta risco de choque estático

Crédito: divulgação fisher scientific

Quem nunca “tomou” um choque ao tocar em alguém ou em algum objeto metálico? Esse é um fenômeno que ocorre graças à existência da eletricidade estática. O equilíbrio entre as cargas positivas (prótons) e negativas (elétrons) de um corpo é o que caracteriza a eletricidade estática. Em geral, todos os corpos são neutros (mesmo número de prótons e elétrons).  A existência de um atrito entre objetos de materiais diferentes pode provocar um desequilíbrio entre as cargas e resultar em um choque estático.

Os caminhões que transportam combustíveis inflamáveis geralmente possuem uma corrente de metal que se arrasta pelo chão, fazendo com que as cargas elétricas que aparecem do atrito do caminhão com o ar sejam descarregadas no solo, evitando riscos de explosões. Ao caminhar sobre um carpete, o corpo de uma pessoa acumula elétrons que se “deslocam” do chão. Ao tocar no trinco metálico de uma porta, por exemplo, essa carga negativa acaba sendo transferida para o metal do trinco, que é um material condutor. É nesse instante que a pessoa sente o choque estático.

O choque estático não mata, já que tem uma elevada tensão e uma baixíssima corrente elétrica, esta sim, a responsável pela intensidade e efeitos de um choque no corpo humano. No entanto, os períodos de clima seco inspiram um maior cuidado, pois a incidência de choques estáticos aumenta, o que pode trazer alguns desconfortos. Isso acontece porque o ar seco é um excelente isolante e as cargas permanecem acumuladas no corpo humano por um intervalo maior de tempo. Com mais cargas acumuladas aumenta a sensação do choque estático. Para liberar parcialmente a carga estática do corpo uma opção é manter a pele hidratada. Então, banhar, nadar e molhar a pele são medidas que podem amenizar os efeitos da eletricidade estática.

 

 

Energia para atendimento das necessidade básicas do ser humano

A estrutura da demanda de energia elétrica e seu respectivo suprimento dependem das estratégias escolhidas para aliviar a pobreza de um país, e uma especialmente promissora é a alocação de recursos para satisfazer as necessidades básicas do ser humano. As implicações da política de energia num trabalho de atendimento das necessidades básicas do ser humano variam de um país para outro. A determinação dessas implicações pressupõe uma coleta detalhada de dados e análise de uso final e de sua respectiva demanda de energia, a estimativa da disponibilidade de recursos energéticos e avaliações de diferentes combinações de tecnologia de suprimento e uso de energia para atender estas demandas.
 
A falta de acesso à energia elétrica implica na privação de utilização de vários bens de consumo, muitos dos quais são instrumentos que levam a um melhor conforto e bem-estar. Nessa perspectiva, o abastecimento de energia, sobretudo nas comunidades rurais, deve ser visto como uma medida que leve cidadania às pessoas, garantindo a estas pelo menos um “mínimo existencial” energético, conceito que remete à ideia de que necessidades essenciais sejam atendidas tais como conservação de alimentos, acesso a comunicação e iluminação noturna.  
 
A pobreza energética é um conceito que vem ganhando espaço a nível mundial e sua compreensão requer o entendimento sobre as diversas formas, por vezes complexas, que este fenômeno atinge milhares de pessoas em diversos países e nas variadas condições socioeconômicas. O Índice de desenvolvimento Humano Médio (IDHM) está fortemente relacionado com o consumo de energia de uma região. Com efeito, a disponibilidade de energia elétrica é fator preponderante para o estabelecimento de melhores condições de vida das populações. Na figura abaixo é apresentada a relação existente entre IDHM e consumo de energia nos estados brasileiros no ano de 2010. Na figura, o estado do Piauí, detentor de um dos menores valores de IDHM do país, destaca-se como o que menos consome energia. Na outra extremidade está o estado de São Paulo, com maior consumo. São várias as razões intrínsecas nesta relação, dentre as quais podemos destacar presença/ausência de um parque industrial consolidado. Levar eletricidade a todas as habitações deveria ser prioridade de muitos programas voltados para as necessidades básicas do ser humano. Um enorme desafio seria a eletrificação de áreas rurais onde o acesso às redes elétricas centralizadas é dispendioso.
 
Relação entre IDH-M e consumo per capita de eletricidade dos estados brasileiros para o ano de 2010. Fonte: LIRA (2015).

 

Energia que vem do Hidrogênio: Ceará sai na frente

Dentre as iniciativas adotadas por uma nação para viabilizar o seu processo de transição energética, o investimento na produção o hidrogênio, como fonte de energia, se caracteriza como uma tomada de posição vanguardista. O hidrogênio é o elemento químico mais abundante do planeta. Na Terra, o hidrogênio só existe em combinação com outros elementos. Ele está na água, junto ao oxigênio, e se combina com o carbono para formar hidrocarbonetos, como gás, carvão e petróleo. Portanto, o hidrogênio precisa ser separado de outras moléculas para ser usado como combustível, o que requer grandes quantidades de energia, além de ser um procedimento muito oneroso.

O hidrogênio é leve, armazenável e possui alta densidade energética. Seu uso como combustível não produz emissões diretas de poluentes ou gases de efeito estufa. O principal obstáculo ao uso extensivo de hidrogênio com baixo teor de carbono é o custo de sua produção. Há alguns anos, no entanto, o hidrogênio começou a ser produzido a partir de energias renováveis, como solar e eólica, por meio de um processo chamado eletrólise. A eletrólise usa uma corrente elétrica para dividir a água em hidrogênio e oxigênio em um dispositivo chamado eletrolisador. O resultado é o chamado hidrogênio verde, que é 100% sustentável, porem bem mais caro de se produzir do que o hidrogênio tradicional.

Atualmente, 99% do hidrogênio usado como combustível é produzido a partir de fontes não-renováveis. Portanto, a inserção de energia renovável (solar e/ou eólica) para obtenção do hidrogênio verde deixa o processo consideravelmente mais sustentável e essa deve ser a aposta de muitos países. Nos últimos anos, várias nações anunciaram estratégias de hidrogênio, a quantidade de eletrolisadores que produzem hidrogênio aumentou e o custo da eletricidade renovável para alimentar esses eletrolisadores está caindo. Austrália, Holanda e Alemanha lideram essa corrida. A nível nacional, a multinacional EDP do Brasil fará um investimento de quase R$ 42 milhões para a construção da primeira usina de hidrogênio verde no país, localizada no Complexo Portuário do Pecém, estado do Ceará. A planta terá capacidade de 3 MW e um módulo eletrolisador de última geração para produção do combustível com garantia de origem renovável. A unidade modular terá capacidade de produzir 250 Nm3/h do gás.

Ainda são muitos os desafios para a difusão dessa nova tecnologia. Os governos precisam agir rapidamente e de forma decisiva na adoção de medidas políticas para permitir que o hidrogênio com baixo teor de carbono cumpra seu potencial de ajudar o mundo a atingir emissões líquidas zero e, ao mesmo tempo, apoiar a segurança energética.

 

Apagão: um risco iminente

Crédito: João Vítor Heinrichs

O Brasil passa pela pior crise hídrica dos últimos 91 anos, a qual provocou a redução do volume de água nos reservatórios das hidrelétricas a níveis verdadeiramente críticos. Com a redução da energia produzida a partir das hidrelétricas e, diante da necessidade de atendimento da demanda energética, temos acompanhado a inserção na matriz elétrica brasileira de energia advinda das termelétricas, uma fonte relativamente mais cara do que qualquer outra fonte convencional, sem falar no seu impacto ambiental significativamente maior. Apesar disso, no cenário atual, é a fonte mais eficiente no sentido de garantir o abastecimento de energia elétrica aos consumidores brasileiros. Com a continuidade da escassez de chuvas nas bacias dos rios que contém os reservatórios das hidrelétricas existe um risco iminente de termos um apagão energético no país. Para alguns especialistas do setor elétrico a questão a ser respondida não é se teremos o apagão, mas quando ele acontecerá. 

Pelas projeções do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a situação mais crítica deve acontecer na segunda quinzena de novembro de 2021. O ONS elaborou uma nota técnica (NT-ONS DGL 0093/21), na qual traça cenários da situação para o período entre agosto e novembro 2021.O ONS simulou dois cenários, os casos A e B. O caso A se caracteriza como um cenário conservador e disponibilidade térmica (aquilo que já existe). O cenário B se caracteriza por uma projeção superior, disponibilidade térmica e ainda recorre a energia importada de países vizinhos. O documento conclui que para o caso A, mesmo com o esgotamento de recursos hidráulicos das regiões Sudeste e Centro-Oeste e com a maximização da energia transferida das regiões Norte e Nordeste para região Sudeste, ainda assim, os recursos serão insuficientes para o atendimento ao mercado interno de energia. Para o caso B (com oferta adicional incorporada), há um ganho no que se refere ao armazenamento de energia eliminando o desperdício encontrado no caso A. Ainda para o caso B, o atendimento energético somente será viabilizado a partir da incorporação de recursos adicionais, sobretudo de mais termelétricas (grifo nosso). O documento finaliza recomendando o aumento da disponibilidade de energia vinda de termelétricas e um maior volume de importação de energia da Argentina e do Uruguai. Recomenda ainda a adoção de medidas que induzam à redução voluntária do consumo de energia por parte dos consumidores.

Diante dessa realidade qual é o risco real de um apagão no setor elétrico? Inicialmente, precisamos diferenciar os termos apagão e racionamento. O apagão acontece de forma inesperada e, em geral, é provocado por um contingenciamento no sistema elétrico (curto circuito, descarga atmosférica, falhas localizadas na geração, transmissão ou distribuição da energia). Temos como exemplo de apagão, o episódio que ocorreu, no final de 2020, no estado do Amapá. O racionamento é uma iniciativa do governo e ocorre de forma compulsória, quando é necessário reduzir o consumo de energia elétrica, ou seja, quando o sistema não tem mais condições de atender a demanda de energia elétrica do país. Ocorre o que chamamos de seletividade de cargas. Em linhas gerais é como se fosse um rodízio no abastecimento de energia. Assim, em um determinado período parte do Sudeste pode ser atendida energeticamente, enquanto parte do Nordeste é penalizado ou para garantir o abastecimento da região Norte é preciso desabastecer parte do Centro-Oeste.

Na nossa avaliação o risco do apagão existe e ele é real, sobretudo na segunda quinzena do mês de novembro quando chegaremos a uma situação que irá beirar o caos. É verdade que o governo pode implementar algumas ações com vistas a reduzir essa probabilidade, tais como aumentar (infelizmente) a participação, na matriz elétrica, das termelétricas e comprar ainda mais energia da Argentina e do Uruguai.
A região Sudeste é a mais crítica com relação ao abastecimento de energia elétrica. A mesma só ainda não colapsou porque as regiões Norte e Nordeste, sobretudo esta última, tem enviado sua energia excedente, graças à geração de energia eólica. O investimento em energias renováveis também precisa ser considerado, sobretudo a energia solar fotovoltaica, a qual pode reduzir a dependência em relação às termelétricas no período diurno. Finalmente, talvez a medida mais impactante seja uma campanha promovida pelo Governo Federal para que os consumidores desenvolvam ações de consumo eficiente e uso racional da energia elétrica. Nessa perspectiva, estamos falando de uma poupança energética que seria criada para fins de não sacrificar sistema elétrico brasileiro. 

 

Causas e impactos da bandeira tarifária escassez hídrica

Créditos: Rodolfo Clix.

No início do último mês de setembro a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) lançou a bandeira tarifária escassez hídrica. Na realidade não temos aí nenhuma novidade. A bandeira citada aparece com uma nova roupagem, mascarando o que antes chamávamos de bandeira tarifária, modalidades verde, amarela e vermelha patamar 1 e 2. As bandeiras tarifárias foram criadas em 2015 e refletem a situação em que se encontram os reservatórios das hidrelétricas brasileiras. Portanto, a bandeira verde indica que o nível das hidrelétricas está satisfatório. A bandeira amarela indica que o nível dos reservatórios começa a ser comprometido. A bandeira vermelha, patamar 1, indica que os reservatórios estão em um nível que inspira maior cuidado. Finalmente, a bandeira tarifária vermelha, patamar 2, é o pior cenário possível, indicando que o nível dos reservatórios encontra-se em nível crítico.

A bandeira tarifária vermelha, no início de 2015, tinha um custo de R$ 3,00 para cada 100 kWh de energia elétrica consumidos. No último mês de agosto, após sucessivos aumentos, este valor chegou a R$ 9,42, ficando a expectativa de que poderíamos ter um novo aumento. E o aumento chegou! Chegou não mais com o nome de bandeira tarifária vermelha, embora, na sua essência, o conceito e as razões que levaram a sua implementação sejam as mesmas.

A bandeira tarifária escassez hídrica, cujo valor é de R$ 14,20 para cada 100 kWh de energia elétrica consumidos, reflete um aumento de quase 50% em relação ao valor da bandeira tarifária vermelha patamar 2. Assim, um consumidor que tem o seu consumo médio de 300 kWh por mês pagará R$ 42,60 a mais na sua conta de energia. Se considerarmos o valor médio da tarifa de energia elétrica nas distribuidoras, estamos falando de um aumento de aproximadamente 15% a mais na fatura de energia desse consumidor.

Para além do impacto econômico verificamos ainda um impacto ambiental. Para suprir a falta de energia gerada a partir das hidrelétricas, o governo autoriza o acionamento de usinas termelétricas, as quais, em sua maioria tem um nível elevado de emissão de gases de efeito estufa, a depender do combustível que é utilizado para geração deste tipo de energia. No Brasil, utiliza-se quase que predominantemente o diesel e o gás natural como combustíveis das termelétricas.  

Uma outra novidade trazida pela bandeira tarifária escassez hídrica é o seu período de vigência. Enquanto as bandeiras verde, amarela e vermelha eram estabelecidas sempre no mês anterior a sua vigência, a bandeira tarifária escassez hídrica tem previsão de vigência até abril de 2022. Ao fazer essa previsão de vigência, o governo está desconsiderando a possibilidade de voltarmos a ter a incidência de chuvas e consequentemente a elevação do nível dos reservatórios nas hidrelétricas. Mas quais as razões que nos levaram a esta crise energética reflexo de uma crise hídrica? Em uma primeira análise, podemos dizer que faltou planejamento daqueles que fazem o setor elétrico brasileiro.  A previsão do regime de chuvas em uma região pode ser feita a partir de séries históricas e esses dados estão disponíveis. Portanto, era previsível que em 2021 teríamos uma crise dessa magnitude, a maior vista dos últimos 91 anos. Tal crise poderia ter tido seus efeitos mitigados, sobretudo fazendo uso e ampliando a instalação de outras fontes de energia que, embora intermitentes, são renováveis e existem em abundância no Brasil, tais como as energias eólica e solar.

Em um país onde quase 70% da matriz elétrica advém de fontes renováveis, condição que nenhum outro país possui, era de se imaginar que estivéssemos agora fazendo uso dessas energias. No entanto, apesar dessa diversidade na matriz elétrica, faltaram habilidade e planejamento para que não chegássemos ao ponto em que nos encontramos agora. A escassez é hídrica! A escassez é energética! A escassez é de competência!

 

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