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Kopenhagen x Cacau Show: o Registro de Marca e a Lei da Propriedade Industrial no Brasil

Por Gabriel Furtado

Por Mariana Salha

Em decisão publicada no começo de julho de 2024, a juíza Federal Laura Bastos Carvalho, da 12ª Vara Federal do Rio de Janeiro/RJ, determinou que a Kopenhagen não tem exclusividade sobre o uso da marca "Língua de Gato". A magistrada entendeu que a expressão "língua de gato" é de uso comum e designa chocolates em formato oblongo e achatado, podendo, portanto, ser utilizada por outras chocolatarias.[1] Este caso ilustra a aplicação rigorosa da Lei da Propriedade Industrial no Brasil e ressalta a eficiência do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) na proteção de interesses coletivos e na promoção da livre concorrência.

Atualmente, no Brasil, os direitos e obrigações concernentes à defesa da propriedade industrial são regidos pela Lei 9.279/96[2], também conhecida como Lei de Propriedade Industrial. O artigo 2º desta lei estabelece que o registro de marca perante o INPI é a forma pela qual se atribui proteção aos direitos relacionados à propriedade industrial, coibindo a concorrência desleal. Concorrência desleal refere-se a quaisquer ações abusivas cometidas com o objetivo de angariar consumidores de empresas concorrentes para obter lucros no mercado.

Nesse contexto, o registro de marca é de extrema importância para garantir a proteção jurídica e o direito exclusivo de uso de uma marca em determinado segmento comercial. Com o registro, a marca obtém proteção legal para seu nome, logotipo e outros elementos relacionados à empresa. Isso significa que o empreendedor pode usar sua marca sem medo de que alguém possa copiá-la ou usá-la sem permissão, estando resguardado em casos de práticas de concorrência desleal.

A ação judicial foi movida pela Cacau Show, que buscava a anulação dos registros de marca nº 906.413.478 e nº 906.413.966 no INPI, argumentando que "língua de gato" é uma expressão descritiva e amplamente utilizada no mercado para designar chocolates com um formato específico. Segundo a Cacau Show, o termo foi criado no exterior no século XIX e se tornou comum em várias partes do mundo, incluindo o Brasil, sendo utilizado por diversas marcas para identificar chocolates em formato de língua de gato.

Em sua defesa, a Kopenhagen alegou que a marca "Língua de Gato" possuía distintividade adquirida ao longo do tempo (secondary meaning) e que a expressão nunca foi de uso comum ou descritiva. A empresa argumentou que a exclusividade do uso do termo era justificada pelo reconhecimento que a marca havia alcançado no mercado brasileiro, associando a expressão especificamente aos seus produtos.

Após a análise dos argumentos, a magistrada decidiu pela anulação do registro nº 906.413.478, que abrangia chocolates e doces. A decisão foi fundamentada no art. 124, VI da Lei de Propriedade Industrial, que proíbe o registro de termos descritivos ou comuns para produtos específicos. A juíza concluiu que a expressão "Língua de Gato" é comumente utilizada para designar chocolates em formato oblongo e achatado e, portanto, não é passível de registro como marca nominativa exclusiva.

A decisão judicial destacou a importância de manter termos genéricos acessíveis à coletividade, evitando que uma empresa monopolize expressões de uso comum, o que poderia prejudicar a livre concorrência. A juíza ressaltou que a tentativa de registrar tal expressão viola o princípio da livre concorrência, pois impediria que outras empresas utilizassem um termo amplamente reconhecido para descrever um tipo específico de chocolate.

Contudo, o registro nº 906.413.966, que incluía produtos não relacionados diretamente a chocolates e doces, foi mantido. A especificação deste registro não fazia referência direta ao formato dos chocolates, permitindo que a Kopenhagen mantivesse a proteção sobre a marca em outras categorias de produtos.

A decisão foi recebida como um marco importante para assegurar um mercado mais justo e competitivo. Ela sublinha a impossibilidade de se apropriar de termos genéricos que pertencem ao domínio público, promovendo a transparência e a equidade na competição empresarial. Este caso reforça a relevância da Lei da Propriedade Industrial no Brasil, que busca equilibrar os interesses de proteção de marcas com a promoção da livre concorrência. A atuação do INPI é fundamental para garantir que o registro de marcas não se torne um instrumento de monopólio indevido sobre termos descritivos ou de uso comum, assegurando que o mercado permaneça acessível e justo para todas as empresas.

 

[1] https://www.migalhas.com.br/arquivos/2024/7/AA116146A72044_Evento46-SENT1.pdf

[2] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9279.htm

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