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UESPI: Por que a Autonomia Universitária é importante?

Nos últimos dias a Universidade Estadual do Piauí (UESPI) tem aparecido mais frequentemente na mídia em razão dos seus professores terem estabelecido um movimento grevista denunciando as precariedades da Instituição de Ensino Superior (IES), pública estadual, adotando como mote “A UESPI se nega a morrer”.

Nos meus quase dois anos de titularidade frente ao Ciência Viva, pouco tenho tocado no tema UESPI, a principal universidade onde exerço atividades de ensino e pesquisa, salvo por anunciar descobertas e projetos de colegas da instituição, descobertas estas que me geram grande alegria e orgulho em divulgar. No geral, do dia a dia e das dificuldades, evito falar, por que estão dentro de uma realidade que me entristece. Mas resolvi usar este espaço hoje para esclarecer sobre um ponto que considero importante para a sobrevivência de uma universidade, visto que o movimento paredista se foca na sobrevivência da IES: a Autonomia Universitária.

Para explicar melhor para o leitor, a Autonomia Universitária é a propriedade que as universidades brasileiras gozam, desde a Constituição de 1988 de poder gerenciar seus atributos administrativos, financeiros e patrimoniais. Em suma a ideia seria: determinado o valor do orçamento da Universidade, a partir do Plano Plurianual (que determina o que vai acontecer pelos próximos quatro anos) e a Lei Orçamentária Anual (LOA), que detalha a forma de aplicação de recursos pelo intervalo de um ano, regularmente, a IES receberia parcelas mensais para administrar. Apesar da Constituição Federal determinar e, a Constituição Estadual de 1989 ratificar, isto não acontece. Todavia isto não é uma particularidade do Piauí.

No Brasil inteiro, até onde meu conhecimento alcança, apenas os estados de São Paulo e da Paraíba têm suas universidades estaduais autônomas. Isso ajuda ao leitor compreender porque a USP, a UNESP e a UNICAMP ocupam o topo das melhores universidades do Brasil. A Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) também se destaca no contexto nacional, ainda que seja menos famosa do que as coirmãs paulistas. Estas quatro universidades, ao terem o seu orçamento definido, recebem na forma de duodécimos (doze parcelas mensais) os recursos para administrar e direcionar, segundo suas necessidades, fortalecendo o seu ensino de graduação e pós-graduação, suas atividades de pesquisa e suas atividades de extensão, os três pilares que sustentam a universidade.

A Autonomia Universitária, entretanto, não é um mar de rosas. Por dois motivos básicos: em primeiro lugar as universidades não são imunes de terem gestões ruins na lida com os recursos. Para exemplificar, a USP, a bem pouco tempo atrás, esteve imersa (acredito que ainda continue) em uma crise, porque o que recebia de recursos para sua autonomia era insuficiente para custear, de forma equilibrada, suas despesas. Na época falava-se em um déficit de 5% mensais. Ou seja: a universidade recebia “X” e gastava “X” + 5%. Ou seja: a conta não fechava. O segundo motivo está relacionado à origem dos recursos. Como são recursos que dependem do que o estado arrecada e são baseados em percentuais, quando a arrecadação do Estado diminui, a arrecadação da universidade diminui. Esta segunda situação depende do modelo de autonomia adotado.

 

A Autonomia da (e para) UESPI

A UESPI nunca gozou de autonomia financeira e patrimonial. Talvez, quando ainda estava se estabelecendo, recebia recursos de convênios que administrava junto a prefeituras e outros órgãos, mas algo bem distante de uma autonomia de fato. Por seus mais de 30 anos, sempre dependeu da Secretaria de Fazenda para cumprir seu calendário de pagamentos. Desde o mais complexo e vultoso, como pagamentos referentes a uma obra de infraestrutura, até ao mais simplório pagamento de uma conta de energia elétrica, por exemplo. Os procedimentos contábeis são feitos na Universidade, mas a conta entra em uma fila de pagamentos na SEFAZ. O que arrecada também, como por exemplo a oferta de um curso de pós-graduação lato sensu, como uma especialização, os recursos arrecadados vão para a conta única do Estado, enquanto as despesas, seguem o mesmo ritual das demais despesas da IES. Em outras gestões governamentais a UESPI gozava de autonomia administrativa. Nos processos de promoções funcionais, progressões, aprovados por critérios meritocráticos nos Conselhos Superiores, como por exemplo, a conclusão de um curso de Mestrado ou Doutorado, depois dos procedimentos e verificações acadêmicas e administrativas, eram prontamente executados, o que hoje não acontece. O que, aliás, é o principal fator motivador da greve. O professor terminou seu Doutorado e não consegue receber o equivalente ao que determina o Plano de Cargos, Carreiras e Salários da IES, gerando uma tremenda frustação.

Em 2015, pressionada pela comunidade universitária, a Administração Superior da UESPI nomeou uma comissão formada por três professores, para estudar uma proposta de Autonomia Universitária para UESPI. Estive nesta comissão como membro, juntamente com dois colegas. Em quatro meses de trabalho fizemos a) um estudo dos processos que geraram a autonomia das universidades de São Paulo e da Paraíba; b) analisamos o volume de recursos arrecadados pelo Governo do Piauí nos últimos cinco anos; c) analisamos a evolução do orçamento da UESPI e quanto deste orçamento a IES conseguia executar para o mesmo período de cinco anos; d) calculamos projeções sobre a arrecadação de recursos do Estado e as projeções de despesas de pessoal e de reposição de quadro de pessoal da Universidade para os próximos 30 anos e; e) disponibilizamos uma proposta dentro da realidade financeira do Estado e na perspectiva de melhorar a situação da IES. Apresentamos o estudo para a Administração Superior da UESPI. Sinceramente, não sei por qual motivo, o estudo nunca se transformou em alguma ação efetiva para mudar a realidade da Universidade.

A luta por autonomia não será fácil. Por um longo período, a universidade tinha seus postos de trabalho, como direções, coordenações, pró-reitorias etc. como cargos de indicação política. A própria indicação do Reitor foi política até mais ou menos 2003, salvo engano. Os primeiros passos para autonomia foram dados, neste sentido, com a implantação de eleições para escolha dos dirigentes da universidade a partir da sua comunidade de professores, o que ocorre até hoje. Outra coisa: a Autonomia também gera mais responsabilidades. Em 2013, a convite da Associação Brasileira de Reitores das Universidades Estaduais e Municipais (ABRUEM) fui a Foz do Iguaçu palestrar sobre a Adesão da UESPI ao SiSU e, em conversas informais pude ouvir, do então Reitor da UEPB, reclamações sobre a queda de arrecadação do Estado da Paraíba, o que afetou os recebimentos de duodécimos da IES, gerando inclusive atraso de salários aos professores e demais servidores. Sem autonomia basta dizer que os problemas são culpa do Governo.

O estudo feito em 2015 não foi elaborado em vão. Apesar de não ter se revestido em ação para benefício da comunidade universitária serviu como base para ampliarmos a compilação de dados e transformarmos em um artigo científico que foi encaminhado para um periódico de grande impacto no meio acadêmico na área de educação. Tão logo seja publicado terei o maior interesse em divulgá-lo para toda comunidade acadêmica da UESPI e para o público leitor do Ciência Viva.

Uma boa semana para todos(as)!

O Manganês e a Doença de Parkinson

Pesquisadores radicados na Universidade de Iowa (EUA) descobriram uma das prováveis causas da Doença de Parkinson. Em artigo publicado na revista Science Signaling que circulou no último dia 12 de março, chefiados pelo cientista Dilshan Harischandra descobriram que o contato frequente com o metal Manganês pode desencadear quadro precoce de Doença de Parkinson.

Pesquisando em um grupo de trabalhadores que lidam diariamente com solda, a equipe descobriu ser comum o excesso da proteína a-sinonucleína (a-sin) responsável pela destruição de neurônios. O excedente da proteína foi associado ao contato mais comum com o manganês, próprio de quem trabalha com soldagem metálica, encontrado em vesículas extracelulares denominadas Exossomos, isoladas a partir do soro dos trabalhadores.

Tanto em cultura celular quanto em experimentos in vivo utilizando cobaias (camundongos), expondo-os à presença do metal ou a exossomos isolados e induzidos por manganês, foi possível notar a transferência de a-sin entre neurônios e micróglia, induzindo a inflamação e morte dos neurônios.

A descoberta abre um campo de investigação sobre a doença que, conforme se confirma, pode ser induzida por fator externo até então não cogitado. A ciência vai ajudando, pouco a pouco, a desvendar informações sobre doença neurodegenerativa muito degradante.

Até nosso próximo encontro!

O prêmio da pesquisadora brasileira e o Programa Ciência Sem Fronteiras

Na semana que passou o Brasil recebeu o resultado da Medalha John Marsden concedida à bióloga brasileira Thais Vasconcelos pela Linnean Society de Londres, por sua Tese de Doutorado desenvolvida na University College London sobre a expansão das plantas da família Myrtaceae, uma das mais importantes famílias botânicas presentes na flora brasileira que, de acordo com a autora, iniciou sua expansão ainda quando os continentes estavam fundidos formando o Gondwana (um dos supercontinentes).

Fonte: History Channel Brasil.

A vitória de Thais não é pequena, visto que não é fácil ser reconhecida pela Linnean Society, uma das sociedades científicas mais importantes do mundo. Para a maioria dos mortais adianto que, o fato de Thais trabalhar com espécies da família Myrtaceae já a transforma numa cientista excepcional, dada a complexidade de entendimento das plantas desta família, que abriga várias espécies comuns por aqui como a goiaba, a guabiraba, o jamelão, o jambo e muitas outras.

Fora a notícia o que chamou a atenção foi o fato desta pesquisadora ter sido patrocinada pelo Programa Ciência sem Fronteiras, instituído na gestão da Presidente Dilma Rousseff e que oportunizou a milhares de jovens a possibilidade de fazer intercâmbio no exterior.

O Programa Ciência sem Fronteiras (CsF) foi uma das mais proveitosas ideias executadas no Brasil na última década. Sua meta era distribuir 101 mil bolsas até 2015 (não sei dizer se esta meta foi alcançada) permitindo que estudantes, principalmente de graduação, pudessem ter experiências em universidades estrangeiras, às expensas do Governo Brasileiro. Ao todo, a ideia era que 64 mil estudantes de graduação (um dos segmentos beneficiados) pudessem, a sua escolha, matricular-se em uma universidade de ponta de um país que o acolhesse por um período médio de 1 ano. Muita gente soube aproveitar bem.

Conheci o caso de dois ex-alunos meus que saíram do curso de Biologia na UESPI e foram para Austrália, passando uma temporada lá em universidades bem além das melhores instituições do nosso país. Voltaram com ganhos qualitativos de conhecimento e, sobretudo, com a imersão em um país onde se fala inglês o que, por si, já representou um ganho considerável. Uma experiência que mudou a vida destes jovens e, não resta dúvida que para melhor. Mas o programa não colecionou apenas sucesso.

O Programa Ciência sem Fronteiras poderia ter sido bem melhor. Da forma como foi feito, muitos jovens, no ápice da sua imaturidade, utilizaram o momento para passear bastante às expensas do contribuinte. Não houve por parte do programa a preocupação em cobrar um feedback dos beneficiados. O caso da bióloga Thais Vasconcelos talvez não soasse como novidade se a coordenação do Programa tivesse feito cobranças às universidades de onde estes alunos partiram do Brasil, às universidades que os receberam no exterior e aos próprios beneficiários. Com certeza teria sido mais producente para nosso país.

Ademais, é importante que se diga que o programa sofreu um brutal encolhimento e hoje está restrito apenas aos estudantes de pós-graduação. O Governo Federal poderia começar a pensar em remodelar o programa, melhorar as bolsas, colocar exigências claras e com metas estabelecidas, não somente para os estudantes mais colocando a figura de tutores no Brasil e no país que recebesse os estudantes.

De graça uma dica do Ciência Viva para o Ministério da Ciência e Tecnologia...

Até a próxima!

 

 

Cuidado com a Internet

Já tem um tempo considerável que professores do mundo inteiro se debatem com o uso indevido da internet. Inicialmente pelos jovens na busca por conteúdos impróprios ou inadequados, passando até por pessoas mais maduras que, na ausência de algo mais construtivo, se apropriam das redes sociais e de outros recursos da internet para fazer e propagar o indevido. Parece até exagero quando alguém envolvido com a política brasileira fala que o que catapultou o candidato de direita e permitiu que ele ascendesse ao poder “foram velhinhos que espalhavam Fake News usando redes sociais”, como apontam matérias feitas por veículos de comunicação como a BBC, publicadas no início deste ano. Quando ouvi isso pela primeira vez achei que era uma piada descabida. Mas depois passei a perceber o quanto a internet em mãos de desavisados pode desconstruir facilmente o que a ciência levou décadas para construir, por exemplo.

Mais recentemente constatou-se que o crescente movimento de pessoas que acreditam que a Terra é plana aumentou de forma exponencial graças ao algoritmo de busca do YouTube. Matéria publicada no site Hypescience (clique aqui para ver) revela que nas duas convenções que reuniram dezenas de pessoas que acreditam na folclórica versão de que a Terra é um disco achatado, cercado de montanhas de gelo por todos os lados, realizadas em 2017 e 2018, de mais de trinta participantes ouvidos, 100% tinham começado acreditar nisso a partir do ato de ter assistido vídeos que evocam este assunto no próprio YouTube.

A matéria menciona entrevista com o engenheiro francês Guillaume Chaslot, que pesquisou sobre Inteligência Artificial no seu Doutorado e trabalhou no Google. De acordo com suas informações os engenheiros do YouTube trabalham com um algoritmo que vai direcionando o usuário a partir de um perfil de preferências. O algoritmo funciona mais ou menos assim: se você buscou um vídeo sobre um humorista, por exemplo, o próximo vídeo sugerido também será de um humorista que faz o mesmo tipo de piada do que você pesquisou inicialmente. Este algoritmo funciona similarmente ao de aplicativos como o Netflix que seleciona películas com características semelhantes à de alguma que você tenha assistido anteriormente. Assim, se você pesquisou um vídeo contando que o Homem não foi a Lua, o vídeo ofertado em sequência pode ser um dizendo que a Terra é Plana. Aí para virar uma crença, tudo fica muito rápido,

O mais importante, neste caso, é trabalhar com os conceitos que a pesquisa acresceu ao conhecimento, procurando combater com veemência o Fake News e ajudando dar um fim nesta onda quase infinita de desinformação que, inclusive, tem causado outros problemas, como a “revolta” moderna das vacinas, também propagada pelas redes sociais e outros meios de que, mais causam prejuízos do que benefícios: um verdadeiro descalabro contra uma geração completa de inocentes que poderão sofrer com doenças quase extintas para a geração de seus pais, que foram vacinados, “por terem lido em algum lugar na internet”, resolveram “poupar seus filhos disso”. Um absurdo completo!

Hoje, é mais do que necessário, valorizar o conhecimento e a educação. Agora é uma questão de vida ou morte.

Boa semana para todos (as).

Físico piauiense, em Oxford, testa recursos revolucionários para Microscopia Óptica

Os estudos em Biologia só começaram avançar fortemente quando o Microscópio foi inventado no século XVII. Antes de sua invenção o mundo que não consegue ser observado fora dos limites do olho humano era completamente desconhecido.

Os antigos tinham uma noção de que deviam existir seres minúsculos, mas tudo era muito na base da imaginação. Nomes como Anton von Leeuwenhoeck, Marcelo Malpighi e Robert Hooke foram os responsáveis por adotar lentes de vidro polidas na observação do mundo microscópico, o que permitiu uma verdadeira revolução nas ciências biológicas.

Do microscópio óptico usado pelos cientistas pioneiros até os dias de hoje, usados para o ensino de Biologia e ciências da saúde, muita coisa evoluiu. Foram inventados já no século XX aparelhos que usam outras tecnologias, bem mais caras por sinal, para investigação de um mundo cada vez mais restrito e limitado pelo tamanho. Hoje existe uma grande gana de combinações entre aparelhos sofisticados como microscópios eletrônicos de transmissão e de varredura, que permitiram maior ampliação da visão dos cientistas.

O microscópio óptico ainda é um dos recursos mais importantes para quem lida com a chamada Microbiologia. Mas o uso da luz como o recurso de investigação tem suas limitações tecnológicas. Um bom microscópio consegue ampliar com nitidez apenas 2000 vezes. Isso dá para aumentar o tamanho de uma Escherichia coli, a bactéria comensal que vive no nosso intestino e tem 6 micrômetros de comprimento, para 12 milímetros, uma imagem razoavelmente grande. Mas por incrível que pareça isso ainda é muito limitado. Se o pesquisador quisesse ver o capsídeo (estrutura corporal) do HIV que mede 120 nanômetros não conseguiria mesmo com o melhor microscópio óptico, aumentando 2000 vezes, chegaria próximo a 0,2 mm, muito pequeno para o olho humano, mesmo com este aumento.

 

A novidade na Microscopia Óptica

O piauiense José Inácio da Costa Filho, formado em Física pelo Instituto de Física de São Carlos - IFSC da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos (SP) está conduzindo sua pesquisa de Doutorado e pode mudar o curso da microscopia óptica mundial.

José Inácio da Costa Filho. Fonte: Arquivo pessoal.

Com mestrado no estudo de Lasers e agora no desenvolvimento da sua pesquisa na Universidade de Oxford, na Inglaterra, Zé Inácio trabalha pondo em prática um conhecimento relativamente novo. Uma teoria descoberta em 2016 está se transformando em uma aplicação prática que pode revolucionar o mundo da microscopia óptica. Trata-se do uso da técnica Hermite-Gaussian Microscopy. Esta técnica permite extrair mais informação da luz recebida pelo microscópio, reduzindo as perdas de visão por difração, reduzindo as distorções das imagens, permitindo um provável incremento de até 3 vezes na potência de visualização de microscópios ópticos. Nos atuais microscópios só é possível usar o aumento máximo, de 2000 vezes, com o uso de óleo de imersão, exatamente para melhorar a visualização. Com a nova técnica será possível um aumento com nitidez de 6000 vezes o que aumenta mais ainda o campo de visão de quem depende da microscopia e não tem recursos para usar microscopia eletrônica.

Equipamentos usados nos testes. Fonte: Arquivo Pessoal.

Aliás é bom que se diga que, nem tudo o que se estuda poderia ser usado com microscopia eletrônica, visto protocolo de preparação de amostras que também é um fator limitante para o uso do equipamento e da técnica. A pesquisa desenvolvida por Costa Filho pode representar uma total mudança de paradigma para muitos segmentos que dependem da microscopia óptica.

Para quem achar que a Ciência tem limites é sempre bom lembrar que tem alguém mais sagaz investigando um meio de superar estes limites. Siga o seu caminho, Zé Inácio!

Um bom domingo para todos (as).

O novo desastre que vem de Minas Gerais

Você pode ter lido este título e ter pensado: outra barragem estourou em Minas Gerais? Apesar das incomparáveis catástrofes de Mariana e Brumadinho que deram um prejuízo ainda incalculável ao Meio Ambiente, não somente em Minas, mas ao longo da bacia do rio Doce, no caso de Mariana e do rio Paraopebas, no caso de Brumadinho. Apesar de ter sido noticiado que a poluição decorrente do desastre de Mariana chegou no Santuário de Abrolhos que fica no Atlântico, na altura da Bahia, o que dá uma extensão descomunal para o problema. O desastre anunciado aqui é outro e de natureza estrutural: a quebra da FAPEMIG.

Primeiro quero explicar para o leitor o que é a FAPEMIG. É a Fundação de Amparo a Pesquisa de Minas Gerais. Todos os estados têm este tipo de órgão que pouca gente sabe para o que serve, o que inclui os políticos e tomadores de decisões. Estas estruturas governamentais foram órgãos criados logo após a Constituição de 1988 com o objetivo maior de fomentar, de financiar a pesquisa nos Estados. Aqui no Piauí temos a FAPEPI, que inclusive completou 25 anos um dia destes e eu até escrevi um post falando dela (veja aqui).

Estas fundações arrecadam recursos dos orçamentos estaduais, de fontes privadas, às vezes de fundos internacionais ou do orçamento federal para incentivar a pesquisa, a produção de conhecimento. Através de editais estas fundações custeiam projetos, tanto de pequena monta, quanto o custeio de bolsas de estudos para quem faz Mestrado, Doutorado e até a chamada Iniciação Científica. Esta última é de suma importância para formar o pesquisador quando ele ainda está na universidade. Ou seja: estas fundações investem no futuro da nossa Nação através da formação de pesquisadores, em vários níveis: da graduação ao pós-doutorado. É sempre bom lembrar que sem recursos não há pesquisa. Sem pesquisa não há produção de conhecimento. Sem produção de conhecimento uma nação viverá eternamente na dependência do que se produz em outra nação. Ou seja: será mera expectadora e consumidora de bens produzidos por quem detêm o conhecimento. Isto fere sobretudo nossa autonomia enquanto nação.

Em 2014 tive a oportunidade de presidir a FAPEPI. Participei em Belo Horizonte de uma reunião do CONFAP que é o Conselho dos Presidentes das FAPs. O encontro foi promovido pela FAPEMIG. Sai ciente dali que existiam três grandes FAPs no Brasil: FAPESP, FAPERJ e FAPEMIG, pois os diálogos e a demonstração do espectro de realizações e editais abertos para incentivo à pesquisa eram enormes. Fora as três grandes notei a existência de um time intermediário, onde figuravam as FAPs do Paraná, Pernambuco, Ceará, Goiás e outras, e um terceiro bloco onde estava a nossa FAPEPI, junto com o Acre, Rondônia, Tocantins e outras, com um dos menores orçamentos do Brasil. Ao me deparar hoje com notícias de que FAPEMIG cancelou milhares de bolsas de incentivo a Pesquisa, lançamento de editais de inovação encolhidos ou recolhidos, é visível o quanto a Ciência e a Tecnologia no Brasil estão muito longe de serem prioridade. Veja aqui.

Nenhum governo, de nenhum partido, de nenhum nível, federal, estadual ou municipal, no Brasil parece compreender a importância de valorizar a Ciência e a Tecnologia. Não conseguem enxergar os exemplos que vem de países como a Alemanha e o Japão que, mesmo depois de terem sido totalmente destruídos pelos efeitos das guerras conseguiram reconstruir suas economias incentivando a Educação e por extensão a Ciência e a Tecnologia. Não conseguem ver revoluções como as que catapultaram a Coreia do Sul de PIB similar ao Brasil na década de 1960 para uma das maiores potências mundiais, todas atreladas ao desenvolvimento de sua educação e, por extensão, da ciência e da tecnologia.

Chamo a sociedade para uma reflexão nesta Quarta-Feira de Cinzas: os políticos, tanto do legislativo quanto do executivo, precisam acordar para valorizar o que é realmente importante. Ao olharmos a lista dos principais produtos da Balança Comercial brasileira notamos um vazio muito grande de conhecimento agregado aos principais produtos que comercializamos. Dos dez produtos que mais exportamos, 9 são resultado das nossas riquezas naturais: minérios, produtos agrícolas e pecuários. Apenas um é resultado da agregação de conhecimentos: os aviões vendidos pela EMBRAER. Na lista dos dez produtos que mais compramos a situação é exatamente a inversa: nove são resultado de conhecimento agregado como medicamentos, aparelhos eletroeletrônicos e componentes eletrônicos, por exemplo.

Isto é resultado da nossa extrema pobreza. Não pobreza de recursos. Pobreza de pessoas que consigam pensar o futuro da nação investindo no alvo certo: a Educação.

Aranha das patas azuis é uma nova espécie descrita

Uma espécie de aranha encontrada nas florestas da Malásia é um dos mais novos organismos descritos pela Ciência. Trata-se da espécie Birupes simoroxigorum, chamada popularmente de Tarântula Azul. A espécie é nativa do Estado de Sarawak na Malásia tem as patas azuis bem características e um corpo de cor creme (veja imagem).

Tarântula Azul (Fonte: www.sciencemag.com)

 

A espécie recebeu este nome porque Biru é um termo para azul no idioma da Malásia. Já o nome específico é combinação do primeiro nome das três crianças que colecionavam o animal e a doaram para os pesquisadores: Simon, Roxanne e Igor.

A polêmica

A descoberta desta espécie abriu uma grande polêmica entre autoridades ambientais da Malásia e os cientistas que publicaram a descoberta. Os cientistas receberam a doação dos animais mortos de três crianças que as criavam. Entretanto, as autoridades da Malásia reclamam que não existe qualquer autorização para a saída destes animais do território malásio. O que significa que os animais typus (organismo que serviu como referência para descrição na condição de espécie nova) eram ilegais.

A Malásia é um dos países detentor de grande biodiversidade e que sofre bastante com os efeitos da biopirataria, dada a falta de controle das autoridades em relação ao fluxo de turistas que, por vezes, levam “lembranças” da fauna e da flora do país. O Brasil também sofre com este tipo de problema. Nossa hegemonia na produção de borracha natural, por exemplo, é o caso mais absurdo de biopirataria que nos causou prejuízos econômicos incalculáveis em épocas pretéritas.

Bom carnaval!!!

 

 

 

Vagalume: o mistério foi decifrado

Quando eu era criança pequena e íamos passar férias lá no interior de Valença do Piauí, algumas coisas chamavam minha atenção: primeiro como era viver num lugar sem energia elétrica e depois os mistérios das noites sem iluminação artificial.

O céu era mais estrelado e lá conheci também um inseto que piscava a noite, como se a estrela tivesse voando baixinho (era o meu pensamento de criança). E meus pais esclareciam: é um vagalume.

Muitos anos depois, quando já estudava Ciências na UFPI conheci a coleção do Prof. Almeidinha que tinha milhares de exemplares de insetos de todos os tipos. Lá vi de perto o vagalume. Trata-se de um tipo de besouro (Ordem dos Coleópteros, o mais numeroso grupo de espécies da Classe dos Insetos) que pode pertencer a pelo menos três famílias distintas onde a mais comum no Brasil é a família dos Lampirídeos.

A curiosidade é que os vagalumes produzem luz própria. Este fenômeno de produzir luz própria é chamado de Bioluminescência e também é realizado por fungos, bactérias e várias espécies de animais marinhos, com o objetivo principal de se comunicar. No específico do Vagalume é o de atrair parceiro sexual.

A reação de bioluminescência envolve a proteína Luciferina por ação de uma enzima chamada Luciferase (numa referência a Lúcifer, que em latim quer dizer “o portador da luz”). Embora se conhecesse algumas coisas sobre o processo, informações sobre a coloração da luz e detalhes químicos eram totalmente desconhecidos.

O grupo do pesquisador brasileiro, bioquímico Vadim Viviani do campus de Sorocaba da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e atual presidente da Sociedade Internacional de Bioluminescência e Quimioluminescência matou a charada. A bioluminescência é fascinante: em condições variáveis de pH, temperatura e na presença de metais pesados, a cor da luz que as reações emitem pode ir do verde ao vermelho. O mecanismo que permite essa variação, misterioso há décadas, agora fica mais claro a partir do artigo publicado este mês na revista Scientific Reports pelo grupo de pesquisadores.

O grupo de Viviani examinou a interação entre as moléculas responsáveis pela produção de luz e mostrou que na família dos vagalumes mais comuns, a conformação do sítio ativo da enzima luciferase é responsável por prender a substância luciferina. Há uma reação de oxidação que gera luz, as partes ricas em cargas positivas das duas moléculas são forçadas uma contra a outra, gerando uma luz de alta energia na região do espectro verde. Mas a medida que o inseto vai envelhecendo a luz vai mudando de cor. Por vezes, o brilho laranja ou vermelho liberado pelo vagalume, indica que o mesmo está à beira da morte.

Espécies diferentes de vagalumes produzem coloração diferente de iluminação, o que evita erros nos encontros nupciais.

O vídeo abaixo, produzido pela Pesquisa FAPESP traz explicações sobre o fenômeno com o próprio Dr. Vadim Viviani.

 

 

Os mistérios da natureza, gradativamente, vão sendo esclarecidos pela ciência.

 

(Com informações da Pesquisa FAPESP)

Educação 4.0: como trabalhar a geração do futuro?

O mundo em que vivemos está em constante transformação. Isto não deixa dúvidas nem no mais cético dos cidadãos, ainda que este queira encarar algumas mudanças como perfeitamente normais, numa época em que a evolução tecnológica vem mudando nossos hábitos – desde os mais simples, até a condução e direcionamento do mundo do trabalho.

Você já parou para perguntar se a escola que está formando seu filho está acompanhando esta evolução? Será que as crianças de hoje terão conhecimento suficiente para enfrentar o mercado de trabalho quando estiverem adultas? Se você ainda não se fez estas perguntas é muito bom começar a pensar nisso, especialmente se seus filhos estão entrando na escola agora. O mundo está realmente em constante evolução.

O mundo começou a se preocupar com os destinos da educação já tem algum tempo. Antes a preocupação era formar pessoas com grande capacidade de acumular conhecimento. Hoje a preocupação é outra. Como a educação é a base para ingresso no mercado de trabalho, educadores do mundo inteiro estão muito mais preocupados com o que os estudantes conseguem fazer do que com o potencial de acumular conhecimento. Antigamente as famílias se orgulhavam em ter nas estantes de sua casa um exemplar da Enciclopédia Britânica, uma das mais completas obras de referência para assuntos de cunho mais amplo. Toda pesquisa escolar começava pelas enciclopédias. Hoje as pessoas têm excelentes opções de sites de busca como o Google que, em pequena fração de segundos consegue buscar a informação que se quer. E aí você já parou para pensar do que estão vivendo agora as pessoas (vendedores) que visitavam potenciais compradores das Enciclopédias Britânicas?

Muitas profissões no mundo estão em crise. Funções que antes chegavam a ocupar lugar de destaque no mundo trabalho desapareceram totalmente. Estudo conduzido pelo Fórum Mundial Econômico gerou o relatório intitulado The Future of Jobs (O futuro do trabalho, em tradução livre), publicado em 2016 que aponta que até 2020 muitos dos postos de trabalho simplesmente desaparecerão. Postos como o de vendedor de Enciclopédias, por exemplo, que já desapareceu tem algum tempo. E vem a pergunta: será que seu filho terá formação suficiente para ingressar no mercado de trabalho?

Algumas grandes empresas como a Google, a Microsoft e a IBM contratam profissionais sem considerar a existência de um diploma de formação superior. Para algumas empresas, o título comprovado por diploma já significa muito pouco. Algumas das maiores empresas do mundo contratam pessoas dotadas de habilidades. Estas habilidades podem ter sido aprendidas na universidade ou até por conta própria, numa ação para autodidatas, por exemplo.

Os especialistas falam da Educação 4.0, como aquela capaz de formar pessoas com habilidades para as interações tecnológicas. Uma educação que pode gerar funcionários para a Indústria 4.0. E o que é a indústria 4.0? É a indústria que está vivendo a chamada Quarta Revolução Industrial. O segmento fabril que se utiliza de recursos da Inteligência Artificial ou da Internet das Coisas, para ressignificar seu processo fabril. A educação 4.0 é a voltada para formar pessoas para viverem em uma sociedade tão imersa nas inovações tecnológicas que seria impossível conseguir postos de trabalhos sem o mínimo de traquejo com esta nova realidade. Mas todas as profissões sofrerão danos com este movimento da Educação 4.0?

Algumas profissões, segundo estudos recentes, já são totalmente substituíveis pela tecnologia. Recentemente publicou-se que cursos como Administração e Ciências Contábeis, por exemplo, já poderiam ser totalmente substituídos pelo desenvolvimento tecnológico. E não é difícil imaginar isso. É claro que existem profissionais que podem se reinventar e dificultar que a Inteligência Artificial consiga facilmente substituí-lo. Mas tenha certeza: é só uma questão de tempo.

A grande aposta para o futuro é que as crianças aprendam e cultivem desde cedo a capacidade de resolver problemas. Se a criança cresce num ambiente onde é obrigada a conviver resolvendo problemas, dificilmente chegará ao mercado de trabalho sem esta capacidade tão importante nos dias atuais.

A próxima geração a chegar ao mercado de trabalho deve ser formada dentro da perspectiva da Educação 4.0, pois os postos de trabalho exigirão conhecimentos e, principalmente habilidades que não virão se escola também não mudar um pouco da sua estrutura. As escolas também precisam acompanhar esta evolução. Nas próximas semanas vou voltar a tocar neste assunto.

Bom domingo a todos (as).

Stonehenge: registro da pré-história europeia

Quando o Windows XP chegou ao mercado mundial em 2001 trouxe mais do que as vantagens de software que, a exemplo de outros produtos da Microsoft revolucionavam o mundo da computação. Um papel de parede do Windows XP ajudava a popularizar a imagem de um monumento bastante curioso: o Stonehenge.

Em idiomas saxões o termo Stonehenge significa “pedra suspensa”, numa alusão ao arranjo formado por ciclos concêntricos de pedras, situadas no sul da principal ilha que forma a Grã-Bretanha, onde fica o Reino Unido. As pedras apresentam um arranjo que não deixa qualquer dúvida que representa um monumento, muito provavelmente de cunho religioso, com uma opinião quase consensual que de que era um local para realização de rituais e estudos astronômicos.

A novidade agora é que a cientista Bettina Paulsson da Universidade de Gotemburgo na Suécia concluiu que existem outras “Stonehenges” no continente europeu e que, muito provavelmente se constituem em uma verdadeira cadeia de monumentos pré-históricos que podem ter sido construídos pelos mesmos povos que habitavam a região e que, por serem caçadores-coletores eram nômades e, por onde passavam disseminavam a construção destes monumentos.

A pesquisadora, que publicou seu estudo na revista Proceedings of National Academy of Sciences, defende que as primeiras construções desta natureza foram feitas na região da Bretanha, noroeste da França, mas que apresentam registros por vários países do continente europeu como em Portugal, onde iniciou suas primeiras pesquisas sobre o assunto, passando por áreas da França e da Itália.

Megálitos de Carnac na região da Bretanha (França). Registro da pesquisadora Bettina Paulsson

Os Stonehenges reúnem pedaços enormes de rochas chamados de Megálitos, que podem apresentar até 5 metros de altura. Muitas das rochas, por vezes, não são comuns nas regiões dos monumentos, o que leva pesquisadores a imaginar que foram levadas de locais muito distantes e que, por alguma razão, foram usadas para edificar estes monumentos misteriosos.

Em alguma das regiões, são encontradas pinturas rupestres com indicativos de animais como baleias cachalotes, demonstrando que os habitantes daquelas regiões eram exímios aventureiros e andavam também por regiões litorâneas. A propósito, nas pinturas rupestres da nossa Serra da Capivara, em São Raimundo Nonato (PI) também ocorrem registros de animais que não pertencem a fauna da região: há registro de baleias e golfinhos e até de caranguejos.

Ainda existem muitas lições a serem aprendidas com os homens e mulheres que viveram na pré-história. Pelo menos é o que dizem os registros deixados em pedras.

Boa semana!!!

 

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