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Questões jurídicas relacionadas aos contratos de franquia (II)

Na semana anterior se começou a expor algumas questões relacionadas aos contratos de franquia. Disse-se que uma franquia deve gerar benefícios econômicos às duas partes contratantes. Para isso, a lei de regência (Lei Federal nº 8.955/1994) prevê a necessidade de que a parte franqueadora forneça à potencial franqueada, “no mínimo 10 (dez) dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato de franquia ou ainda do pagamento de qualquer tipo de taxa pelo franqueado ao franqueador ou a empresa ou pessoa ligada a este”, uma circular de oferta de franquia.

Esta circular tem por função a prestação de informações relevantes sobre a empresa franqueada, a fim de permitir à candidata franqueada fazer estudos econômicos para a sua implantação e, assim, decidir finalmente se lhe interessa ou não a celebração final do contrato de franquia. Dentre outros vários requisitos previstos na lei, a circular de oferta de franquia deve obrigatoriamente conter:

 

(i) balanços e demonstrações financeiras da empresa franqueadora relativos aos dois últimos exercícios; e

(ii) indicação precisa de todas as pendências judiciais em que estejam envolvidos o franqueador, as empresas controladoras e titulares de marcas, patentes e direitos autorais relativos à operação, e seus subfranqueadores, questionando especificamente o sistema da franquia ou que possam diretamente vir a impossibilitar o funcionamento da franquia; e

(iii) descrição detalhada da franquia, descrição geral do negócio e das atividades que serão desempenhadas pelo franqueado; e

(iv) requisitos quanto ao envolvimento direto do franqueado na operação e na administração do negócio; e

(v) especificações quanto ao total estimado do investimento inicial necessário à aquisição, implantação e entrada em operação da franquia, ao valor da taxa inicial de filiação ou taxa de franquia e de caução e ao valor estimado das instalações, equipamentos e do estoque inicial e suas condições de pagamento; e

(vi) informações claras e detalhadas quanto à obrigação do franqueado de adquirir quaisquer bens, serviços ou insumos necessários à implantação, operação ou administração de sua franquia, apenas de fornecedores indicados e aprovados pelo franqueador, oferecendo ao franqueado relação completa desses fornecedores.

 

O descumprimento pela parte franqueadora do dever de entregar a tempo a referida circular de oferta de franquia pode ocasionar a anulação do contrato, na hipótese de a parte franqueada demonstrar que teria sofrido prejuízos por conta do déficit de informações relevantes ao negócio quando da contratação. Nesse sentido, ilustrativo julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo:

 

CIRCULAR DE OFERTA DE FRANQUIA ENTREGUE FORA DO PRAZO PREVISTO NO ART. 4º, DA LEI Nº 8.955/94. DESCUMPRIMENTO DO DEVER DE PRESTAR INFORMAÇÕES ESSENCIAIS DA OPERAÇÃO. OCULTAÇÃO DA REAL SITUAÇÃO DA FRANQUIA. RÉ QUE NÃO SE DESINCUMBIU DE SEU ÔNUS PROBATÓRIO. ART. 373, II, DO CPC. ANULAÇÃO DO CONTRATO. DEVOLUÇÃO DE TODAS AS QUANTIAS PAGAS. A Circular de Oferta de Franquia foi efetivamente entregue pela ré ao autor fora do prazo de dez dias previsto no art. 4º, da Lei de Franchising, o que implica, em regra, na anulação do negócio, como determina o dispositivo legal (fls. 33/77, fl. 78 e fls. 79/104). Trata-se de uma cautela da legislação para evitar que o interessado seja pressionado a contratar a franquia sem avaliar adequadamente as despesas e os riscos do negócio. É certo que a anulabilidade do ajuste prevista na lei não é absoluta, devendo sempre ser demonstrado o efetivo prejuízo da parte com o descumprimento do prazo decenal pelo franqueador. Nota-se que a ré não somente descumpriu o prazo decenal legal como também outras exigências de sua responsabilidade, assim como não demonstrou a real situação de sua franquia, haja vista sua tentativa de ocultar eventual existência de desligamento ou insatisfação de outros franqueados. A ré não trouxe aos autos fatos juridicamente modificativos, suspensivos, impeditivos ou extintivos do direito do autor, nos termos do art. 373, II, do Código de Processo Civil, a exemplo de comprovação de que teria prestado todas as informações indispensáveis nos termos da Lei nº 8.955/94, transmitido o know-how ao autor e realizado os treinamentos nos termos do contrato, entre outros. Recurso não provido. (TJSP; Apelação 4010307-40.2013.8.26.0114; Relator (a): Carlos Alberto Garbi; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de São José do Rio Preto - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 13/11/2017; Data de Registro: 16/11/2017)

 

Na próxima semana se falará sobre as possíveis limitações ao exercício de atividade concorrente pela parte franqueada após o término do contrato de franquia.

 

Gabriel Rocha Furtado é Advogado e Professor de Direito Civil (UFPI e iCEV). Doutor e Mestre em Direito Civil (UERJ). Escreve para o Caderno Jurídico sempre às terças-feiras.

www.rochafurtado.com.br

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