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A “Grande demissão” alcança universidades

A pandemia de COVID19 deixou um estrago razoável nos postos de trabalho do mundo inteiro. O que foi chamado pela mídia de “a grande demissão” provocada pela crise relacionada a pandemia que tirou o emprego de 47 milhões de trabalhadores nos EUA e de 2 milhões no Reino Unido parece ter chegado ao meio acadêmico e, muito provavelmente, por uma avalanche de outros motivos que não apenas os relacionados à pandemia.

A revista Nature publicou o texto intitulado Has the “great resignation” hit Academia? (A “grande demissão” atingiu o meio acadêmico? Em tradução livre) no qual conta a história de alguns pesquisadores que abandonaram os postos de trabalho em meio a uma crise com vários indicadores como: desânimo, falta de condições de trabalho, falta de financiamento da pesquisa, baixos salários, cortes nas aposentadorias, relações tóxicas, casos de sexismo, de racismo e outras variáveis. Se quiser ver o artigo clique aqui.

O fenômeno afeta mais fortemente os pesquisadores em meio de carreira. De acordo com pesquisa realizada pela própria Nature, 37% dos pesquisadores em meio de carreira desistiram ou pensaram em desistir dos seus postos de trabalho, ou simplesmente se declararam infelizes com a carreira que levam. Um percentual significativamente maior do que os pesquisadores em início ou no final de carreira.

Alguns destes pesquisadores estão encontrando abrigo em consultorias especializadas ou mesmo mudando radicalmente de profissão, por se sentirem infelizes e sem perspectiva com o que vinham fazendo. Este fenômeno vem sendo verificado em países como EUA, Reino Unido e Australia. Na Austrália, a pandemia alterou o fluxo de estudantes oriundos de outros países, reduzindo o orçamento das instituições e obrigando a uma demissão que alcançou 20%.

A situação no Brasil e no Piauí

No Brasil a situação não é diferente e, na minha visão pessoal, está pior. Para começar a queda no financiamento da pesquisa alcançou, nos últimos 10 anos, a cifra de 84%. Isso mesmo: em valores atualizados, o governo brasileiro investe somente 1,8 bilhões de reais anuais em pesquisa, cerca de um terço do valor que será gasto para financiar a campanha política deste ano. Estes cortes atingem em cheio o financiamento, especialmente no item de formação de novos pesquisadores. Há mais de 10 anos as bolsas para formação de mestres e doutores estão estagnadas. O que já representou um valor considerável de quase 10 salários-mínimos,a bolsa de Doutorado hoje representa 2.200 reais, pouco mais de um salário-mínimo vigente (R$ 1.212). É importante ressaltar que esta queda se agravou agora, no período da pandemia, obrigando as instituições a cortarem gastos importantes, como no caso da UFPI que anunciou um racionamento de energia elétrica motivado pelos cortes orçamentários. Do mesmo modo o IFPI anuncia um corte de 5 milhões do seu orçamento, comprometendo os serviços de manutenção, pagamento de despesas básicas como água e energia, dentre outros.

O marasmo relatado na Nature está relacionado com o trato administrativo também. O pesquisador Caspar Addyman da Goldsmith University de Londres admitiu que a incompetência na gestão foi um fator preponderante para que ele abandonasse sua pesquisa e sua colocação na Universidade. Este desânimo também afeta professores das universidades locais, como a Universidade Estadual do Piauí. Na UESPI, o plano de carreira já está estagnado para alguns profissionais que não tem mais como melhorar sua situação financeira. Até hoje a gestão nunca cuidou em regulamentar o acesso ao cargo de Professor Titular presente desde que o Plano de Cargos, Carreiras e Salários foi aprovado e implementado, em 2009, pela falta de autonomia, falta de diálogo com o Governo Estadual e a falta de boa vontade também. A gestão da UESPI comemora quando consegue abrir um edital de transferência externa com quase 4 mil vagas, esquecendo que, se existem 4 mil vagas é porque antes existiram 4 mil desistentes. Não se tem notícia de qualquer iniciativa da universidade em tentar deter a evasão gigantesca presente em todos os cursos, tanto no interior quanto na Capital.

As carreiras acadêmicas, sonho de muitos profissionais, passam pelo seu pior momento. As carreiras precisam se reinventar em instituições que precisam ser melhoradas. Universidades, mesmo públicas e gratuitas, como no caso do Brasil, já não atraem como faziam em épocas pretéritas. É preciso e necessário que as IES sejam mais bem pensadas e planejadas. A pesquisa e a extensão, pilares importantes do tripé universitário, precisam ser estimuladas para que a população conheça o valor que estas instituições têm. Publicar nas redes sociais e na mídia que vai tudo lindo e maravilhoso é tentar se proteger do sol com uma placa de vidro.

Uma ótima semana para todos (as).

Darwin, o filho do darwinista

“Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”. Esta frase, atribuída ao naturalista britânico Charles Robert Darwin explica bem o sentido da vida e dos que conseguem se manter vivos, mesmo diante das adversidades. Isto acontece nas nossas barbas, queiram ou não os que negam a ciência, todos os dias.

Esta semana passamos, eu, minha família e nossos amigos, uma provação bastante pesada. Alessandro Darwin, nosso filho caçula, ao ter contato com uma substância alergênica, muito provavelmente um fruto do mar (fonte de outros episódios de alergia pelos quais ele já vivenciou), desencadeou um choque anafilático com a interrupção de sua respiração.

Ao perceber que a situação se agravara, Alessandro disparou em busca de atendimento médico. Chegou ao hall do Pronto Atendimento (PA) do Hospital Unimed Primavera (HUP) em Teresina com o nível de saturação de oxigênio em 27% (o normal é de 95%-100%). Ao chegar pediu socorro e perdeu os sentidos. A equipe do PA foi muito rápida. Realizou todos os procedimentos necessários e o Alessandro nasceu novamente, aos 25 anos de idade.

Na sua chegada foi atendido pela equipe liderada pelo Dr. Rodrigo Beserra, médico urologista, para quem tive o imenso prazer de ser seu professor no Instituto Dom Barreto (IDB). Rodrigo me relatou que nunca tinha visto tanta resistência para alguém que chegou com os sinais vitais tão arruinados, em tão curto espaço de tempo. Todo o conhecimento e esforço de médicos e da equipe de enfermagem teve também uma inspiração pra lá de divina.

Choque anafilático...

De acordo com o site https://bvsms.saude.gov.br/choque-anafilatico/, é a forma mais grave de reação de hipersensibilidade (alergia), desencadeada por diversos agentes como drogas, alimentos e contrastes radiológicos. Os sinais e sintomas podem ter início após segundos à exposição ao agente ou até uma hora depois. A avaliação e o tratamento imediatos são fundamentais para evitar a morte. As causas vão desde a picada de insetos até o uso de alimentos ou contato com objetos/substâncias que provoquem a reação.

Qualquer pessoa pode desenvolver uma reação alérgica muito forte e vir a ter problemas e até sucumbir, caso não seja atendida a contento. É preciso ter o conhecimento sobre isso e andar prevenido, com orientação médica.

Sobre o título deste post...

Sou um darwinista convicto. E quando a Ana ficou grávida do nosso filho mais novo decidimos dar ao bebê um nome que homenageasse o naturalista britânico. Pegando as palavras de Charles Darwin, Alessandro provou que quem sobrevive é de fato o mais apto. Um exemplo da força que temos e que, quando necessária, precisamos usá-la.

Estou muito feliz esta semana, porque tudo não passou de um susto! Boa semana para todos (as).

Por que sobrevivemos à Seleção Natural?

Quando nascemos, nós humanos, somos excessivamente frágeis. Somos uma das espécies que depende muito dos cuidados parentais. Estes cuidados perduram por um tempo maior, até completarmos a maturidade de conseguirmos nos deslocar sozinhos e de levar os alimentos à boca. Se não fossem os cuidados dispensados por nossos pais, dificilmente sobreviveríamos aos riscos e perigos do meio.

Esta fragilidade está relacionada ao tempo pequeno de desenvolvimento no ventre materno: só para se ter uma ideia nem as placas do nosso crânio estão completamente formadas, levando de 12 a 18 meses para fechar o que chamamos popularmente de moleira, denominada cientificamente de fontanela. Isso dentre muitas características que afetam diretamente nossa autonomia. Nossa sobrevivência enquanto espécie passou a depender dos cuidados dispensados por nossos pais para nos alimentar e nos proteger da ação de predadores e dos demais riscos naturais. Estes cuidados foram um diferencial, não somente para humanos, mas para algumas espécies de mamíferos e muitas espécies de aves, que dependem dos alimentos trazidos pelos pais e da proteção conferida pelo ninho. São frutos da nossa inteligência e que permitiram nossa passagem pelo crivo da seleção natural.

Esta capacidade de cuidar não surgiu de modo instantâneo. Certamente foi algo aprendido e repassado de geração em geração, ao ponto de ter permitido nossa perpetuação. A não recorrência dos processos teria resultado em perdas consideráveis, alterando o fluxo normal da espécie e sua sobrevivência.

Esta semana resolvi escrever sobre isso para nos lembrar o quanto cuidar é tão relevante para nós, humanos. Que foi a chave para chegarmos aonde chegamos em termos de sobrevivência. Fui tocado pela matéria da jornalista Paula Monize, do Portal Cidadeverde.com que mostrou a história de um pai que ajuda o filho cadeirante na difícil missão de supervisionar o censo do IBGE na cidade de Picos (PI), nos mostrando o significado da palavra CUIDAR. Reveja a matéria aqui.

Cuidar é, sobretudo, um ato de amor!

Boa semana para todos (as).

Varíola dos macacos: uma nova epidemia?

Ainda nem saímos de um pesadelo chamado COVID19 e um novo elemento do mundo das viroses surge no horizonte: a varíola dos macacos. Ao ouvir a palavra Varíola, qualquer estudante do Ensino Médio sabe que falamos de uma doença infecciosa viral que assolou o mundo, mas foi considerada uma das primeiras doenças a ser eliminada do Planeta graças à efetiva ação científica de produzir vacinas e usá-las em escala mundial promovendo o fim deste mal que assombrou o mundo.

Particulas do vírus da Varíola do Macaco. Fonte: Science.

A varíola foi uma doença muito temida ao longo do século XX. Maltratava bastante os pacientes e matou cerca de 300 milhões de pessoas, mais do que todos os mortos juntos de todas as grandes guerras do mesmo século. A varíola era causada pelo Orthopoxvirus variolae, e foi considerada extinta pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 08 de maio de 1980, graças ao esforço das autoridades em saúde de promover campanhas bem exitosas de vacinação. Pesquisas apontam que a doença não foi devastadora apenas no século XX. Há relatos históricos de que populações inteiras de indígenas Astecas, no México, tenham sido dizimadas pela contaminação trazida pelos espanhóis durante o processo de colonização da Mesoamérica.

A novidade agora é um vírus da mesma família do Vírus da Varíola só que típico dos macacos. Sua primeira aparição foi na década de 1950. Muito provavelmente o vírus original sofreu uma mutação e passou a contaminar pessoas. De acordo com matéria publicada na Revista Science da semana passada, mais de 2000 casos já foram relatados, de maio para cá, em 30 países onde o vírus não é endêmico. A transmissão ocorre por contato com pessoas contaminadas, gotículas de saliva e contato com animais que portem o vírus (apesar do nome, o vírus também infecta roedores).

A mesma matéria traz os resultados de um estudo executado por pesquisadores da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres (LSHTM) de que a forte presença da doença em países nos quais o vírus não é endêmico seja motivada pela entrada do vírus em redes sexuais de homens que fazem sexo com homens (HSH). Um estudo conduzido pela Agência de Segurança em Saúde do Reino Unido (UKHSA) com pacientes da Varíola do Macaco apontou que dos 152 pesquisados, 151 se declararam HSH, o que reforçou a preocupação das autoridades epidemiológicas sobre o tema.

A Varíola do Macaco pode reviver o triste episódio que relacionou a AIDS com um comportamento sexual fortalecendo o preconceito e a estigmatização de pessoas que já sofriam de uma doença gravíssima e precisavam conviver com o preconceito. Estamos diante de um novo desafio que precisa ser enfrentado com inteligência e os cuidados devidos, para que não se transforme em um novo problema de saúde pública mundial.

A COVID19 já nos deixou esgotados. Não precisamos de outra mazela.

Boa semana para todos (as).

“Não há razão para surtar”

Com esta frase o imunologista John Moore da Weill Cornell Medicine esclareceu o efeito da chegada de novas variantes da Ômicron na África do Sul e o surgimento de novas cepas do vírus nos EUA com grande poder de espalhamento nas populações, mas sem uma ameaça maior no aumento do número de mortes nestes locais.

As novas variantes BA.4 e BA.5 e uma subvariante da cepa BA.2 são ameaças às populações e preocupa os pesquisadores ao ponto de que alguns cuidados sejam retomados. Estas novas variantes e as que se posicionam como mesclas das variantes mais importantes trazem, do inconsciente para consciente dos médicos e pesquisadores, a possibilidade de uma nova leva de doentes que remetam ao cenário que levou o mundo todo a fechar suas portas, sob a ameaça iminente de faltarem leitos e subsídios para salvar vidas, como aconteceu no início da pandemia em 2020, com picos de retorno ao longo dos meses até aqui.

Os prejuízos já são incalculáveis. Não somente os que foram fruto do fechamento de empreendimentos, mas o abalo nos diferentes segmentos da economia mundial e, principalmente, o prejuízo a uma geração que estava na escola e teve seu processo de aprendizagem prejudicado pela abrupta interrupção do cotidiano.

A diferença grande é que agora existem imunizantes com certo grau de eficiência que, se não barram totalmente o efeito do vírus (dificilmente impediriam a contaminação mesmo), já conseguem deixar o paciente com mais defesas, permitindo que a doença se manifeste de modo bem leve. Ainda existem muitos desafios a serem vencidos, mas a ciência tem dado provas irrefutáveis de que pode combater o inimigo com armas promissoras e eficientes.

Boa semana para todos (as).

 

Etnoconhecimento

Desde a semana passada o Brasil vem acompanhando os desdobramentos do desaparecimento de um servidor da FUNAI e de um jornalista estrangeiro que se deslocavam entre dois pontos na Amazônia e sumiram, ainda sem quaisquer vestígios sobre seus paradeiros, mas com forte desconfiança de que foram mortos, pois o indigenista já havia sido ameaçado por pessoas que exploram ilegalmente recursos na Amazônia.

O problema me despertou o interesse em escrever um pouco sobre as perdas de conhecimento das quais somos vítimas desde que o mundo é mundo, exatamente pelo desprezo que determinadas pessoas dispensam aos povos tradicionais e, consequentemente, a aspectos de sua cultura e do seu conhecimento. Aliás, chamamos de Etnoconhecimento, o conhecimento originado a partir de povos indígenas, quilombolas e outros agrupamentos que geraram, ao longo de décadas seu próprio conhecimento, muitas vezes com base nas premissas de tentativa e erro, responsável por uma coleção de saberes que, quando aproveitados, podem revolucionar diferentes áreas do conhecimento produzido pela cultura do chamado “Homem Branco”. Na verdade, questões históricas explicam a nossa colonização por parte de povos europeus, notadamente com forte influência dos advindos da Península Ibérica, que, basicamente, atuaram na colonização dos países das Américas, principalmente a do Sul, a Central e parte da América do Norte.

Nossos ancestrais europeus chegaram aqui e não tomaram conhecimento dos povos que aqui viviam. Com a dificuldade de “domesticar” estes povos e, com a finalidade de buscar força de trabalho, arrancaram a força do continente africano pessoas que vieram compor uma força de trabalho totalmente escrava. Os nativos daqui e dos países africanos de onde vieram os escravos em mais de 300 anos de exploração, compuseram um conjunto imensurável de conhecimentos, muitos dos quais perdidos, inclusive pela imposição cultural dos europeus colonizadores.

Parte deste Etnoconhecimento vem sendo resgatado pela ação de pesquisadores. Aqui no Piauí, concentra-se no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA), da Universidade Federal do Piauí (UFPI), o resgate de informações, especialmente nos campos da Etnobotânica e da Etnozoologia, enlevando informações que poderiam estar mais presentes na nossa cultura atual, se não fosse a ação colonizadora que dizimou povos, subestimou culturas e enterrou parte do conhecimento de forma definitiva, uma vez que não existem registros escritos.

Recentemente li na revista Science que, na América Central, especialmente na Guatemala, cientistas se debatem com informações sobre a Astronomia deixada como legado pelos Maias, povos pré-históricos que dominaram a América Central e o sul da América do Norte, e que foram dizimados também pelos colonizadores espanhóis. Mas o legado deixado, de forma escrita, levantado por provas arqueológicas, está ajudando a construir uma parte do conhecimento alcançado por esta cultura milenar, cujo calendário diferia um pouco do Calendário Juliano (adotado até hoje), pois lidava com 13 ciclos de 20 dias, totalizando um ano com 260 dias. Astrônomos da atualidade, utilizam os registros deixados pelos Maias, especialmente na observação de eventos que envolvem astros e que estão sendo resgatados pelos investigadores do etnoconhecimento.

A luta em favor dos povos tradicionais não é apenas uma questão de Direitos Humanos. Passa também pelo respeito a uma cultura que traz uma sabedoria milenar, não escudada no método científico, mas com base em observações, acertos e erros, registrado de forma pobre, porém estabelecido através da comunicação oral entre gerações.

Uma boa semana para todos (as).

Teve COVID moderada? Saiba que ainda pode estar com o vírus...

A Covid-19 é uma doença realmente muito estranha, e tem desafiado médicos, cientistas, que lidam com as surpresas e novidades de um agente patogênico com modus operandi diverso e, principalmente pacientes, que podem ter sintomas diferentes para uma mesma doença, sui generis.

A minha experiência com a COVID foi assim: depois de tomar duas doses e um reforço da vacina da Pfizer, tive um quadro de COVID bem leve. Muita congestão nasal, derramando litros de coriza, uma dor de cabeça leve. No primeiro dia dos sintomas tive febre e dores no corpo. Fiquei cinco dias me sentindo doente, mas nada que merecesse uma preocupação maior. Finalizado o período de isolamento, desenvolvi uma infecção intestinal que durou meses. Falei com o médico que me disse que tinha atendido pacientes com o mesmo quadro. Me recomendou um medicamento para regularizar o trânsito intestinal, que vem ajudando bastante nisso.

Para meu espanto, acabei de ler um artigo disponível na National Library of Medicine, com o título “Gastrointestinal symptoms and fecal shedding of SARS-CoV-2 RNA suggest prolonged gastrointestinal infection” (Sintomas gastrointestinais e eliminação fecal de RNA SARS-CoV-2 sugerem infecção gastrointestinal prolongada, em tradução livre). Neste trabalho os pesquisadores analisaram material biológico de 113 pacientes que tiveram COVID-19 moderada e descobriram que 12,7% dos pacientes continuavam expelindo RNA viral do SARS-CoV2 quatro meses após terem sido considerados curados por não testarem positivo nos exames com amostras orofaríngeas, e cerca de 3,8% permaneciam expelindo o RNA viral pelos intestinos, sete meses após a doença.

Com estes resultados concluiu-se que a doença, nestas cepas mais brandas, de fato é sistêmica e continua no organismo, mesmo depois que a infecção no trato respiratório desaparece, e que há a possibilidade de que seja transmitida por resíduos fecais, o que reforça a necessidade de cuidados higiênicos, sobretudo após fazer uso dos banheiros e, ainda, de que se trata realmente de uma doença muito estranha.

Boa semana para todos (as)!

Qual será o fim da ciência brasileira?

A revista Science da semana passada traz uma matéria sobre as dificuldades enfrentadas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE. O Instituto foi criado em 1961 instalado na cidade de São José dos Campos, interior de São Paulo e é considerado o maior instituto de pesquisas espaciais da América Latina.

Responsável pelo monitoramento do Clima e das queimadas na Amazônia, entre outras diversas funções, o INPE vem passando por sucessivos cortes orçamentários que podem comprometer seu funcionamento e a execução destas e de outras imprescindíveis funções, que inclusive subsidiam outros ramos da ciência brasileira.

Além das restrições financeiras que sofre de forma contínua desde o Governo Dilma Roussef, o INPE e seus pesquisadores sofrem ataques de membros do Governo Jair Bolsonaro que, para justificar as ações inócuas de combate aos crimes ambientais, especialmente na região amazônica, desqualificam as pesquisas realizadas pelo órgão.

Pego o exemplo do INPE para ressaltar os danos provocados pela falta de incentivo à ciência no Brasil de uma maneira geral. Cortes orçamentários profundos reduziram a possibilidade de financiamento de projetos de pesquisa e restringiram a distribuição de bolsas em programas de pós-graduação, sem esquecer que bolsas de Mestrado e Doutorado não passam por qualquer reajuste há mais de uma década. O que era ruim só piora.

Enquanto isso, políticos de praticamente todas as agremiações partidárias, apoiam o bilionário fundo de quase 5 bilhões de reais a ser gasto na próxima eleição. Não há inocentes neste crime. Nem de um lado e nem do outro, dos polos que dividem a preferência do eleitorado.

Não vejo saída e nem a famosa luz no fim do túnel. O túnel já está escuro na entrada.

Boa semana para todos (as).

Criador do Bob Esponja é homenageado por Pesquisador do Piauí

Na ciência ocorrem umas coisas muito interessantes, que em nenhuma outra área do conhecimento é possível acontecer. A história que lhes conto hoje é sobre a descoberta de uma nova espécie de animal. Um tipo de esponja que ocorre no Oceano Atlântico, no litoral da Paraíba: Clathria (Axosuberites) hillenburgi.

Clathria (Axosuberites) hillenburgi. Fonte: Annunziata et al. (2019).

Para quem não sabe, as esponjas são animais bastante primitivos encontrados principalmente no ambiente marinho (mas existem espécies de água doce também). Estes animais são sésseis (ou seja: não saem nadando por aí, ficando presos a um substrato) e tem uma especialidade interessante: filtrar a água, de onde conseguem reter partículas que lhes servem de alimento.

Dr. Bruno Annunziata. Fonte: arquivo Pessoal.

O pesquisador Bruno Barcellos Annunziata, carioca de nascimento, mas piauiense de coração, Professor Adjunto II da Universidade Estadual do Piauí, lotado no curso de Ciências Biológicas do Campus (CIES) de Parnaíba, resolveu estudar as esponjas que ocorrem no litoral do Piauí e do Maranhão. Durante o desenvolvimento de sua tese de Doutorado, na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), além de ter coletado novos exemplares para coleção, tratou de estudar espécies das suas coletas e outras que já haviam sido coletadas e que estavam guardadas no laboratório da UFPE.

Detalhes em microscopia eletrênica da nova espécie. Fonte: Annunziata et al. (2019).

Nas suas pesquisas Bruno se deparou com duas novas espécies. Uma coletada no litoral do Maranhão e outra coletada no litoral da Paraíba. Uma explicação: neste caso o pesquisador verifica todas as características do exemplar e compara com tudo o que já foi estudado e publicado sobre aquele grupo. Daí conclui que está lidando com algo totalmente novo para ciência. Isto o habilita a determinar que está diante de uma nova espécie. Ele então fez todos os estudos e partiu para publicar sobre as novas espécies. O artigo intitulado “Two new Clathria (Axosuberites) Topsent, 1893 (Demospongiae: Poecilosclerida) from Northeastern Brazil” traz a descrição das duas novas espécies e foi publicado na revista neozelandesa Zootaxa, uma das melhores do mundo para publicações relativas a novas descobertas de animais.

Foto: Nickelodeon/Divulgacao

Antes de publicar o artigo encontrei com o Bruno e ele me falou da ideia de homenagear o biólogo marinho Stephen Hillemburg, criador do Bob Esponja, morto em 2018 vítima de uma doença neurodegenerativa aos 57 anos. Achei formidável a ideia, já que Hillemburg fez o caminho inverso: transformou suas pesquisas em um desenho adorado por fãs do mundo inteiro.

Stephen Hillengurg. Fonte: wikipedia.

Bruno também descreveu outra espécie – a Clathria (Axosuberites) aurantia, um belo exemplar de cor alaranjada, encontrado nas costas do Maranhão, nas proximidades de Tutoia.

Clathria (Axosuberitesaurantia. Fonte: Annunziata et al. 2019.

Bruno Annunziata é mais um pesquisador radicado no Piauí que faz ciência, mesmo diante de todas as dificuldades de condições de trabalho.

Boa semana para todos (as).

 

Educação domiciliar

Esta semana o assunto do momento é tramitação no Congresso Nacional em regime de urgência da regulamentação da educação Domiciliar ou Homeschooling. Mas qual é o problema de regulamentar que crianças possam ser educadas pelas famílias? Acredite: tem muito problema nisso.

Sou de uma geração que aprendeu muito a valorizar a escola. Sou de uma família de professores e fiz da educação a minha profissão. A escola, para mim, é um dos lugares mais ricos em experiências. É uma janela de oportunidades. É onde descobrimos muita coisa legal e por onde passamos por experiências desafiadoras. É lugar também para se conhecer o que é bom e o que é ruim. Mas é um verdadeiro ensaio para o mundo como ele realmente é.

Na escola, por mais deficiente que seja, há um plano voltado para organização do aprendizado. Profissionais que se formaram com o objetivo de ensinar. Fico pensando que a ideia de se ensinar a criança fora da escola deve vir de pessoas que são potências em termos de conhecimento e habilidades na arte de ensinar. Mas conhecendo a realidade educacional brasileira acho que não é bem assim. Fico pensando: na minha casa meu pai era professor de Matemática e minha mãe de História. Poderia ter tido uma ótima educação domiciliar porque vivia num ambiente bem favorável. Mas essa não é a realidade da grande maioria dos brasileiros.

Imagine que o Congresso dê a louca e aprove isso, sem discutir (porque é o que proporciona o tal “regime de urgência”). De acordo com o IBGE, apenas 12% da população brasileira é considerada proficiente em conhecimentos gerais. Teremos aí um séquito de crianças que não tem como mudar sua realidade porque estão aprendendo com as pessoas erradas. Por mais que se diga que pode ser melhor, corroborando as palavras da atual presidente do Conselho Nacional de Educação: “a escola é insubstituível”.

Torço para que o bom senso impere nesta questão. A escola é o lugar onde as pessoas podem mudar sua vida.

Até o próximo post...

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