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MINERAÇÃO: os títulos minerários como garantia real

Por Gabriel Furtado e Mariana Salha

Em 2 de março de 2022, entrou em vigor a Resolução da Agência Nacional de Mineração (ANM) nº 90, de 21 de dezembro de 2021[1], que estabeleceu as hipóteses de oferecimento de direitos minerários como garantia em operações de captação de recursos para o financiamento da mineração. A medida regulamentou os arts. 43 e 44 do Decreto Federal nº 9.406/2018[2], incluindo a possibilidade de oferecer títulos minerários como garantia, uma inovação trazida pela reforma do Regulamento do Código de Mineração (RCM). O decreto abriu espaço para o oferecimento da concessão de lavra para fins de financiamento, deixando para as resoluções da ANM a definição das hipóteses para esse exercício.

Diante disso, a resolução da ANM definiu que a concessão de lavra e o manifesto de mina podem ser oferecidos por seus respectivos titulares como garantias em operações de financiamento. Como mencionado no último texto sobre títulos minerários na coluna[3], a concessão de lavra é o ápice do processo mineral, conferindo ao minerador o direito de explorar e aproveitar o bem mineral após cumprir todas as etapas necessárias. Por outro lado, o manifesto de mina representa a propriedade de uma jazida reconhecida sob a legislação mineral. Essa garantia abrange operações de captação de recursos para o financiamento de empreendimentos minerários em suas diversas modalidades, incluindo operações de crédito pelo sistema financeiro nacional e outras operações estruturadas de financiamento de projetos.

A amplitude dos procedimentos previstos na norma, entretanto, fica restrita às operações relacionadas diretamente aos empreendimentos minerários, como instalação, expansão ou regularização. A resolução não abrange situações em que os direitos minerários são utilizados para garantir projetos ou operações de natureza distinta da mineração. Essa delimitação levanta questões sobre a flexibilidade da aplicação desses mecanismos em contextos mais amplos.[4]

Embora a resolução não especifique a forma da garantia sobre os direitos minerários, ela oferece liberdade aos agentes de mercado para escolherem o instrumento mais adequado, como contrato de penhor ou alienação fiduciária[5]. Contudo, é necessário atentar para os requisitos legais de cada forma de garantia escolhida, garantindo sua eficácia e conformidade com a legislação vigente.

Ademais, o artigo 5º da resolução estabelece mecanismos de proteção ao credor durante o período entre a constituição da garantia e sua baixa. Destaca-se o inciso VI[6], que permite à instituição financiadora realizar atos para evitar a perda do direito minerário dado em garantia. Essa disposição é crucial para proteger os interesses do credor e garantir a efetividade da garantia.

A possibilidade do uso dos títulos minerários como garantia se revela como um impulso significativo para os pequenos e médios mineradores, que muitas vezes enfrentam dificuldades para obter financiamento. Ao possibilitar a utilização dos direitos minerários como garantia real, a resolução abre novas oportunidades de acesso a recursos financeiros.

Nesse contexto, a resolução da ANM inova ao agregar liberalidades tanto para o devedor quanto para o credor, possibilitando intervenções excepcionais visando a preservação dos direitos minerários oferecidos como garantia. Além disso, permite a disposição do bem dado em garantia, como o contrato de arrendamento, desde que com a anuência do credor, ampliando as possibilidades de uso desses direitos.

Tal resolução representa um avanço significativo para o setor minerário, promovendo o acesso a recursos financeiros e incentivando investimentos em uma atividade estratégica para o desenvolvimento econômico do país. A resolução da ANM abre caminho para uma maior segurança jurídica e para a expansão das operações no mercado de mineração.

 

Fontes:

https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/25406081/do1-2018-06-13-decreto-n-9-406-de-12-de-junho-de-2018-2540592

https://in.gov.br/en/web/dou/-/resolucao-anm-n-90-de-22-de-dezembro-de-2021-370065123

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm

https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/11889/3/Radar_n72_Art1_Direitos_minerarios.pdf

 


[1] BRASIL. Resolução ANM no 90, de 22 de dezembro de 2021. Regulamenta os arts. 43 e 44 do Decreto no 9.406, de 12 de junho de 2018, estabelecendo as hipóteses de oferecimento de direitos minerários como garantia em operações de captação de recursos para o financiamento da mineração, bem como os requisitos e condições para que ocorra a transferência da titularidade de tais direitos. Diário Oficial da União, Brasília, v. 242, p. 194, 24 dez. 2021. Seção 1. Disponível em: . Acesso em: 7 nov. 2022.

[2] Art. 43. A concessão da lavra poderá ser oferecida em garantia para fins de financiamento.
   Art. 44. A ANM estabelecerá em Resolução as hipóteses de oneração de direitos minerários e os requisitos e os procedimentos para a averbação de cessões, transferências e onerações de direitos minerários.

[3] https://cidadeverde.com/cadernojuridico/125592/minerios-desafios-e-perspectivas-para-a-regularizacao-da-atividade-mineraria

[4] SOUZA, P. A.; HERRMAN, H. Avaliação econômica dos direitos minerários. Avulso n. 4. Brasília: DNPM, 1980.

[5] VALE, E. Fluxo de fundos para exploração mineral: relatório de pesquisa. Ipea, dez. 2021. 66 p

[6] VI - admite-se a prática, em caráter excepcional, pela instituição financiadora, de atos processuais que visem a evitar o perecimento do direito minerário dado em garantia.

STARTUPS: Contrato de Investimento conversível em Capital Social

Por Gabriel Furtado e Lara Kronenberger

No último dia 05.03.2024, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal aprovou o Projeto de Lei Complementar nº 252/2023, que visa alterar o Marco Legal das Startups - Lei Complementar n° 182, de 1° de junho de 2021 - para dispor sobre o Contrato de Investimento conversível em Capital Social (CICC). A matéria tramita em regime de urgência e, caso seja aprovada, seguirá para análise da Câmara dos Deputados.
Objetivando facilitar o investimento em startups no Brasil, o Projeto de Lei Complementar n° 252, de 2023, busca adaptar a atual legislação às mudanças e necessidades específicas do ecossistema empreendedor, reconhecendo a importância da flexibilidade para o crescimento e competitividade das startups. Para isso, propõe a instituição do Contrato de Investimento conversível em Capital Social (CICC), uma nova modalidade contratual sugerida como mais adequada para fomentar os investimentos em startups em estágios iniciais.
Atualmente, o instrumento contratual mais utilizado na prática brasileira para o financiamento de startups emergentes é o mútuo conversível, previsto no art. 5º, §1º, IV, do Marco Legal das Startups. Nessa modalidade, o investidor concede um aporte financeiro à startup sob a condição de devolução dessa quantia em data de vencimento estipulada no contrato. Em um momento predeterminado e/ou sob condições específicas, existe a possibilidade de conversão do empréstimo em participação acionária na empresa, transformando o investidor em sócio. Logo, o mútuo conversível se qualifica por sua estrutura híbrida, haja vista que constitui a startup como devedora de um crédito (empréstimo) ao mesmo tempo que injeta um capital inicial para a expansão de suas operações (investimento).
No entanto, pelo fato de o contrato de mútuo conversível ser, por definição, uma forma de dívida que a startup contrai com o investidor, cria-se uma pressão financeira para que o reembolso da quantia emprestada se efetive na data estabelecida como vencimento, mesmo que a empresa ainda não tenha atingido o sucesso esperado. Desse modo, esses investimentos acabam sendo distorcidos, pois levam a startup a tomar decisões que priorizam o pagamento do empréstimo em detrimento do crescimento sustentável do negócio. Em consequência disso, a efetiva conversão do investimento em participação societária, que deveria ser o principal objetivo tanto do empreendedor quanto do investidor, é colocada em segundo plano.
Existe ainda o obstáculo das implicações tributárias complexas para ambas as partes envolvidas. Quando na conversão do mútuo em participação societária o investidor sofre um ganho de capital ou quando a startup enfrenta prejuízos e não consegue honrar o mútuo, as regras tributárias sobre as alíquotas aplicáveis em cada caso, bem como as suas formas de declaração para efeitos fiscais, são incertas. As ambiguidades fiscais geradas pela maneira como os prejuízos e os ganhos são tratados em relação ao mútuo e à participação societária, ocasionam uma verdadeira insegurança jurídica que afasta o investimento tão necessário na fase inicial das startups.
Considerando esse impasse, o Projeto de Lei Complementar nº 252/2023 propõe o Contrato de Investimento conversível em Capital Social (CICC). Nele, o investidor - que pode ser pessoa física, jurídica ou fundo de investimento - transfere, assim como no contrato de mútuo, recursos conversíveis em capital social à startup. Porém, o CICC inova ao afastar expressamente a natureza de dívida desse investimento, descaracterizando a figura imediata de credor (investidor) e devedor (startup).
Ao constituir a necessidade de ausência de expectativa do investidor em reaver a quantia investida somada a ausência de obrigação por parte da startup em reembolsá-lo, o CICC se distancia de um empréstimo tradicional e permite que a empresa impulsione seu crescimento e desenvolvimento, sem a pressão de um pagamento futuro. A conversão do investimento em participação societária é colocada em destaque como a principal razão dessa modalidade de investimento, o que fortalece a estrutura de capital da startup e atrai mais investidores parceiros.
Por fim, o projeto de lei complementar em questão também propõe a simplificação tributária. O Contrato de Investimento conversível em Capital Social possui tratamento fiscal definido e seguro, o que beneficia todas as partes interessadas e fortalece o ecossistema de inovação do Brasil como um todo.
Em suma, conclui-se que o CICC surge como uma alternativa que elimina a natureza de dívida do investimento, presente no contrato de mútuo conversível, e prioriza a construção de um objetivo comum entre o investidor e a startup: o crescimento e fortalecimento da inovação desenvolvida. Com essa mudança de foco, a expectativa do Projeto de Lei Complementar nº 252/2023 é de que, caso seja aprovado, as startups consigam direcionar seus esforços para o crescimento sustentável do negócio, sem a pressão de reembolsos imediatos, enquanto atrai investidores interessados em contribuir de forma efetiva para o desenvolvimento das empresas emergentes. Além disso, a simplificação tributária característica do Contrato de Investimento conversível em Capital Social permitirá a maior clareza e segurança jurídica para todas as partes envolvidas, promovendo um ambiente mais propício ao investimento e fortalecendo o ecossistema de inovação do país.
 
FONTES:
1. https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/161361
2. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp182.htm
3. https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/04/03/aprovada-urgencia-para-novo-marco-legal-das-startups#:~:text=Ser%C3%A1%20analisado%20em%20regime%20de,feira%20(3)%20em%20Plen%C3%A1rio

Parcerias Público-Privadas (PPPs) e Concessões: desafios e melhorias no setor de transporte e logística

Por Gabriel Furtado e Victória Emannuelle

As Concessões Comuns de Serviços Públicos e as Parcerias Público-Privadas (PPPs) representam formas de contrato administrativo que podem ser utilizadas pela Administração Pública visando à delegação de serviços públicos ou à aquisição de serviços/utilidades. A aplicação dessas modalidades contratuais está condicionada ao cumprimento dos requisitos legais,[1] tendo como norte o interesse público.

Essas parcerias constituem um meio atrativo de financiamento privado e transferência de riscos ao parceiro privado, proporcionando um ambiente propício para o desenvolvimento de projetos de transporte e logística, vinculada a altos níveis de desempenho, pois o parceiro privado, ao assumir riscos significativos, tem a motivação para buscar novas soluções e tecnologias de forma a agregar valor e aumentar a eficiência do projeto, alinhado ao interesse das partes.

Por essa razão, elas constituem uma das principais modalidades contratuais para custear os elevados projetos no setor de transporte e logística. Contudo, a estruturação das Concessões e PPPs, demanda uma cadeia de atos complexos, tanto na fase interna do processo licitatório como na fase externa, a fim de garantir a viabilidade técnica, econômico-financeira e jurídica do empreendimento. A complexidade envolvida nessas parcerias, aliada à dimensão dos projetos, resulta em um número considerável de PPPs e concessões canceladas após a deflagração do procedimento, principalmente devido a problemas de gestão contratual.

A fim de superar os entraves citados e atrair parcerias privadas para o setor de transporte e logística, algumas medidas utilizadas no procedimento licitatório se revelam bastante eficazes e garantem maior probabilidade de ao final obter uma licitação exitosa, geralmente atreladas a uma adequada gestão contratual somada ao desenvolvimento de uma matriz de alocação de riscos atrativa[2].

Dada a generalidade na legislação atual, é necessário o detalhamento em resoluções e contratos da mecânica do compartilhamento de riscos trabalhistas, sociais, fiscais, contábeis, ambientais, econômicos e financeiros, de modo a garantir segurança jurídica e facilitar a atração de investidores.

É crucial ainda o desenvolvimento de uma matriz de alocação de riscos à autoridade contratante e ao parceiro privado, com uma delimitação das responsabilidades financeiras, operacionais e estratégicas durante toda a vigência do contrato e do ciclo de vida útil dos ativos.

Na modalidade de concessão comum, os riscos ordinários são assumidos pelo concessionário, conforme estabelecido no artigo 2º, II, da Lei Federal nº 8.987/95, enquanto os riscos extraordinários, provenientes de eventos imprevisíveis ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis, são de responsabilidade do Poder Concedente. Já nas Parcerias Público-Privadas, não há uma divisão abstrata dos riscos; a legislação exige uma distribuição objetiva, que deve ser previamente definida no contrato, conforme estipulado nos artigos 4º, VI, e 5º, III, da Lei Federal nº 11.079/2004. Portanto, torna-se evidente a importância de estabelecer claramente essa questão no instrumento contratual.

Em suma, as Concessões Comuns de Serviços Públicos e as Parcerias Público-Privadas (PPPs) representam alternativas cruciais para o financiamento e a gestão de projetos no setor de transporte e logística no Brasil – por conta, especialmente dos seus elevados custos e da capacidade limitada de investimento do Poder Público. No entanto, desafios como a complexidade na estruturação dessas modalidades contratuais e a falta de confiança do setor privado precisam ser superados, a fim de propiciar o crescimento seguro e eficaz do setor.


[1] Principais leis sobre o tema: Lei Federal nº 8.987/95 (Lei Geral de Concessões), Lei Federal nº 9.074/95, Lei Federal nº 11.079/2004 (Lei Geral de PPP), Lei Federal nº 14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos).

[2] O art. 6º, XXVII, da Lei Federal nº 14.133/2021 estabelece que matriz de riscos trata-se da cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre as partes e caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos supervenientes à contratação (...)

ENERGIA: Aprovação do Projeto dos “Combustíveis do Futuro” pela Câmara dos Deputados (PL 528-A/2020)

Por Gabriel Furtado e Luís Guilherme Tavares

No dia 13 de março de 2024 a Câmara dos Deputados aprovou a redação final do Projeto de Lei nº 528-A de 2020, referenciado como “Projeto dos Combustíveis do Futuro”, que surge com o objetivo de promover a mobilidade sustentável de baixo carbono e a captura e estocagem de carbono, incentivando práticas mais ambientalmente sustentáveis, especialmente na redução de emissão de gases poluentes, de modo a alinhar o Brasil com os compromissos internacional de combate às mudanças climáticas.[1][2]

Com estes fins, o PL 528-A/2020, que incorporou alterações oriundas de diversos PLs[3], instituiu o Programa Nacional de Combustível Sustentável da Aviação (ProBioQAV), o Programa Nacional de Diesel Verde (PNDV) e o Programa Nacional de Descarbonização do Produtor e Importador de Gás Natural e de Incentivo ao Biometano. Além disso, a legislação inova ao propor alterações nos limites da mistura de Etanol anidro à Gasolina e de Biodiesel ao Diesel, e na regulamentação de atividades de captura e estocagem de carbono.

Sobre o Programa Nacional de Combustível Sustentável da Aviação (ProBioQAV) e o Programa Nacional de Diesel Verde (PNDV), disciplinados nos arts. 7º e 8º do Projeto de Lei, estabelecem incentivos à produção e utilização de combustíveis mais sustentáveis na aviação e no setor de transporte rodoviário, respectivamente. Assim, incluem a promoção de biocombustíveis como o Biodiesel, Diesel Verde e o SAF (combustível sustentável da aviação), todos capazes de reduzir os impactos ambientais causados pelos combustíveis fósseis tradicionais.

Com os mesmos objetivos, o Programa Nacional de Descarbonização do Produtor e Importador de Gás Natural e de Incentivo ao Biometano, cujos mecanismos estão detalhados nos arts. 15 e 16 do PL, destaca a importância da pesquisa, produção, comercialização e uso do Biometano e do Biogás na matriz energética brasileira.

Uma das medidas com maior repercussão econômica e interesse de diversos setores comerciais foi a alteração dos limites mínimos e máximos da margem de mistura de Etanol à Gasolina, que passará de 22% a 27%, podendo chegar a 35%, incremento significativo e cujas repercussões no preço do combustível foram um dos principais pontos de debate para aprovação deste Projeto de Lei.[4]

Por fim, o PL 528-A/2020 também se empenha em disciplinar as atividades de captura e estocagem geológica de dióxido de carbono (CCS) em seus arts. 21 e 30, fixando algumas diretrizes, métodos e técnicas que levem em consideração as particularidades locais e da indústria nessa atividade, cuja responsabilidade regulatória será da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Esse ponto inclusive foi objeto de certa resistência ante os riscos envolvidos na atividade e indagações sobre a sustentabilidade dessa atividade, desafios que serão enfrentados pelo regulamento específico da ANP, que deverá abordar desde aa qualificação das empresas que atuarão na área até a garantia do monitoramento da efetividade da medida.

Agora o texto segue para análise do Senado Federal e, se aprovado, necessitará de regulamentação complementar em alguns dos Programas mencionados, a ser objeto de esforço coordenado com as agencias envolvidas, especialmente a ANP e o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

Contudo, essas etapas pendentes não retiram do PL 528-A/2020 os méritos de demonstrar o propósito do Brasil de promover uma transição energética voltada à descarbonização da economia, promovendo mobilidade sustentável, uso de biocombustíveis, captura de carbono e modernizando a legislação energética de uma economia verde.

 


[3] No caso, os PL’s apensados 3.314/2021, 4.196/2023, 4.516/2023, e 5.216/2023.

[4] Art. 32. O art. 9º da Lei nº 8.723, de 28 de outubro de 1993, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 9º É fixado em 27% (vinte e sete por cento) o percentual obrigatório de adição de álcool etílico anidro combustível, em volume, à gasolina em todo o território nacional. § 1º O Poder Executivo poderá elevar o percentual referido no caput deste artigo até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), desde que constatada a sua viabilidade técnica, ou reduzi-lo a 22% (vinte e dois por cento). § 3º O Poder Executivo estabelecerá critérios para consideração do percentual de adição de álcool etílico anidro à gasolina vigente no cálculo de informações de desempenho energético divulgadas pelo Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular (PBEV).”

MINÉRIOS: desafios e perspectivas para a regularização da atividade minerária

Por Gabriel Furtado e Mariana Salha

 

A atividade minerária no Brasil enfrenta desafios regulatórios e estruturais, apesar de sua importância para diversos setores econômicos. Especificamente no Piauí, observa-se um notável crescimento na mineração, destacando-se o potencial de exploração de diversos minérios, como diamante, opala, ferro, calcário calcítico e dolomítico, níquel e cobalto. Diante desse panorama, a regularização da atividade minerária emerge como um tema crucial a ser investigado. A Agência Nacional de Mineração (ANM), por sua vez, é legalmente responsável por criar regras e incentivos para o setor, atuando como reguladora para estabelecer diretrizes que harmonizem os interesses dos mineradores, do governo e das partes afetadas pela atividade mineradora, como cidadãos, municípios e associações.

Nessa perspectiva, ela é também a responsável pela concessão dos títulos minerários, ou seja, os documentos outorgados pela ANM e pelo MME (Ministério de Minas e Energia) que credenciam seu possuidor ao aproveitamento do recurso mineral. Esses títulos se dividem em dois, o Alvará de Pesquisa e a Concessão de Lavra. O Alvará de Pesquisa autoriza o titular a realizar pesquisa e exploração mineral por meio da Guia de Utilização, conforme estipulado na Resolução ANM nº 37/2020. Já a Concessão de Lavra habilita o detentor para a desejada exploração mineral. A concessão, também conhecida como Portaria de Lavra, é concedida pelo Ministério de Minas e Energia e pela ANM. A ANM emite as Portarias de Lavra, seguindo a interpretação estabelecida em parecer da Advocacia Geral da União[1].

Para a concessão do alvará de pesquisa, é crucial verificar se a área desejada está disponível para um novo requerimento. Caso esteja disponível, o primeiro passo é o Requerimento Eletrônico de Pesquisa Mineral (REPEM), procedimento totalmente online, sendo este fundamental para assegurar a prioridade deste título minerário, uma vez que o requerimento confere apenas a expectativa de obter o direito para quem o solicitar primeiro. Esse procedimento é obrigatório para obter a autorização governamental. Após a análise e aprovação do requerimento, o alvará de pesquisa será concedido por um período máximo de três anos. Durante esta fase, é essencial que o minerador esteja atento aos prazos estabelecidos pela ANM, a fim de evitar multas e a possível perda do seu ativo principal: o processo minerário. Entre os vários prazos, destacam-se o pagamento da Taxa Anual por Hectare (TAH) e o vencimento do Alvará de Pesquisa, quando é necessário apresentar o Relatório Final de Pesquisa (RFP) para evitar penalidades.[2]

A concessão de lavra também se inicia por meio do requerimento de lavra, totalmente online e de fácil acesso no site da ANM. É importante ressaltar que para conseguir a concessão de lavra, é necessário já possuir o alvará de pesquisa, até porque sem este não seria possível ter o conhecimento técnico da área que se pretende explorar. Dessa forma, após a publicação do relatório final de pesquisa, resultante do alvará, poderá ser feito o requerimento de lavra, que deve ser apresentado juntamente com um Plano de Aproveitamento econômico – PAE, dentre outros documentos solicitados no art. 38 do Código de Mineração.[i]

Como mencionado anteriormente, a concessão de lavra é destinada à extração, beneficiamento e comercialização do mineral identificado na etapa anterior (alvará de pesquisa). Pessoas físicas ou jurídicas legalmente qualificadas e que sejam titulares de processos minerários com relatório final de pesquisa aprovado têm a prerrogativa de solicitar o Título de Lavra. Tanto o Alvará de Pesquisa, quanto a Concessão de Lavra representam os regimes mais comuns e aplicáveis à maioria das substâncias minerais, com algumas exceções. Um regime precede o outro, e ambos envolvem a Autorização de Pesquisa como requisito prévio para a obtenção do título de lavra. [3]

Apesar de abranger a maioria dos casos, os títulos de pesquisa e de lavra não são os únicos regimes para a regularização da atividade minerária. Uma alternativa é o regime de licenciamento, regulamentado pela Lei nº 6567/1978. Embora seja um processo mais ágil, este regime é aplicável apenas a minerais de uso imediato na construção civil, preparo de agregados e argamassas, desde que não passem por beneficiamento industrial ou sirvam como matéria-prima para a indústria de transformação. Também abrange outras substâncias minerais, como argilas para cerâmica vermelha, rochas britadas para uso imediato na construção civil, calcários corretivos de solo, rochas ornamentais e de revestimento, além de carbonatos de cálcio e magnésio para diversas indústrias. Outro regime menos comum, porém de obtenção mais simplificada, é a permissão de lavra garimpeira, exclusiva para minerais garimpáveis. Semelhante ao regime de licenciamento, dispensa a pesquisa, requer apenas o pedido de lavra, além da posse de licença ambiental de operação e licença administrativa local.

Portanto, ao nos aprofundarmos nos processos minerários, desde a pesquisa até a concessão de lavra, torna-se evidente a complexidade e as regulamentações específicas que permeiam esse setor. A compreensão dos regimes de aproveitamento mineral, das fases do processo minerário e das obrigações em cada etapa é fundamental. A atenção aos prazos e a conformidade rigorosa com a Legislação Mineral são requisitos para evitar penalidades e garantir o êxito nos empreendimentos minerários. O Piauí, em meio a esse panorama, emerge como um protagonista promissor na produção de minérios no Brasil. Contudo, os desafios persistem, exigindo uma abordagem estratégica para superar obstáculos regulatórios e consolidar o estado como um player expressivo na atividade minerária nacional.

 


[1] PARECER n. 0033/2018/DECOR/CGU/AGU, aprovado pela Advogada-Geral da União em despacho de 21 de maio de 2018 (Processo n° 48390.000051/2018-59).

[2] https://www.gov.br/anm/pt-br/acesso-a-informacao/perguntas-frequentes/alvara-de-pesquisa#:~:text=O%20que%20%C3%A9%20Alvar%C3%A1%20de,a%20subst%C3%A2ncia%20mineral%20de%20interesse.

[3] https://www.gov.br/pt-br/servicos/obter-concessao-de-lavra-mineral

 


[i]  Art. 38. O requerimento de autorização de lavra será dirigido ao Ministro das Minas e Energia, pelo titular da autorização de pesquisa, ou seu sucessor, e deverá ser instruído com os seguintes elementos de informação e prova:

I - certidão de registro, no Departamento Nacional de Registro do Comércio, da entidade constituída;

II - designação das substâncias minerais a lavrar, com indicação do Alvará de Pesquisa outorgado, e de aprovação do respectivo Relatório;

III - denominação e descrição da localização do campo pretendido para a lavra, relacionando-o, com precisão e clareza, aos vales dos rios ou córregos, constantes de mapas ou plantas de notória autenticidade e precisão, e estradas de ferro e rodovias, ou, ainda, a marcos naturais ou acidentes topográficos de inconfundível determinação; suas confrontações com autorização de pesquisa e concessões de lavra vizinhas, se as houver, e indicação do Distrito, Município, Comarca e Estado, e, ainda, nome e residência dos proprietários do solo ou posseiros;

IV - definição gráfica da área pretendida, delimitada por figura geométrica formada, obrigatoriamente, por segmentos de retas com orientação Norte-Sul e Leste-Oeste verdadeiros, com 2 (dois) de seus vértices, ou excepcionalmente 1 (um), amarrados a ponto fixo e inconfundível do terreno, sendo os vetores de amarração definidos por seus comprimentos e rumos verdadeiros, e configuradas, ainda, as propriedades territoriais por ela interessadas, com os nomes dos respectivos superficiários, além de planta de situação;

V - servidões de que deverá gozar a mina;

VI - plano de aproveitamento econômico da jazida, com descrição das instalações de beneficiamento;

VII - declaração de disponibilidade de recursos ou compromisso de buscar os financiamentos necessários para execução do plano de aproveitamento econômico e operação da mina, conforme dispuser resolução da ANM.

INOVAÇÃO: A proteção da propriedade intelectual como uma aliada ao desenvolvimento das Startups

Por Gabriel Furtado e Lara Kronenberger

Membros do escritório Gabriel Rocha Furtado Sociedade de Advogados

 

A insegurança financeira no mercado e a elevação da taxa de juros nos últimos anos provocados, principalmente, pela pandemia do Covid-19, ocasionaram uma considerável diminuição no crescimento do número de Startups. No entanto, apesar do receio dos novos empresários, o avanço da tecnologia e o aumento da segurança jurídica para investidores e empreendedores viabilizados com a promulgação da Lei Complementar nº 182 de 2021, - intitulada Marco Legal das Startups[i] - possibilitaram a construção e a lapidação de um forte ecossistema de empreendedorismo tecnológico e de inovação no Brasil. Tal fato se comprova com o impressionante número de mais de 12 mil Startups em funcionamento no país e, contrariando a recessão, com o crescimento de 34% do número de Startups entre os anos de 2022 e 2023 no estado do Piauí[ii]

Nesse cenário promissor, é fundamental lembrar de proteger os ativos intangíveis como a produção intelectual, a técnica, os softwares e/ou produtos transformadores, uma vez que contribuem para a formação do valor do empreendimento e alicerçam as Startups, bem como a marca e a imagem que as identificam. 

Em um contexto em que a inovação é uma constante, os ativos que englobam a propriedade intelectual - patentes, marcas registradas, direitos autorais e segredos comerciais – são valiosos para a garantia da exclusividade e da vantagem competitiva das Startups no mercado. Assim, compreender a relevância da proteção da propriedade intelectual e adotar medidas adequadas para sua salvaguarda devem ser considerados passos cruciais para o empreendedor que convive neste ecossistema. 

Entretanto, para aproveitar plenamente os benefícios da proteção da propriedade intelectual, é necessário adotar uma estratégia abrangente que leve em consideração os diferentes tipos de inovações desenvolvidas e as características específicas de cada uma. Aqui estão alguns dos meios pelos quais os empreendedores podem proteger sua propriedade intelectual de acordo com as demandas mais comuns no mercado:

  1. Registro de Patentes: Para proteger invenções e processos exclusivos, os empreendedores podem registrar as patentes junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), a autarquia federal vinculada ao Ministério da Economia, responsável pelo aperfeiçoamento, disseminação e gestão do sistema brasileiro de concessão e garantia de direitos de propriedade intelectual para a indústria. Esse registro confere ao titular o direito exclusivo de explorar comercialmente a inovação por um período determinado. Se a sua patente for concedida pelo INPI terá validade no Brasil de 20 anos, caso seja uma Patente de Invenção (PI)[iii], ou de 15 anos, caso seja uma Patente de Modelo de Utilidade (MU)[iv].
  2. Registro de Marcas: O registro de marcas comerciais, também realizado junto ao INPI, protege os elementos distintivos da identidade da empresa, que fazem os stakeholders (interessados na Startup) ou os consumidores discernirem esta empresa no mercado, a partir do nome, do logotipo, da fusão de ambos e dos respectivos slogans. Isso ajuda a evitar a diluição da marca e a confusão dos consumidores, fortalecendo a posição da Startup no mercado. Assim como as patentes, os detentores do uso de determinada Marca têm o direito de gozo por um período determinado que, no caso, é de 10 (dez) anos, renovável mediante pedido à autarquia federal.
  3. Proteção de Direitos Autorais: Para obras originais, como software, conteúdo escrito e design, os empreendedores podem recorrer à proteção de direitos autorais registrados pela Biblioteca Nacional. Esse registro permite o reconhecimento da autoria, especifica direitos morais e patrimoniais e estabelece prazos de proteção contra a reprodução não autorizada e o uso indevido de obras criativas tanto para o titular, quanto para seus sucessores. É um serviço prestado pelo Escritório de Direitos Autorais (EDA) da Biblioteca Nacional, de acordo com a Lei nº 9.610 de 19/02/1998[v].
  4. Acordos de Confidencialidade: Para proteger informações sensíveis e segredos comerciais, os empreendedores podem estabelecer acordos de confidencialidade (também conhecidos como NDAs - Non-disclosure Agreements) com funcionários, parceiros e fornecedores. Isso ajuda a manter a exclusividade e a confidencialidade de informações estratégicas para a prosperidade do negócio.
  5. Monitoramento e Execução: Uma vez obtida a proteção da propriedade intelectual, os empreendedores devem monitorar ativamente o uso não autorizado ou autorizado - como nos contratos de cessão do uso de marca ou de licenciamento de software - dos seus ativos e agir prontamente para fazer valer seus direitos legais por meio de medidas como notificações, ações judiciais e negociações.

Em resumo, a proteção da propriedade intelectual desempenha um papel crucial no desenvolvimento das Startups, garantindo sua capacidade de inovar, competir e prosperar no mercado. Ao adotar uma abordagem proativa para proteger seus ativos intangíveis desde a criação da Startup, os empreendedores fortalecem sua posição no mercado e maximizam o valor de seus investimentos em inovação. 

 

[i] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp182.htm

[iii]Patente de Invenção (PI): para novas tecnologias, sejam associadas a produto ou a processo, como um novo motor de carro ou uma nova forma de fabricar medicamentos.

[iv]Patente de Modelo de Utilidade (MU): para novas formas em objetos de uso prático, como utensílios e ferramentas, que apresentem melhorias no seu uso ou na sua fabricação.

[v] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9610.htm

A relevância da proteção da propriedade intelectual no desenvolvimento das startups Revista de Direito e as Novas Tecnologias | vol. 18/2023 | Jan - Mar / 2023 DTR\2023\372 

 

DEBÊNTURES DE INFRAESTRUTURA: desbravando um novo caminho para a infraestrutura nacional

Por Gabriel Furtado e Victória Emannuelle

 

Após intensos debates no Congresso Nacional, foi sancionada a Lei n. 14.801/2024, que instituiu as denominadas debêntures de infraestrutura[1]. Elas surgem como um importante meio de captação de recursos para os grandes projetos do setor de infraestrutura, os quais carecem de recursos financeiros para a sua implementação.

No cenário atual da infraestrutura brasileira, identifica-se um significativo gargalo, os dados da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústria de Base (ABDIB)[2] apontam para a existência de um hiato de investimento nesse setor em 2023 correspondente a mais de 2% (dois por cento) do PIB, equivalente à 248,9 (duzentos e quarenta e oito vírgula nove) bilhões de reais que deveriam ter sido investidos e não foram.

O estudo realizado pelo Instituto Internacional de Desenvolvimento Gerencial revela que o Brasil ocupa a 55ª (quinquagésima quinta) posição dentre 64 (sessenta e quatro) países no quesito infraestrutura[3]. Para melhor ilustrar a realidade brasileira, cita-se o saneamento básico como exemplo, a ABDIB destaca que os investimentos nesse setor deveriam dobrar, evidenciando que metade da população brasileira não tem acesso a esgoto tratado.

Nesse contexto, tornou-se impossível conceber a retomada do crescimento do país de maneira estável e regular sem a recuperação desse hiato na infraestrutura. Para superar esse desafio, restou imprescindível a busca por novas fontes de financiamento, uma vez que as já existentes por si só se mostram insuficientes.

Diante dessa necessidade, surgiu a Lei n. 14.801/2024, alterando as Leis n. 9.481/1997, 11.478/2007 e 12.431/2011. Essa mudança criou as debêntures de infraestrutura, permitindo que sociedades de propósito específico, concessionárias, permissionárias, autorizatárias ou arrendatárias, constituídas sob a forma de sociedade por ações, possam emitir debêntures objeto de distribuição pública com maiores benefícios ao emissor do título. A Lei fixou benefícios fiscais ao emissor, conferindo uma redução de 30% (trinta por cento) dos juros pagos aos detentores dos títulos da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Essa nova forma de investimento se somou às debêntures incentivadas[4], por se vislumbrar um potencial investidor para o setor capaz de aportar uma quantidade considerável de recursos que até então não se tem, os fundos institucionais, notadamente os fundos de pensão e de previdência que buscam investimentos com um prazo mais longo.

Apesar das debêntures incentivadas terem desempenhado um papel relevante na captação de recursos para a infraestrutura, elas constituem uma modalidade de investimento que não atrai aos fundos institucionais. Isso ocorre devido ao fato de que as incentivadas proporcionam mais benefícios para os investidores que adquirem o título, fugindo ao tipo de aplicação buscada pelos fundos.

A nova lei trouxe grande otimismo para os atuantes no setor de infraestrutura, segundo nota publicada pela ABDIB, “foram passos extremamente importantes que contribuirão para colocar o País numa rota de crescimento econômico sustentável, através dos investimentos em infraestrutura”[5]. Em entrevista concedida ao Portal 360, a ABDIB divulgou uma estimativa de que com a criação das debentures de infraestrutura através da Lei 14.801/2024, aproximadamente 150 (cento e cinquenta) bilhões serão injetados em 03 (três) anos nos recursos de infraestrutura[6]. Valores ainda considerados baixos quando comparados com a necessidade do país, mas que contribuirão para importantes avanços no setor.

Portanto, têm-se que a promulgação da Lei n. 14.801/2024 com a criação das debêntures de infraestrutura, marcam uma alteração significativa na busca por recursos para projetos no ramo, sobretudo considerando o expressivo déficit de investimento. Nesse sentido, a expectativa é de que as novas debêntures contribuam para suprir ou, ao menos, amenizar o hiato de investimentos no setor, a fim de que o país possa atingir patamares mais elevados de crescimento sustentável.

 

[1] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L14801.htm

[2] https://www.abdib.org.br/2023/12/05/livro-azul-da-infraestrutura-edicao-2023/

[3]https://noticias.portaldaindustria.com.br/listas/5-paises-que-tem-transformado-sua-infraestrutura-nos-ultimos-anos/

[4]Debêntures incentivadas são investimentos em que o beneficiário direto é o investidor individual. Esses títulos oferecem a vantagem da isenção do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF), proporcionando uma alternativa atraente para quem busca investir com benefícios fiscais. Com essa isenção, o investidor pode obter ganhos mais atrativos em comparação com outros instrumentos financeiros, tornando as debêntures incentivadas uma opção interessante para quem procura otimizar seus investimentos pessoais.

[5] https://www.abdib.org.br/wp-content/uploads/2024/01/c004-Nota-DEBENTURES-DE-INFRAESTRUTURA-1.pdf

[6] https://www.poder360.com.br/infraestrutura/debentures-de-infraestrutura-injetarao-r-150-bi-em-3-anos-diz-entidade/

Direito de Energia em 2024: desafios, perspectivas e temas-chaves

Por Gabriel Furtado e Luís Guilherme Tavares

Sócios do escritório Gabriel Rocha Furtado Sociedade de Advogados

A realização da COP-28 em 2023 trouxe não apenas um progresso na formação do consenso internacional pela urgência da substituição dos combustíveis fósseis na matriz energética global, mas também deixou evidente a grandeza dos desafios de implementar os compromissos firmados para a preservação ambiental.

Ainda que tenha resultado em medidas práticas como um redirecionamento do papel do Banco Mundial no financiamento de projetos de transição energética e acordos para a redução imediata da produção de metano, a COP-28 jogou luz em problemas associados como a ausência de mecanismos centrais de controle dos compromissos climáticos e de consensos nos mercados de carbono, gerando um risco de prevalência das negociações bilaterais e políticas protecionistas.

Riscos esses que se agravam com a existência de conflitos bélicos com repercussão nos mercados de combustíveis e um calendário de eleições significativas em 2024, incluindo potências como a Índia, os Estados Unidos e o Parlamento Europeu. Assim, o Direito de Energia tem 2024 como ano decisivo para a implementação e/ou desaceleração das medidas necessárias à transição energética sustentável.

No cenário internacional a Europa tem lidado com a dificuldade de conciliar as ambiciosas metas de redução das suas emissões com os impasses políticos e de financiamento desses projetos.[1] Já os Estados Unidos, apesar do interesse de investidores atraído pelo anúncio do IRA[2], também tem enfrentado os problemas oriundos da falta de metodologia dos cálculos de emissões, causando incerteza ao mercado. Em sentido contrário, a China tem se consolidado como expoente dos insumos relacionados à energia sustentável, dominando a produção dos painéis fotovoltaicos e projetando um protagonismo na cadeia industrial do hidrogênio por eletrólise.[3]

Já no cenário nacional, o Brasil também encara o ano de 2024 como decisivo nas suas intenções de se consolidar como referência na produção sustentável de energia, materializando o potencial da sua matriz energética em desenvolvimento econômico e protagonismo internacional, especialmente com a proximidade da COP-30, a ser sediada em Belém.

Com esse fim, torna-se importante acompanhar todas as movimentações políticas e normativas capazes de contribuir nesse objetivo. Na esfera do Governo Federal, ganham destaque a elaboração do “Plano do Clima”, pelo Ministério do Meio Ambiente; o Plano de Transição Energética do Ministério da Fazenda; as consequências da Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e da Nova Indústria Brasil quanto ao financiamento dos projetos de energia renovável.[4] Além destas, a atuação legislativa será importante para trazer segurança aos investidores em tópicos como a regulamentação “Mercado de Carbono”, (PL nº 2148/2015 e PL nº 412/2022)[5] e do “Hidrogênio Verde ou de baixa emissão de carbono” (PL nº 2308/2023 e PL nº 5816/2023).[6]

Temas esses que não esgotam a capacidade brasileira para implementar medidas para a renovação da matriz energética, que demandará participação e debate dos governos estaduais, do setor privado e da sociedade civil em pontos como a expansão da produção de energia eólica e solar, a eletrificação da frota de veículos, a produção de energia com base em matéria prima de origem vegetal (e.g. etanol), e tecnologias como o SAF (combustível sustentável da aviação).[7]

Os inúmeros temas aqui sintetizados deixam claro que o ano de 2024 está permeado de questões e desafios a serem acompanhados atentamente por todos aqueles interessados no Direito de Energia, cujas respostas darão um indicativo do caminho eleito pelo Brasil nos anos vindouros: protagonista ou espectador da inevitável transição energética.

 

[1] “O Hidrogênio renovável na Europa fornece um dos exemplos mais claros do distanciamento entre a os objetivos das políticas de transição energética e a difícil realidade de investimentos e aprovações, uma barreira que poderá se agravar em 2024 ou forçar a adoção de metas mais realistas. (...) Há um crescente reconhecimento entre os legisladores da União Europeia de que será bem desafiador apostar apenas no hidrogênio originado na eletrólise, haja vista a necessidade de emprego de grande escala de energia renovável e eletrolisadores. Isso tem levado a uma crescente aceitação, tanto pela União Europeia quanto em seus estados membros de que o chamado “hidrogênio azul”, produzido por combustíveis fósseis mas com captura de carbono, também será importante, ao menos por um período de transição” (The Oxford Institute for Energy Studies, Key Themes for the Global Energy Economy in 2024, tradução livre autores).  

[2] “Inflation Reduction Act”, Programa Governamental dos Estados Unidos para fomento à transição climática e à redução da inflação.

[3] Cf. também: https://www.hydrogeninsight.com/electrolysers/interview-china-is-overbuilding-hydrogen-electrolyser-manufacturing-capacityand-may-have-to-shut-some-of-it-down-citigroup/2-1-1506515    

[4] Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/esg/artigo/o-que-esperar-para-a-agenda-de-clima-no-brasil-em-2024.ghtml

[5] Tramitação disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2397761 e https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/1548579   

[6] Tramitação disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2416789 e https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/161391

[7] https://valor.globo.com/empresas/esg/noticia/2024/02/15/agenda-esg-transicao-energetica-ganha-maturidade-em-2024-e-mostra-que-nao-se-trata-de-troca-de-lampadas.ghtml.

HIDROGÊNIO VERDE: breve retrospectiva de 2023

Por Gabriel Furtado e Luís Guilherme Tavares

Sócios do escritório Gabriel Rocha Furtado Sociedade de Advogados

 

O ano de 2023 foi de consolidação do Hidrogênio de baixa emissão de carbono – “Verde” – como uma das principais alternativas para reduzir as graves consequências das atividades prejudiciais ao meio ambiente. Nesse sentido, diversos países passaram a investir na inclusão do Hidrogênio em suas matrizes energéticas, postura reforçada em pronunciamentos conjuntos de debates internacionais sobre o clima como a COP-28.

O Brasil não foi exceção a esse movimento, fortalecendo sua posição de país capaz de aliar uma matriz energética diversa e renovável com significativos investimentos em energias sustentáveis. Essa postura significou, no que se refere ao Hidrogênio, a demonstração de que o país tem os recursos necessários para fornecer o Hidrogênio de baixa emissão de carbono a um preço competitivo, potencialmente, com um dos menores custos do mercado internacional.

Assim, a vontade política demonstrada representou também uma aceleração no trâmite das propostas de regulamentação dessa fonte de energia, que apesar de diversas comungavam de um objetivo, promover a segurança jurídica necessária aos investimentos do setor privado na produção ambientalmente sustentável de Hidrogênio. Para além das normas estaduais[i], o legislativo federal deu andamento a projetos direta ou indiretamente ligados a esse objetivo, destacando-se em 2023 a apresentação do Plano de Trabalho Trienal (2023/25) do Programa Nacional do Hidrogênio e a aprovação dos Projetos de Lei (PL) nº 2.038 pelo Câmara dos Deputados e nº 5.816/2023 pelo Senado Federal.

No Plano de Trabalho Trienal (2023/25), houve um esforço governamental para apontar objetivos para o desenvolvimento e integração do Hidrogênio na matriz energética brasileira de modo ambientalmente equilibrado, segmentando as iniciativas em câmaras temáticas, como por exemplo os projetos voltados à capacitação de recursos humanos, ao fortalecimento das bases científicas, ao arcabouço legal; etapas indispensáveis ao sucesso dessa integração no curto e médio prazo (até o ano de 2025).[ii]

Já no campo das iniciativas de regulação pelo legislativo, dois projetos de lei têm sido objeto de maior atenção, estando mais próximos da aprovação do congresso nacional. O primeiro deles é o PL nº 2.308/2023, que institui o “Marco Legal do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono”, dispondo sobre os princípios e objetivos que regem a Política Nacional desta fonte de energia, conceituando etapas da produção e atores econômicos envolvidos nessa cadeia comercial, elencando instrumentos para concretização dessa Política, e fixando incentivos para essa indústria, inclusive com a criação de um regime especial (Rehidro) e de um Programa de Desenvolvimento (PHBC).[iii] O texto desse projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados na primeira semana de Dezembro de 2023, tendo sido enviado ao Senado Federal para análise, aprovação e posterior sanção.[iv]

Outra iniciativa de destaque é o PL nº 5.816/2023, também aprovado em Dezembro de 2023, só que pelo Senado Federal, pendente agora de apreciação pela Câmara dos Deputados e eventual sanção[v]. Este Projeto de Lei dispõe sobre a “Indústria do Hidrogênio de Baixo Carbono”, com alterações em diversas normas federais[vi], também estabelecendo princípios e objetivos para fortalecer a inclusão do Hidrogênio de Baixo Carbono no cenário nacional, conceituando as modalidades de Hidrogênio. Almejando tornar factível esses objetivos, o PL apresenta propostas estruturais e de viabilidade econômica, cria órgãos de Governança como o Comitê Gestor do Setor de Hidrogênio de Baixo Carbono (CGHBC), e apresenta incentivos tributários e regulatórios.[vii]

O teor dessas iniciativas, ainda que não finalizadas, demonstra que o ano de 2023 foi de fortalecimento da inclusão do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono – Verde – no debate de políticas públicas e comerciais. Essa etapa de concretização dos projetos tem sido o maior desafio internacional, como exemplificado por relatório da Agência Internacional de Energia (IEA), publicado neste mês, que reduziu as expectativas quanto a essas iniciativas globais, especialmente em razão da demora na finalização dos projetos.[viii]

Surge então para o Brasil um desafio em 2024, consegue superar essa dificuldade que assola o cenário internacional e prosseguir com o seu ritmo de crescimento no campo desse Hidrogênio Verde, Sustentável e com Baixa Emissão de Carbono; meta que dependerá significativamente dos Projetos mencionados acima, cuja aprovação célere deve ser um objetivo compartilhado por todos aqueles interessados na transição energética sustentável.

 

[i] Como exemplos, temos os projetos aprovados em Pernambuco (Lei nº 17.976 / 2022); Goiás (Lei nº 21.767 / 2023); Paraná (Lei nº 21.454 / 2023); Ceará (Lei nº 18.455 / 2023); e Rio Grande do Sul (Decreto Estadual nº 57.173/ 2023). Na coluna do dia 12/09/2023, abordamos alguns dos principais projetos no âmbito estadual. Cf. também: https://fgvenergia.fgv.br/sites/fgvenergia.fgv.br/files/caderno_hidrogenio_final_.pdf

[ii] Para mais informações sobre esse plano trienal, consultar a coluna do dia 19/09/2023, disponível em: https://cidadeverde.com/cadernojuridico/123868/hidrogenio-verde-o-plano-de-trabalho-do-governo-federal

[iii] https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2368314&filename=Tramitacao-PL%202308/2023

[iv] https://www.congressonacional.leg.br/materias/materias-bicamerais/-/ver/pl-2308-2023?_gl=1*1o1eeuc*_ga*MTQ4OTE1MzIwNC4xNjkzOTIwNjMx*_ga_2TJV0B8LD3*MTcwNTM0ODM5MS4xLjAuMTcwNTM0ODM5MS4wLjAuMA..

[v] https://www.congressonacional.leg.br/materias/materias-bicamerais/-/ver/pl-5816-2023

[vi] Dispõe sobre a indústria do hidrogênio de baixo carbono, sua estrutura e fontes de recursos e altera as Leis nºs 9.427, de 26 de dezembro de 1996, 9.478, de 6 de agosto de 1997, 10.438, de 26 de abril de 2002, 11.488, de 15 de junho de 2007, 11.508, de 20 de julho de 2007, 12.431, de 24 de junho de 2011 e 14.182, de 12 de julho de 2021

[vii] https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9537456&ts=1704277318641&disposition=inline&_gl=1*k70hey*_ga*MTQ4OTE1MzIwNC4xNjkzOTIwNjMx*_ga_CW3ZH25XMK*MTcwNTM0NzM0MS45LjEuMTcwNTM0ODI1OC4wLjAuMA.

[viii]https://iea.blob.core.windows.net/assets/3f7f2c25-5b6f-4f3c-a1c0-71085bac5383/Renewables_2023.pdf

CRÉDITO DE CARBONO: atividade legislativa no Congresso Nacional

O Projeto de Lei nº 412 de 2022, em tramitação no Congresso Nacional, propõe a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Este sistema visa a estabelecer um novo marco legal nas políticas públicas contra as mudanças climáticas no Brasil, introduzindo um mecanismo de mercado para controlar e reduzir as emissões de gases responsáveis pelo efeito estufa. O SBCE se aplicará a todas as atividades, fontes e instalações localizadas no território nacional que emitam ou possam emitir gases de efeito estufa. No entanto, a produção primária agropecuária e suas infraestruturas associadas são isentas das obrigações estabelecidas por este sistema.

O projeto define os termos relevantes, como "atividade", "cancelamento" e "Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões". Estes certificados são ativos negociáveis que representam a efetiva redução ou remoção de, por unidade, uma tonelada de dióxido de carbono ou seu equivalente. Além disso, introduz a "Cota Brasileira de Emissões", que é um ativo igualmente negociável representativo do direito de emissão de uma tonelada de dióxido de carbono equivalente.

O SBCE tem como objetivo principal cumprir os compromissos do Brasil quanto à Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) e a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Para isso, o sistema operará sob princípios de harmonização, cooperação, transparência, e promoção da competitividade econômica, sempre com um olhar atento à equidade climática e ao respeito aos direitos dos povos indígenas e comunidades tradicionais.

O sistema será implementado de forma gradual, com períodos de compromisso sequenciais e limites máximos de emissões. Além disso, será criado um registro central para consolidar informações sobre as emissões e remoções de gases e para rastrear transações de ativos dentro do sistema. A governança do SBCE será composta por diferentes órgãos, incluindo um Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima e um Comitê Técnico Consultivo Permanente. A operação do SBCE será financiada por meio de leilões de cotas, multas, encargos setoriais, entre outras fontes.

O projeto também estabelece obrigações para os operadores das instalações e fontes reguladas, como o envio de relatórios de emissões e a submissão de planos de monitoramento. Há penalidades definidas para o descumprimento das regras do SBCE, incluindo advertências e multas.

Em resumo, o Projeto de Lei nº 412 de 2022 é um passo significativo na direção de uma abordagem mais estruturada e responsável para a gestão das emissões de gases de efeito estufa no Brasil, introduzindo um sistema que busca equilibrar as necessidades ambientais com o desenvolvimento econômico e social. Além de criar um novo mercado de títulos mobiliários, atualmente inexistente, que tem o potencial de incrementar a economia nacional pela “exportação” de créditos de carbono a empresas estrangeiras, ou outros países, que deles precisem para cumprir acordos internacionais relativos à redução da emissão na atmosfera de gases responsáveis pelo efeito estufa.

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